Aos que me conhecem mais proximamente, sobretudo que não conviveram comigo na infância e pré-adolescência, não podem imaginar o quanto a timidez me dominava. Reconheço que a partir de um determinado momento, por deliberação própria, chutei o balde. Nessa transição, percebi alguns momentos de excesso, até conseguir encontrar – a meu juízo – uma média ponderável e recomendável. Porém, não o suficiente para abdicar de uma confortável irreverência.
As considerações são para entrar no assunto pretendido para esta resenha de hoje. Brasileiro, mineiro, do Araxá e filho de uma modesta família, jamais imaginei que algum dia colocaria os pés fora do país. Na verdade, passei décadas entre a minha cidade natal e aquela que me adotou e me fez seu filho – com direito à sessão solene na Câmara Municipal –, que é Belo Horizonte. Eventualmente uma ida à praia, especialmente do Rio e Espírito Santo, raramente noutras regiões do território nacional.
Sair do país, só mesmo uma decisão futebolística do meu time do coração me levou, acredite, até Assunção, do Paraguai. Depois, pela mesma razão, fui ao Marrocos, com parada em Madrid, Espanha. Pronto! Já pisei em três continentes. Mal imaginava que essa ousadia, aliada a dois fatores à frente, me levariam de volta a uma curta turnê na Europa e ainda depois ao México. No primeiro caso, visitar minha filha em período de intercâmbio na Inglaterra e a seguinte, novamente, para acompanhar o meu time.
Pois bem, com toda a magia que isso me proporcionou, não imaginava o quanto esses passeios me serviram para valorizar ainda mais o meu Brasil. Conhecer Londres (minha passagem pela migração e outros casos merecem outra postagem), depois na Espanha – novamente Madrid – e ainda Toledo, Ávila (tinha de conhecer), Segóvia e Barcelona; Roma; Paris; de volta à Londres e segui então sozinho para Lisboa. Minha filha me acompanhou em grande parte do trajeto, uma vez que só falo “brasileiro” e ela agrega inglês e espanhol. Em Portugal, me virei sozinho.
Já sobre o complexo de vira-lata que deixei nesta minha experiência internacional (breve ainda vou fazer algo similar), diria que lá no velho mundo também sofrem dos mesmos males que aqui dizemos ser “coisa de brasileiro”.
Em Londres, bem próximo de onde fiquei e a caminho da Oxford – uma das ruas mais movimentadas daquela cidade –, passei por muita sujeira no meio-fio, ambulantes no meio da rua, vendedores de lojas avançando sobre a calçada, uma multidão se engalfinhando para pegar o metrô na hora do pico. Enfim, nada que imaginava sobre o glamour inglês, antes de assistir a isso.
Na Espanha, com tanta coisa linda – parques em Madrid, igrejas e museus de Toledo, as muralhas de Ávila, o enorme duto de Segóvia, rumamos a Barcelona. Que maravilha, sobretudo sentir o carinho que eles têm pelos brasileiros, principalmente por causa do Ronaldinho. Ao me despedir daquela cidade, fui “roubado” numa estação de metrô. Um gentil moço, atencioso com o pré-idoso, ajudando a passar pela roleta, levou minha carteira, com euros e documentos. Por sorte, o passaporte e o maior volume de dinheiro estavam na cintura, naquelas bolsas que colocamos dentro da calça.
Seguimos, então, deixando de lado o inconveniente. Roma é a expressão pura do catolicismo. Para um kardecista, com eu, não deixou de ser emocionante visitar o coliseu, a poucos metros de onde ficamos, e – claro – a Praça de São Pedro. Emocionante avistar e aproximar daquele lugar. Já em Paris, com direito a tudo que a cidade oferecesse, o inconveniente. Não falam qualquer outra língua, passamos o maior aperto. A versatilidade da filha não era suficiente para comunicar com a má vontade deles, fosse em português, inglês ou espanhol. Nem por isso, prejudicou o encanto com a cidade luz.
Deixando ela de volta ao seu habitat momentâneo, fui encarar Portugal. Que lugar delicioso, Lisboa é mesmo uma “bela cidade”, mas lá andei com todo cuidado, alertado pelos próprios portugueses sobre os locais em que deveria passar. Desde Belém, para saborear o pastel, até a região central, onde a cada dia o prato era um bacalhau diferente. Em resumo, os porteiros do hotel alertaram “não se descuide dos maus elementos que rondam pela cidade”.
