De vez em quando ela gosta de fazer viagens para trás, de desbravar territórios ordinários. Aos doze anos conheceu o amor, aos dezenove, a angústia; aos vinte e sete o trauma. Ontem, conheceu o vácuo. O descobrirá amanhã?
Ela sabe que o passado não é morada. Onde foi que se perdeu de si?
Quando viaja para frente, completa as lacunas.
Desconhece normas e hierarquias, se refugia em lembranças que não aconteceram. Gosta dos desafios e de decifrar enigmas. Se admira com os encantamentos que cristalizam as pessoas que já se foram. Penetra calmamente nas suas múltiplas camadas. Fica ali por alguns instantes e por toda a eternidade.
Como é dual em si mesma, para frente ou para trás, presa nos mesmos calabouços. Realidades congeladas, na prisão do infinito especular. A criança continua ali, a espreitar.
No futuro ou no passado, o azar e a sorte andam de mãos dadas na frequência de uma mesma temporalidade. O que vem de fora não importa, o que vem de dentro também não. O que importa mesmo é o como.
Entre tantas paisagens estéreis, a música não a destrói mais. Permanece intacta, dormente, anestesiada pela culpa e pela raiva. Ela envelheceu, aprendeu a não ter medo da fantasia.
Como gostaria de caminhar sobre os traumas matriciais, de pode subverter a lógica sistêmica das compatibilidades. Mas não pode. Agora não. Está em overdose cognitiva e é nômade. Desloca-se na ilusão da bebida e no rastro dos algoritmos.
Ela completou sua obra. Experimenta o êxtase da imortalidade.
Ela conheceu as sabedorias do corpo, mas a insônia vem à noite.
Ela vacila. Quer calma para o coração.
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