Universo DC: um balanço final

Com o final do Universo Extendido DC, ou DC Extendend Universe, que atendia pela sigla DCEU, cabe fazer um ranking com todas as produções lançadas. Indo de 2013 a 2023, esse universo foi marcado por uma total falta de coesão, já que os filmes pouco têm a ver uns com os outros e boa parte não se comunica com os demais, nem parecendo fazer parte de um todo. Ou seja: o oposto do que fez a Marvel, cujos filmes são tão interligados que parecem um esquema de pirâmide: precisa ver um para entender o outro e assim sucessivamente.

Com a contratação de James Gunn e Peter Safran (acima) para liderarem o departamento de filmes em live action (com atores), as coisas devem mudar. No primeiro anúncio oficial da dupla, já foram enfileiradas uma sequência de filmes e séries que farão sentido como um todo, construindo o novo DCU – ou Universo DC. Ao que tudo indica, eles darão maior liberdade aos artistas envolvidos, principalmente diretores e roteiristas, ao contrário do que vinha sendo feito até então, com cineastas querendo lançar uma segunda versão de seus filmes como a definitiva.

Confira, abaixo, a ordem de colocação entre as 16 produções do finado DCEU (com links para as críticas completas) e comentários rápidos:

16- Esquadrão Suicida (Suicide Squad, 2016)

Atrocidade cometida por David Ayer, cujo resultado, segundo ele, ficou muito longe do que ele havia planejado. Várias músicas excepcionais são desperdiçadas numa trama sem sentido que reúne personagens sem sentido, como a ótima Arlequina, que é totalmente desperdiçada em meio a um supergrupo ao qual ela não pertence. Horroroso!

15- Besouro Azul (Blue Beetle, 2023)

Primeiro herói latino que vemos na telona traz todos os estereótipos possíveis e personagens irritantes que só gritam, numa trama que não faz sentido com uma vilã genérica e chata. Por incrível que pareça, o personagem segue adiante no novo universo DC (DCU), mas esperamos poder esquecer essa besteira.

14- Shazam! Fúria dos Deuses (Shazam! Fury of the Gods, 2022)

O escopo do filme é aumentado, para ter uma ameaça maior, mas os buracos de roteiro acabam sendo enormes também. Vilãs inexpressivas desperdiçam a grande Helen Mirren e destroem a cidade, colocando o público numa situação de anestesia, sem se importar com o que possa acontecer. Personagens tomam determinadas atitudes apenas para que o filme possa seguir, mesmo que sem o menor sentido.

13- O Homem de Aço (Man of Steel, 2013)

Cuspindo no cânone do Homem de Aço, Zack Snyder inicia esse universo DC irritando boa parte dos fãs do herói. Se fossem só alterações, tudo bem. No entanto, ele mexe onde fica sem sentido, tipo um filho deixando o pai morrer sendo que ele poderia facilmente interferir. Tudo é muito chutado, com soluções fáceis, mas não sem antes destruir quase toda Metrópolis numa luta interminável e cansativa – para quem está assistindo. O universo DC parecia morto em seu nascimento.

12- Batman vs Superman: A Origem da Justiça (Batman v Superman: Dawn of Justice, 2016)

Temos, aqui, um Superman totalmente insosso sendo introduzido ao Batman de Ben Affleck, um ator limitado, mas que funciona bem no papel. A trama, e o principal, o seu desenrolar, são ridículos, com todo um conflito sendo resolvido por um nome. Para que se tivesse uma pancadaria entre os dois, era preciso ter um problema a ser trabalhado no braço, mas tudo ficou bem ridículo. Os coadjuvantes ajudam, como o Alfred de Jeremy Irons, e a introdução da Mulher-Maravilha (e sua marcante trilha) impedem por pouco o filme de se tornar uma bobagem.

11- Mulher-Maravilha 1984 (Wonder Woman 1984, 2020)

Execrado a torto e a direito, o longa traz símbolos da década de 80 para situar sua trama, protagonizada por uma heroína que tenta se manter em segredo mesmo se escancarando em frente a museus e câmeras de televisão. A diretora e roteirista Patty Jenkins constrói uma aventura divertida, sem sentido em certos momentos, que não chega a lugar algum. Parece uma daquelas histórias em quadrinhos que você se esqueceu de ter lido.

