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Viva a diferença?! (parte II)


Viva a diferença?! – Fonte: Pixabay

Parte I
Daniela Piroli Cabral
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E, novamente, Camila teve aquela nítida sensação de que o mundo estava  parando de girar. Não existia outro tempo que não aquele instante, não havia outro lugar senão o olhar. – Ah, obrigada. – respondeu ela observando fixamente Antônio.

Tiveram uma noite muito agradável, tomaram saquê. Conversaram, se tocaram. Descobriram afinidades e coincidências. Moraram na Alemanha na mesma época. Ele, em Colônia, visitando parentes e trabalhando numa grande rede de telecomunicações. Ela, em Berlim, concluindo seus estudos de pós-graduação em história.

A sobrinha de Antônio havia sido aluna de Camila numa grande escola da capital. Ela falava com orgulho e empolgação do ofício de ser professora. Ele sentiu-se plenamente à vontade para falar da transição de carreira que estava fazendo, coisa que, até então, lhe gerava uma certa dúvida e constrangimento. Mudança de carreira no auge dos 40? Isso lhe soava meio adolescente.

Antônio experimentou as sugestões de Camila. Nirá, harumaki, sunomono… – Sim, um de cada por favor. Experimentou também a alegria daquele encontro. Parecia que já se conheciam há tempos.

Ah, o beijo. Foi doce, suave no começo, molhado no final. Perfeita harmonia. Imãs. 

Vamos lá para casa? – Sugeriu Antônio.

– Ah, mas já está tarde…

E amanhã?

– Amanhã?!

– Sim, amanhã. Vamos repetir a dose? Só que no Alcobaça. Você que gosta de polvo, vai adorar. E a cerveja também é top!

E se despediram com o próximo encontro marcado para o dia seguinte, com um beijo demorado daqueles – quando todos os sons se silenciam, todas as luzes se apagam e só se ouvem as batidas do coração.

– Foi muita sorte – ele pensou.

Ela não conseguiu pregar os olhos passando cada momento daquela noite por diversas vezes na memória. Os gestos, os toques, as palavras, os olhares. Não acreditou que pudesse estar vivendo de novo a sensação de uma paixão, depois de tudo que já havia sofrido. É, o mundo nunca para de girar.

No dia seguinte mandou uma mensagem carinhosa para Antônio, não antes de verificar o status no aplicativo de conversas: visto às 08:37.

– Não dormi direito pensando no nosso encontro. Repetir será realmente bom.

O dia passou sem resposta. Camila, controlando a ansiedade para não parecer insistente, não disse mais nada, mesmo depois que Antônio visualizou a mensagem às 11:42. Dois palitinhos azuis e nada.

No fim da tarde, Antônio a escreveu:

– Oi, Camila. Realmente foi um encontro muito especial. Você é uma pessoa diferenciada. Talvez muito diferente mesmo. Vi na rede social que você votou no Fernando Costa nas últimas eleições. Acho que temos posições políticas muito diferentes. Você é da esquerda, por isso, acho melhor não continuarmos a nos ver mais.

Meio frustrada por um lado, e reflexiva, por outro ela não respondeu a mensagem e intimamente pensou:

– Foi muita sorte. 

*

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