Daniela Piroli Cabral
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– Bom dia, dona Helena. É Heloísa da Sintra Logística. Tudo bem?
– Oi, minha filha. Há quanto tempo.
– Será que eu poderia dar uma palavrinha com o senhor Aníbal? É sobre as coisas dele que ficaram aqui na empresa.
– Uai, mas ele ainda não chegou aí? Ele saiu cedo para a reunião com o doutor Gerson, estava até preocupado.
– Ah… Entendo… Ah… Desculpe… Bem… É que… É que… Eu liguei lá no setor de compras agora há pouco e ele não estava… É….É… talvez ele já esteja na reunião. De qualquer forma, muito obrigada. Hum… Qualquer coisa eu volto a ligar… Um abraço.
Dona Helena percebeu a hesitação e o mal-estar que se instalou na conversa com Heloísa, mas nem de longe desconfiou que seu marido, o senhor Aníbal, havia sido demitido da Sintra Logística há mais de dois meses.
Ele continuava mantendo a rotina de funcionário exemplar. Acordava cedo, às seis, saía por volta das sete com a pasta debaixo do braço e os sapatos impecavelmente engraxados. Pegava a condução e retornava ao lar por volta das seis da tarde. Às vezes falava algo sobre a empresa, às vezes ficava calado, assistindo às notícias na TV. – Esse trabalho é muito estressante mesmo, ele precisa se aposentar – pensava Helena.
Dona Helena também não havia reparado que Aníbal estava cada vez mais silencioso e irritado. Muito menos percebera o hálito etílico do marido no fim da tarde. Na verdade, ele descia no centro e não pegava mais a integração para empresa. Matava as horas ali mesmo.
Sentava na lanchonete, tomava um café, depois uma cerveja, conversava com outros trabalhadores apressados que paravam ali para o desejum. Tomava outra cerveja, comia um pastel de carne frito na gordura escura perto da hora do almoço.
Ia à loteria fazer uma “fezinha”. Vez ou outra entregava um cartão de visita onde se lia em vermelho: “Aníbal Ferreira Silva – Setor de Compras – Sintra Logística”. Esta era sua identidade, que ele tentava preservar a todo custo.
Por volta das cinco e pouco, pegava o transporte de volta para a casa, calculando o tempo certo de retorno para não dar bandeira para a família. Quando se adiantava mais que do esperado, passava na padaria e levava pães.
Heloísa desligou o telefone e, perplexa, entendeu a resignação de Aníbal na reunião de desligamento. Ela não compreendia como um senhor daquela idade, à beira da aposentadoria, recebera com tamanha sabedoria e tranquilidade a notícia da sua demissão. Nenhuma raiva ou revolta. Nada.
Naquela noite, ao se deitar, Heloísa chorou. Estava triste, angustiada com a dor do coração de Aníbal.
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