10- Liga da Justiça (Justice League, 2017)

Com um diretor que conhece bem o Universo Marvel (Joss Whedon, dos dois Vingadores), ficou mais fácil repetir alguns acertos da editora rival. A dinâmica entre alguns dos ícones da DC funciona, mesmo que tudo termine de maneira afobada e sem qualquer apelo ao público. Suas histórias pregressas são razoavelmente desenvolvidas e a dinâmica entre eles funciona, com tudo soando bem superficial.

9- Liga da Justiça de Zack Snyder (Zack Snyder’s Justice League, 2021)

Depois de ele próprio puxar o coro dos fãs, Zack Snyder conseguiu junto à DC fazer sua versão da Liga da Justiça. Remontando as cenas já filmadas, usando duas vezes a duração original e dividindo em capítulos, o diretor desenvolveu sua visão e deu mais tempo de cena para cada herói, mas ainda continuou sobrando estilo e faltando conteúdo.

8- Adão Negro (Black Adam, 2022)

Fazer um filme com um vilão forte e não poder usar um herói à altura, no caso Shazam, é sem sentido, e colocam vários heróis “menores” para Adão Negro enfrentar, deixando sempre o foco em Dwayne “The Rock” Johnson. A relutância em mostrá-lo como vilão incomoda e falta nexo à história, mas os demais personagens são bem feitos e a ação desenfreada mantém o público entretido, sem pensar muito. E percebemos a dedicação de Johnson ao projeto, que teria tido um futuro longo na DC se a bilheteria justificasse.

7- Aquaman e o Reino Perdido (Aquaman and the Lost Kingdom, 2023)

Se não revoluciona nada, ao menos diverte e dá continuidade à saga do herói dos mares fazendo sentido. Alterna bem humor e tensão e ainda deixa uma discreta mensagem de defesa ambiental. Depois de tantos tropeços, James Wan encerra bem este universo DC e Jason Momoa se despede do personagem.

6- Aves de Rapina: Arlequina e sua Emancipação Fantabulosa (Birds of Prey and the Fantabulous Emancipation of One Harley Quinn, 2020)

Raro caso de personagem menor, geralmente associada a um maior, que se dá bem sozinha. Ou não exatamente, já que ela ganha outras companhias bem interessantes. O longa aproveita o sucesso de Margot Robbie como Arlequina dando a ela o protagonismo, com um roteiro raso e um vilão mequetrefe. Tudo é bem amarrado pela diretora Cathy Yan e quase não percebemos a falta de substância.

5- The Flash(2023)

Finalmente ganhando sua aventura solo, o Flash do problemático Ezra Miller chega ao ápice de seu poder e percebe que consegue viajar no tempo e espaço, sendo assim a figura que nos revela a complexidade do multiverso DC. Isso permite ao filme usar várias participações especiais e elas acabaram chamando muita atenção, com direito a três Batmen – e é ótimo rever Michael Keaton no papel. Miller segura bem a peteca com dois personagens e entretém belamente o público.

4- Shazam! (2019)

Um herói que é uma criança num corpo adulto, mas com bons ideais, escolhido por um mago milenar para ser o campeão dele na Terra. A ideia funciona na prática e o filme é divertido, com um vilão bem desenvolvido e atuado – cortesia de Mark Strong – e toda uma família de coadjuvantes interessantes, que funcionam. Uma aventura leve, divertida, onda a esperança prevalece, muito longe do que Zack Snyder vinha fazendo.

3- Mulher Maravilha (Wonder Woman, 2017)

Uma das melhores caracterizações da DC, a Mulher-Maravilha de Gal Gadot tem a sua história contada em meio à Segunda Guerra Mundial. Um filme devidamente iluminado, que passa uma mensagem de esperança, ao contrário das obras sombrias de Zack Snyder. Com um discreto aceno ao feminismo, a diretora Patty Jenkins aproveita uma personagem geralmente insossa nos quadrinhos e faz uma aventura de fôlego e conteúdo.

2- O Esquadrão Suicida (The Suicide Squad, 2021)

Durante um curto imbróglio com a Marvel, James Gunn (responsável pelo sucesso dos Guardiões da Galáxia) se viu disponível para a editora rival e assumiu o Esquadrão Suicida, que havia tido um longa terrível cinco anos antes. Reorganizando tudo, Gunn trouxe novos personagens, aproveitou os que julgou pertinentes e criou uma história bem amarrada e divertida, do tipo que esperamos quando assistimos a uma adaptação de história em quadrinhos.