Já na outra ocasião, indo ao México, precisamente em Guadalajara, ficamos por três dias. Pude visitar alguns lugares interessantes, como o mercado da cidade. Afirmo, sem medo de errar, que é um lugar bastante legal, mas o Mercado Central de Belo Horizonte é infinitamente muito mais interessante. Outro lugar que fui, um Shopping Center, a céu aberto. Isso mesmo, como se fossem pavilhões de um parque de exposições aqui, com suas lojinhas. E os táxis? Sem comentários, pensei que ia ter de ajudar o motorista a empurrar o veículo na volta para o hotel.
Curei meu complexo de vira-latas: temos tudo aqui, seguramente, muito melhor e perto de casa. Me sinto mais seguro assim, até porque sei onde ando e quem vejo. Mas vou voltar, nem que seja para reafirmar o que digo.
Olá,
Primeira vez que entro aqui e me deparo com um cara que tá assumindo sabedoria no alto da sua condição de “pré-idoso”. Gostei da sua leitura dos lugares, que certamente são maravilhosos com certeza, mas que ainda assim preferimos o nosso Brasil, apesar de tantas coisas erradas. Fiquei surpreso de saber que sua arrogância, digo irreverência, são coisas da paixão movida pelo futebol.
Abs.
E boa sorte com seu time.
Assim … nem tanto ao mar, nem tanto a terra …
Sou de Belo Horizonte e morei um tempo em Dublin, na Irlanda. Lá me casei com uma polonesa. Voltamos para o Brasil e agora moro na Polônia. Em relação a alguns aspectos é fato que estamos séculos atrás e somos vira-latas mesmo. Parte da nossa população – por fatores diversos – é semi-civilizada. Em outros quesitos, não. Estamos muito à frente, principalmente sobre as coisas ligadas ao nosso jeito de ser – o que faz uma grande diferença.
Dublin é uma cidade muito legal e recebe gente de todas as partes – embora sendo ‘pequena’. Tem a cultura local interessante, mas tem seus problemas também. No que diz respeito ao país, vive-se muito bem lá. Melhor que o Brasil quanto ao que o país oferece aos seus cidadãos. No que diz respeito à natureza, é um desastre. Um clima muito depressivo durante boa parte do ano.
Aqui na Polônia não existe violência. Não existe MESMO. Você pode andar a qualquer hora do dia ou da noite que não acontece nada. O transporte público é fan-tás-ti-co. Varsóvia é mais ou menos do tamanho de BH mas você chega fácil e calmamente onde quer que for. Uma cidade linda. Na primavera a natureza explode em brilho e cor. O verão é muito quente. Mas lembre-se de nunca fazer turismo aqui no inverno (rs) é outra cidade estando no mesmo lugar. Por ser uma cultura mais tradicional há muito menos drogas, prostituição e tudo que vem junto com isto. É uma cidade sadia para se viver. Não se acha um papel de bala no chão, tudo muito limpo. Em Varsóvia há estrangeiros, mas muito menos que nos países do ocidente. Por conta disso a cultura local fica bem preservada.
Em relação aos países do ocidente europeu, com esta coisa da migração desenfreada de gente pra cá e prá lá agora, a coisa funciona assim: se você quer conhecer a Inglaterra, não vá para Londres. Se você quer saber como é a França e ver franceses, não vá para Paris. As principais cidades da Alemanha vão sendo tomadas por islâmicos e indianos assim como nestes outros grandes países. Diz-se que a situação na Bélgica é dramática. Por aí vai. Então, o glamour destas cidades meio que ficou no passado … e sobreviveu bem até o início dos anos 2000. Agora … sabe-se lá o que é ou como vai ser isto.
Mas … uma dica, o leste europeu é muito mais legal de visitar que o ocidente: believe-me! Caso queira visitar a Polônia um dia posso lhe mostrar a capital polonesa, que é linda na primavera e no verão. O meu e-mail vai aí no contato. Podemos tomar um café, andar e bater-papo. O único senão (que não será um problema para nós) é que eu visto a camisa azul (rs). Sinta-se convidado.
Obrigado, amigo. Na próxima aventura, farei contato.
Deve ser muito bom para aqueles com perfil “nórdico”, sejamos sinceros!
Penso que a maior diferença reside no fato de que lá, existe maior consequência para todos os atos praticados, diferentemente, aqui no Brasil, o discurso antiético do bandido inocente versus sociedade culpada, assumiu patamares absurdos.
Gostei! Forte Abraço!
