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Caixinha da sorte

Peter Rossi

Quando pequeno, na minha cidade natal, toda moeda que sobrava tinha o mesmo destino: comprar uma caixinha da sorte. Eram caixas, via de regra, amarelas e o seu conteúdo inesperado. Algumas vezes eram anéis de plástico, outras um simples bonequinho. Mas a ansiedade de menino ao pegar cada uma delas, dar uma chacoalhada para tentar imaginar o que tinha dentro era inesquecível.

Numa garagem, um pequeno homem se escondia atrás do baleiro. Era o “seu” Cardoso, do alto do seu metro e cinquenta. Franzino, mas sempre gentil. Me deixava experimentar cada caixinha. E, curioso, partilhava da minha felicidade ao descobrir alguma coisa nova.

Como era bom receber a felicidade em caixinhas de papel, do tamanho daquelas de fósforo, mas que tinham um poder incendiário maior, elas aqueciam a nossa alma de menino. Não sabíamos o quanto representava uma moeda, tínhamos apenas a certeza de que encontraríamos a nossa sorte ali.

E encontrávamos mesmo! Naqueles tempos a felicidade vinha embrulhada em caixinhas de papelão. Ou a gente perdeu a lente, ou o mundo se esqueceu de que era muito simples ser feliz.

Enfim, ficam essas recordações, que nunca se perdem. Essas memórias, nossas eternas namoradas. De braços dados caminhamos pela nossa história e não nos cansamos de lembrar de nossos beijos de amor nas bochechas da vida!

Beijos de meninos, tímidos, mas sinceros e sentidos! Beijei a vida tantas vezes que ela acabou por se apaixonar por mim. E, juntos, íamos a chacoalhar novas caixinhas da sorte, simplesmente porque tinha que ser assim.

Entre um contorno e outro, do zigue-zague das ruas da minha infância, deixamos cair, numa curva e outra, aquele retrato em que estávamos com os dentes à mostra, explodindo no papel da foto todos os brilhos que nossos olhos podiam ter.

Como é bom lembrar desses momentos, daqueles momentos, de tudo isso, de tudo aquilo. Viver é sempre tentar abrir uma nova caixinha da sorte.

Hoje, mais velho, não vejo mais a venda do “seu” Cardoso, embora saiba que sempre esteve no mesmo lugar. Subindo aquela ladeira, no meio da curva, diviso a minha saudade, visito minha essência e não consigo parar de pensar o quanto fui feliz. Talvez porque tenha tido a oportunidade de abrir uma caixinha da sorte. E ela, após aberta, não se fecha jamais. O brilho que dali emana preenche nosso coração e nos inunda de paz!

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