A emoção da imunização

A emoção da imunização – foto: Alexandra Koch/Pixabay
Eduardo de Ávila

Que incrível! Uma situação que deveria ser encarada como absolutamente normal, se transformou num grande feito entre nós brasileiros. Recebi cumprimentos e registros de parabéns! Não nego a ansiedade dos momentos que antecederam a data da minha vacinação, contava horas e minutos.

No dia, que foi 14 de abril passado, levantei cedinho. Tomei banho, me vesti como me lembrava de minha infância em dias especiais. Fosse de gala, como a parada do 7 de setembro, ou ir para a fazenda com papai. E sair de Araxá para conhecer Belo Horizonte e o Rio de Janeiro. Noite anterior mal dormida, mala e trajes especiais prontos, foi assim a quarta-feira.

Minha filha, que por tantas vezes dependia de minha presteza para passear, ir para a escola, médico e chorava quando recebia uma agulhada, agora tinha o papel de motorista e dona do carro pra levar o véinho para a imunização. Os papéis se invertem, atualmente nem tenho automóvel.

Ao entrar no carro, em traje de jacaré do papo amarelo – medida preventiva para uma eventual metamorfose anunciada por um crocodilo (ou troglodita) presidencial – cedi às sugestões de locais. Fafich, prédio histórico e símbolo da resistência dos anos de chumbo, ou drive-thru no Corpo de Bombeiros. Tanto faz, quero é vacinar, seja Coronavac ou AstraZeneca, aplicada no braço direito ou esquerdo, se for o caso no bumbum, quero é receber esse direito sagrado que todos temos. Foi enfim com agilidade e pela janela.

O gentil responsável pela agulhada, comemorando que o time dele venceu ao meu, foi rápido, atencioso e preciso. No momento que recebia o medicamento, enviei boas energias ao universo pedindo “vacina para todos”. A primeira dose é como se fosse o primeiro sutiã para as mocinhas e aos rapazes o primeiro beijo ou um sarro surpreendente e inesperado. A gente nunca esquece!

Contive a emoção com receio de desabar em choro – algo que me acontece tem mais de 60 anos – e voltei triunfante para casa. Antes, parei numa lotérica para tentar contaminar o dia com a sorte do jogo. Não deu! Como sempre, mas estou em processo de imunização contra a COVID. Ainda falta me livrar do bozovírus, esse vai passar com o antídoto da moralidade e seriedade.

De volta ao meu confinamento, postei nas redes sociais e comemorei aquele momento único neste mais de um ano de agonia. Fiquei emocionado com as reações, porém, confesso, os “parabéns” me causavam desconforto. Como podemos chegar a esse ponto. Ser vacinado, direito de todo cidadão, virar motivo de registro como uma conquista. Fim dos tempos. “Vacina, já”! Para todos!

Em meio a isso, seguimos contabilizando – entre todos os países do mundo – percentualmente, e até em números absolutos, apavorantes recordes de infectados e mortes pela COVID. O único no mapa que autoriza o poder econômico a comprar a vacina em prejuízo do sistema público de saúde. Nem falo dos infelizes fura-filas, alguns tomando soro (bem feito, coisa boa), em total desrespeito aos princípios morais de uma civilização. Tem parlamentar e ex-vice-governador que foi até senador. Vergonha!

Por falar em autoridade pública, estamos num triste lamaçal. Senador gravando conversa com presidente da República, que – por seu lado – diz coisas que ferem a liturgia do cargo que lhe foi confiado. Enfim, confio que tudo isso vai passar. Me faz lembrar tempos antigos e que se misturam com acontecimentos atuais.

Passou por Belo Horizonte, depois ganhou visibilidade noutros territórios, um caloteiro contumaz. Como todo moralista que se apresenta, sempre foi um canalha, mal pagador e hipócrita. Nascido noutro estado iniciou sua trajetória profissional aqui, onde sempre deu calote em restaurantes, boates, até em motorista de táxi. Sem dinheiro, naqueles tempos, não andava a pé. Ia para o trabalho de táxi e pedia ao motorista para esperar. Encerrado seu expediente, com o infeliz esperando a corrida que não foi paga, fugia pelos fundos pulando o muro.

Vai passar!

*
Curta: Facebook / Instagram
Blogueiro

Recent Posts

Feliz Natal

Mário Sérgio Todos os preparativos, naquele sábado, pareciam exigir mais concentração de esforço. Afinal, havia…

14 horas ago

Natal? Gosto não!

Rosangela Maluf Gostei sim, quando era ainda criança e a magia das festas natalinas me…

21 horas ago

Natal com Gil Brother

Tadeu Duarte tadeu.ufmg@gmail.com Com a proximidade do Natal e festas de fim de ano, já…

2 dias ago

Cores II

Peter Rossi Me pego, por curiosidade pura, pensando como as cores influenciam a nossa vida.…

2 dias ago

Corrida contra o tempo em Luxemburgo

Wander Aguiar Finalizando minha aventura pelo Caminho de Santiago, decidi parar em Luxemburgo antes de…

3 dias ago

Assumir

Como é bom ir se transformando na gente. Assumir a própria esquisitice. Sair do armário…

3 dias ago