Deixa eu consertar uma coisa aqui sobre a IRLANDA, por questão de justiça e consciência: expressei-me mal: eu disse que lá a ‘natureza é um desastre’. Sorry, I made a mistake. A natureza não é um desastre lá, na verdade é o contrário, é linda! O que é muito ruim é UM ASPECTO DA NATUREZA para nós brasileiros especialmente: o tempo frequentemente está nublado, frio e com vento. Por outro lado, nunca vi na minha vida um verde tão intenso como o de lá. Tampouco, um ar tão puro. Ainda, o país é muito bonito, com paisagens únicas. A natureza é sim exuberante, embora diferente da nossa.
Ótimo texto, camarada! Concordo com todos os pontos abordados. O Brasil não passa de uma extensão da velha Europa, com direito a todos os problemas sócio-estruturais que eles enfrentavam em outrora. Brasileiros comem queijos, pães, fazem crochê, tomam vinho, são cristãos e colocam a igreja como centro do pensamento filosófico. Ou seja, somos europeus, mas fora da Europa e com algumas décadas de atraso econômico. É por isso que por aqui existe o tal “eurocentrismo”, uma visão de mundo que tende a colocar a Europa como o centro da cultura do mundo. Mas o mundo é muito grande… e temos muita cultura boa por aí. Se por um lado não há grandes diferenças entre certas vivências brasileiras e européias, por outro, temos lugares avançadíssimos que colocam qualquer cidade da Europa no chinelo, em todos os aspectos. Aliás, até mesmo na Europa temos lugares muito mais avançados que Madri, Lisboa ou Londres. Os países nórdicos são referência em organização e desenvolvimento. Alemanha idem. Suíça também. Mas fora da Europa tem muita coisa boa. Estive em Tóquio há um tempo atrás… meu amigo, se você jogou seu complexo de vira-lata fora indo pra Europa, se você for ao Japão te garanto que você vai acabar contraindo o complexo novamente. Tóquio é a metrópole mais limpa, mais rica e segura do planeta. Lá você não precisa se preocupar com assaltos, furtos ou coisa do tipo. Sou fotógrafo, andava com meu equipamento no ombro 2h da manhã em baixo dos viadutos das regiões centrais sem uma gota de sentimento de ameaça – isso numa metrópole com 37 milhões de habitantes, 8 vezes maior que a Grande BH. Isso sem falar na eficiência da cidade com seus 5 mil quilômetros de trens e metrôs urbanos. Isso sem falar na cordialidade japonesa, o respeito ao próximo, o exímio atendimento em qualquer tipo de estabelecimento. Impossível não nos sentirmos atrasados quando vamos ao Japão. Eu e minha esposa voltamos de lá tão deprimidos que vendemos nossa empresa e demos um jeito de nos mudar pra terra do sol nascente – estaremos indo dentro de algumas semanas, de mala e cuia, sem passagem de volta. Enfim, desculpe-me pela intromissão em seu portal. Seu texto foi excelente e concordo com tudo o que disse, no que se refere à Europa. Mas tenho certeza que se você conhecer Tóquio, ou outras cidades da Ásia como Seul, Osaka, Hong Kong Cingapura, Xangai, você vai ter uma outra visão sobre a Europa – e sobre o Brasil.
Oi Eduardo e Amigos, boa tarde!
Infelizmente, ainda não tive o prazer de cruzar as fronteiras do Brasil.
Decedente de italianos, sonho ainda um dia poder conhecer a Itália.
Como Kardecista e entre os amigos, às vezes brinco, que nascer no Brasil é uma senhora provação.
Há momentos que parecemos estar vivendo no umbral.
Brincadeiras à parte, mesmo com tantas desigualdades, ainda amo muito este país.
Abraços,
Nossa ,realmente Tókio deixa qualquer nação com complexo de vira lata!!!
O qie mais me impressionou além de tudo que o amigo falou,foram os carros…como brilham…parecem tds
recém-saidos da concessionária!Inclusive os carros de serviço como caminhões de lixo .
Du excelente cronica. Mais gratificante após adicionarmos os comentários. Viajamos pelo mundo com visões de brasileiros e comparando as culturas. Concluímos que nos falta basicamente, maior desenvoltura econômica e EDUCAÇÃO. Concluímos também que somos um povo privilegiado. Comparando as culturas verificamos que apesar de estarmos na infância com nossos 500 anos, na verdade podemos nos considerar adultos precoces.