Guilherme Scarpellini
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Se a vacinação ainda não se passa de uma expectativa nebulosa, o sol que desponta a cada manhã de verão é top: banha os nossos corpos sarados e ofusca nossos olhos de Ray-Ban. Em janeiro, não enxergamos a pandemia. E não deu outra: deu praia. Afinal de contas, é verão, porra!
Nós, jovens ricos e com nossos corpos de academia, mandamos às favas esse tal de vírus chinês — invenção dos comunistas para dominar o mundo — e nos despedimos do incrível ano que passou.
Lotamos casas de praia em Trancoso, Noronha e, claro, em Angra, que, no verão, é só nossa, isto é, dos reis. Teve até congestionamento de jatinhos. E quem não conseguiu chegar precisou se contentar com Ipanema, aquela farofa. Deu em todos os jornais, que mico! Custava ter ficado em casa? — casa de praia, Alok no talo, bebidinha e a galera fritando.
Até ouvimos falar daquele parente distante que está intubado, coitado. E também daquela atriz da Globo que morreu, como é mesmo o nome? Mas ninguém segura esses velinhos de hoje, não é mesmo? Quem mandou não se cuidarem?
Nós, jovens ricos e com nossos corpos modelados especialmente para o verão deste ano — que, aliás, promete ser ma-ra-vi-lho-so! — não temos culpa. Só queremos viver.
É como disse uma amiga, super inteligente, dessas cabeçudas mesmo, sabe?, que postou no Instagram: “estou saindo e estou vivendo, tem gente que não sai e está morrendo”. É Drummond?
Pena que a vida boa está acabando; é hora de voltar para a vida chata: trabalho, casa, trânsito, supermercado, farmácia. E quando nos encontrarmos por aí, por favor, não me venha com essa cara amarrada: tire a máscara, ponha o seu nariz de palhaço e dê um sorriso. Afinal de contas, a vida é curta — desde que seja a sua.