1- Aquaman (2018)

Seguindo a fórmula da Marvel, com aventuras solares bem desenvolvidas e bem humoradas, James Wan chegou ao universo DC trabalhando um personagem que nunca foi estrela na editora, mas encontrou o intérprete perfeito. Na pele e barba de Jason Momoa, Aquaman se tornou um sujeito interessante, e cercado por bons coadjuvantes, com um elenco fantástico e muito acertado. Assim como o Homem de Ferro fez na rival, Aquaman chegou como quem não queria nada e logo assumiu o primeiro lugar no DCEU.

Correndo por fora, temos O Pacificador, série de TV dirigida por James Gunn, o mesmo diretor que comandou O Esquadrão Suicida (de 2021) e aproveitou um personagem de lá para desenvolver uma história independente. O sujeito vivido por John Cena continua bem estúpido, algo que Cena faz muito bem, e seu círculo de coadjuvantes funciona muito bem, algo como um Inspetor Closeau, de A Pantera Cor de Rosa. A trama, absurda, é desenvolvida de forma que a compremos, e ainda torcemos por esse anti-herói.

Zack Snyder deu o adeus definitivo ao universo DC

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Pacote de séries – maio 2024

Confira comentários rápidos sobre 10 séries que estrearam recentemente em streamings variados.

 

Ripley (Netflix)

Do universo criado pela grande escritora Patricia Highsmith, Ripley reconta a trama do livro O Talentoso Ripley, que já chegou ao cinema em 1960 (O Sol por Testemunha) e em 1999 (O Talentoso Ripley). Andrew Scott (acima) é ótimo, mas faz um Ripley mais velho do que o personagem deveria ser, o que fica esquisito. A fotografia, no entanto, é ótima e a duração permite desenvolver melhor certas passagens.

 

Bebê Rena (Netflix)

Um barman oferece uma xícara de chá para uma cliente sem dinheiro e passa a ser seguido por ela, que fica obcecada por seu “bebê rena”. Duas pessoas psicologicamente complicadas num embate que vai do nonsense ao trágico, numa história dita real da qual não sabemos o que de fato teria acontecido.

 

Monsieur Spade (AMC)

Criativa imaginação da continuação da vida do clássico detetive noir Sam Spade, criação de Dashiell Hammett. Clive Owen está muito bem como o sujeito durão, de coração mole, que precisa resolver um mistério sangrento no interior da França dos anos 60.

 

Sugar (Apple TV)

História policial com o nosso Fernando Meirelles na direção de cinco episódios e Colin Farrell como um detetive irritantemente bonzinho, que não gosta de violência e busca pessoas desaparecidas. A trama intrincada envolve um produtor de cinema, cuja neta sumiu, e é sempre bom ver o veterano James Cromwell em cena.

 

Feud: Capote vs. The Swans (FX)

O famoso escritor Truman Capote volta a ser personagem na nova temporada de Feud, série antológica de Ryan Murphy que teve sua primeira temporada em 2017. Dessa vez, acompanhamos a briga de socialites de Nova York com o ex-amigo, que só conseguiu vencer um bloqueio criativo escrevendo as confidências delas para todos lerem. Indicado para quem gosta de saber da vida alheia, a popular fofoca, traz ótimas atuações de Naomi Watts, Diane Lane, Chlöe Sevigny e Tom Hollander, além do finado Treat Williams.

 

X-Men ‘97 (Disney+)

Como o nome já esclarece, trata-se da continuação da animação dos X-Men dos anos 90, exibida de 92 a 97. Atingindo em cheio marmanjos nostálgicos, a série traz a vida na mansão Xavier, frequentada pelos X-Men e pelos jovens mutantes que estudam lá. O tom é um pouco mais sério que anteriormente e temos os problemas de sempre dos personagens, que buscam uma existência harmoniosa com os humanos.

 

O Problema dos Três Corpos (Netflix)

Série americana metida a besta que adapta um livro chinês – que já havia virado uma série chinesa. Os responsáveis por Game of Thrones partem para outro tipo de ficção, dessa vez com alienígenas malignos e humanos chatíssimos tendo que garantir a sobrevivência da nossa raça. 

 

Borboletas Negras (Netflix)

Trama envolvente, cheia de reviravoltas, sobre um idoso que contrata um escritor para contar sua vida e ter um livro com a história. Bem atuada, a série francesa prende o espectador e faz querer chegar logo ao final.

