Reprodução/GettyImages

Guilherme Scarpellini
scarpellini.gui@gmail.com

Era uma deliciosa expectativa sabor chocolate Toblerone quando a minha tia Simone retornava de uma viagem aos Estados Unidos. Madrinha dedicada, ela mimava o afilhado com as últimas novidades da terra do Pato Donald.

Numa dessas andanças dela, criança estranha que eu era, encomendei uma faca de brinquedo. Daquelas utilizadas nos filmes americanos, que dispunham de um mecanismo com molas e recolhiam artificiosamente a lâmina quando pressionadas contra o corpo. A ansiedade era tanta que eu não cabia dentro do meu corpinho esguio de criança estranha.

Chegado o grande dia, porém, a expectativa dissolveu-se feito algodão doce no céu da boca. Restou apenas o sabor amargo da decepção. Pois era uma faca de borracha, molenga, toda preta, que não botava medo nem mesmo em quem acreditava em Papai Noel.

Hoje, sei que o Papai Noel é o Donald Trump carregando um saco de vaidades nas costas e uma barriga cheia de mentiras — e de X-burguer. Mas ainda sinto a mesma alegria doce de criança, quando agora são os meus sogros que retornam de uma viagem ao exterior.

Desta vez, eles trouxeram um robô. Um disco compacto, com duas esteiras na parte de baixo e uma luzinha em cima. Nenhum botão. Afinal de contas, é um robô e, não, um controle remoto. Um maravilhoso autômato recheado de chips, sensores e circuitos elétricos, que promete limpar o chão da casa inteira sem reclamar. Não demorou, e acabamos nos afeiçoando pela criatura de ferro — o chamamos de robô Roberto.

Horas depois de plugado na tomada, o pusemos para trabalhar. Robô Roberto começou tateando o chão do quarto. Trombou num pé de cama aqui e numa quina da escrivaninha ali. Mas bastou uma vez só — digo, uma vez só em cada quina. Pois, tendo aprendido onde estavam os obstáculos, ele jamais voltou a se chocar. Aos poucos, tornou-se mais seguro de si.

Descrevia movimentos complexos e demonstrava até mesmo algum temperamento. Coletava os papeis picados que jogávamos no chão e, quando tornávamos a sujar, ele voltava enfurecido, piscando a luzinha com furor. Checou os quatro cantos do quarto, entrou por debaixo dos móveis e, quando se aproximou a um degrau de escada, parou com cautela e sapiência. Deu meia volta e recomeçou a labuta.

De repente, o robô Roberto diminuiu o ritmo. A luz piscava fraquinha, enquanto ele começava a dar sinais de cansaço. Atravessou claudicante o quarto a caminho da tomada, onde estava plugado o carregador. Bastaria um gole de megawatts para estar pronto de novo. Mas a uns trinta centímetros do destino, a máquina se apagou.

Pobre robô Roberto que calculou mal a distância até o carregador. Ou será que fomos nós, que o exploramos além da conta? A pergunta amarga como limonada com casca ficou arranhando as nossas gargantas.

O robô que limpa o chão. (Arquivo Pessoal).
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