 

Jury Duty (Amazon Prime Video)

Um toque de leveza em meio a tantas atrações pesadas, a série traz um sujeito comum que é convocado a ser jurado sendo que todos os demais envolvidos são atores. Há situações bem divertidas e a inocência de Ronald cativa.

 

The Bear S02 (Star+)

A segunda temporada leva a história adiante enquanto todos preparam o novo restaurante, com direito a Carmen se apaixonar e Richie brilhar sozinho.

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Grazi e Gianecchini são Uma Família Feliz

Expoente da literatura de terror nacional, Raphael Montes já vendeu estimados 500 mil livros e chamou bastante atenção quando a Netflix anunciou que um deles, Bom Dia, Verônica, coescrito por Ilana Casoy, se tornaria série. Depois, a mesma dupla escreveu os três filmes sobre o assassinato do casal von Richthofen. Agora, Montes chega ao Cinema com um roteiro original seu, que inclusive já virou livro: Uma Família Feliz (2024), suspense atualmente em cartaz.

Com um casal famoso da TV como protagonistas, o longa deve ter um público grande, mostrando que Cinema nacional não é só comédia padrão Globo Filmes (e sim, eles são produtores aqui). Reynaldo Gianecchini e Grazi Massafera vivem um casal que parece de novela: jovens, bonitos, bem sucedidos e com filhas lindas, além de um garoto a caminho. Moram em um condomínio confortável de um bairro chique carioca e são presentes na comunidade. Tudo corre muito bem para quem vê de fora, e até quem está muito perto tem motivos pra invejar aqueles dois. Até o dia em que a esposa é acusada de algo monstruoso.

Montes começa a história pelo final, deixando buracos que só serão preenchidos ao longo da sessão. A história é calmamente construída, com quase tudo fazendo sentido, e o início nos deixa apreensivos, esperando coisa ruim pelo caminho. O escritor e roteirista consegue manter o público no escuro e na ponta do sofá, elevando a tensão até um final nada fácil de engolir. Massafera, sempre com aquele sotaque forte que conhecemos de outros papéis, faz um bom trabalho, exagerando às vezes nas expressões dúbias.

Diretor experiente de filmes e séries, José Eduardo Belmonte tem no currículo boas obras, como Se Nada Mais Der Certo (2008) e os dois Alemão (2014 e 2022). O que pode deixar qualquer um com o pé atrás é o horroroso Billi Pig (2012), também com Grazi. Belmonte parece sabiamente ter desistido da comédia e mostra mão leve para conduzir a trama, deixando a história fluir e conseguindo de todos os envolvidos um bom trabalho. Até as meninas, Luiza Antunes e Juliana Bim, se mostram à altura das exigências.

Alguns assuntos espinhosos são trabalhados em Uma Família Feliz, começando pela dificuldade de se manter uma família realmente feliz, e não só nas aparências. A cultura do cancelamento e a depressão pós-parto também aparecem, nada muito aprofundado. Montes evita os erros cometidos em Verônica, série que já começa mal e termina terrível em sua terceira temporada, e conta uma boa história carregada de tensão. Suspenses não são tão comuns quanto a comédia, por exemplo, mas o nosso Cinema tem diversas ótimas opções.

Belmonte e Montes, diretor e roteirista, posam para foto

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Oscar 2024 – Indicados e Previsões

Com apresentação de Jimmy Kimmel (abaixo), que exerce a função pela quarta vez, a 96ª cerimônia de entrega dos Oscars acontece neste domingo, 10/03. O recordista de indicações da vez é Oppenheimer, com 13, de um total de 23 categorias. Logo depois está Pobres Criaturas, com 11, e é seguido por Assassinos da Lua das Flores, com 10 – e lamentavelmente não deve levar nada.

Pela primeira vez, três dos 10 indicados a Melhor Filme são dirigidos por mulheres. Apenas uma delas, no entanto, foi indicada na categoria de Direção (Justine Triet, de Anatomia de Uma Queda). Outro indicado, Martin Scorsese (de Assassinos), bateu o recorde de idade na categoria, aos 81 anos. Sua montadora habitual, Thelma Schoonmaker, também fez história ao ser indicada pela nona vez. E ainda de Assassinos, Lily Gladstone é a primeira atriz indígena de ascendência americana a ser indicada – e a única que parece oferecer risco ao prêmio de Emma Stone, que deve levar seu segundo Oscar (o primeiro foi por La La Land, de 2016).

Abaixo, você confere a lista de indicados por categoria, com links para as críticas disponíveis no Pipoqueiro. O número 1 em frente indica o meu palpite para o vencedor e o número 2 indica aquele que eu gostaria que ganhasse. Se os dois coincidirem, terá apenas um X.

  • Melhor Filme

Anatomia de Uma Queda

Barbie

Ficção Americana

Os Rejeitados

Assassinos da Lua das Flores – 2

Maestro

Oppenheimer – 1

Vidas Passadas

Pobres Criaturas

Zona de Interesse

  • Melhor Direção

Justine Triet – Anatomia de Uma Queda

Martin Scorsese – Assassinos da Lua das Flores – 2

Christopher Nolan – Oppenheimer – 1

Yorgos Lanthimos – Pobres Criaturas

Jonathan Glazer – Zona de Interesse

 

  • Melhor Ator

Bradley Cooper – Maestro

Colman Domingo – Rustin

Paul Giamatti – Os Rejeitados

Cillian Murphy – Oppenheimer – X

Jeffrey Wright – Ficção Americana

 

  • Melhor Atriz

Annette Bening – Nyad

Lily Gladstone – Assassinos da Lua das Flores – 2

Sandra Hüller – Anatomia de Uma Queda

Carey Mulligan – Maestro

Emma Stone – Pobres Criaturas – 1

 

  • Melhor Ator Coadjuvante

Sterling K Brown – Ficção Americana

Robert De Niro – Assassinos da Lua das Flores – 2

Robert Downey Jr. – Oppenheimer – 1

Ryan Gosling – Barbie

Mark Ruffalo – Pobres Criaturas

 

  • Melhor Atriz Coadjuvante

Emily Blunt – Oppenheimer

Danielle Brooks – A Cor Púrpura

America Ferrera – Barbie – 2

Jodie Foster – Nyad

Da’Vine Joy Randolph – Os Rejeitados – 1

 

  • Melhor Roteiro Original

Anatomia de Uma Queda— Justin Triet, Arthur Harari – X

Os Rejeitados — David Hemingson

Maestro — Bradley Cooper, Josh Singer

Segredos de um Escândalo — Samy Burch, Alex Mechanik

Vidas Passadas — Celine Song

 

  • Melhor Roteiro Adaptado

Ficção Americana – Cord Jefferson

Barbie – Greta Gerwig, Noah Baumbach

Oppenheimer – Christopher Nolan – X

Pobres Criaturas – Tony McNamara

Zona de Interesse – Jonathan Glazer

 

  • Melhor Canção Original

The Fire Inside – Flamin’ Hot – O Sabor que Mudou a História

I’m Just Ken – Barbie – 2

It Never Went Away – American Symphony

Wahzhazhe (A Song For My People) – Assassinos da Lua das Flores

What Was I Made For? – Barbie – 1

 

  • Melhor Trilha Original

Ficção Americana

Indiana Jones e a Relíquia do Destino

Assassinos da Lua das Flores – 2

Oppenheimer – 1

Pobres Criaturas

 

  • Melhor Filme Internacional

Eu, Capitão

Dias Perfeitos

A Sociedade da Neve

A Sala dos Professores

Zona de Interesse – X

 

  • Melhor Animação

O Menino e a Garça – 1

Elementos

Nimona

Meu Amigo Robô

Homem-Aranha: Através do Aranhaverso – 2

 

  • Melhor Documentário

Bobi Wine: The People’s President

A Memória Infinita

As 4 Filhas de Olfa

To Kill a Tiger

20 Dias em Mariupol – X

 

  • Melhor Figurino

Barbie – 2

Assassinos da Lua das Flores

Napoleão

Oppenheimer

Pobres Criaturas – 1

 

  • Melhor Maquiagem e Penteados

Golda – A Mulher de Uma Nação

Maestro

Oppenheimer

Pobres Criaturas – X

A Sociedade da Neve

 

  • Melhor Design de Produção

Barbie

Assassinos da Lua das Flores

Napoleão

Oppenheimer

Pobres Criaturas – X

 

  • Melhor Som

Resistência

Maestro

Missão: Impossível – Acerto de Contas Parte Um

Oppenheimer

Zona de Interesse – X

 

  • Melhor Montagem

Anatomia de Uma Queda

Os Rejeitados

Assassinos da Lua das Flores

Oppenheimer – X

Pobres Criaturas

 

  • Melhor Fotografia

O Conde

Assassinos da Lua das Flores

Maestro

Oppenheimer – X

Pobres Criaturas

 

  • Melhores Efeitos Visuais

Resistência

Godzilla Minus One – X

Guardiões da Galáxia Vol. 3

Missão: Impossível – Acerto de Contas Parte Um

Napoleão

 

  • Melhor Curta

The After

Invincible

Knight of Fortune

Red, White and Blue

The Wonderful Story of Henry Sugar – X

 

  • Melhor Curta Animado

Letter to a Pig

Ninety-Five Senses

Our Uniform

Pachyderme

War Is Over! Inspired by the Music of John & Yoko – X

 

  • Melhor Documentário Curta

The ABCs of Book Banning – X

The Barber of Little Rock

Island In Between

The Last Repair Shop

Nǎi Nai and Wài Pó

O tradicional jantar dos indicados reuniu todo esse pessoal

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Oscar 2024: comentários de um convidado

por Alexandre Marini

Marcelo Seabra me convidou para escrever um pouco sobre minha percepção a respeito dos indicados ao Oscar de melhor filme. Ele sabe que não sou crítico de cinema — sou apenas casado com uma —, por isso falo do confortável lugar de espectador. Assisti a todos os dez, mas este texto é sobre aqueles que mais tenho recomendado aos amigos. E sem spoilers.

Zona de Interesse (The Zone of Interest)

O filme se inicia com uma tela totalmente escura e, por um tempo, o espectador só ouve sons que não consegue distinguir. Essa foi a forma interessante escolhida para apresentar um discreto personagem que permanecerá ao fundo durante todo o filme: o som da queima dos fornos de Auschwitz. Zona de Interesse aborda o quanto as pessoas podem se fechar em si mesmas a ponto de se importarem somente com suas posições ou interesses, ignorando todo o contexto restante. Sem mostrar nada — nem uma morte sequer —, o horror está lá, o tempo todo. É o retrato da banalidade do mal e um alerta, ao percebermos que as condições para que isso se repita não são muitas e, pior, estão por aí.

Pobres Criaturas (Poor Things)

Pobres Criaturas traz uma leitura muito forte do domínio do homem sobre a mulher, mas vai além disso. Sem puritanismos, fala também sobre a descoberta do prazer e o que fazemos com ela, a exploração do corpo, o egoísmo capitalista e a empolgação juvenil com suas alternativas. No entanto, ao meu ver, o conjunto da obra aponta para a desumanização generalizada que acontece quando não vemos os outros como detentores de direitos iguais, especialmente quando o dinheiro e a satisfação de vontades mesquinhas vêm em primeiro lugar, estruturando nossas relações. Assim, o filme nos faz olhar no espelho, pobres e assustadoras criaturas que nos tornamos.

Vidas Passadas (Past Lives)

Amei cada instante do filme. A premissa não é nada complexa: retrata dois adultos de países e vidas diferentes que se reencontram. Ambos guardam lembranças de uma amizade amorosa da infância, quando estudavam na mesma escola e viviam na mesma vizinhança. Enquanto ele continua sua vida na Coréia do Sul, ela se muda para o Canadá, originando trajetórias distintas. A distância, as mudanças culturais, os desafios individuais e as expectativas mútuas são abordados com delicadeza. O constrangimento entre eles, o dilema de desejar, mas não poder ou não conseguir, e o respeito pela vida distante do outro permeiam a narrativa. Esse sentimento de constrangimento, compartilhado com os espectadores, é um aspecto marcante do filme. Poucas obras conseguem nos fazer sentir o que os personagens experimentam de maneira tão sutil: a dúvida entre estreitar laços ou desfazê-los, o desejo de que tudo dê certo de uma vez ou de encerrar e seguir em frente.

Os Rejeitados (The Holdovers)

De vez em quando, surge um filme que retrata a vida do professor e conquista o público. O personagem principal, interpretado por Paul Giamatti, é daqueles que perseveram na docência, que não abrem mão do conhecimento e da exigência como formas, ainda que tortuosas, de transformar meninos mimados em homens dignos. O longa se passa em um internato masculino na década de 80, onde alguns alunos terão que passar o período natalino na escola sob a supervisão do professor, criando a premissa para que os personagens se conheçam além das notas e das listas de presença. A beleza do roteiro está em mostrar que o verdadeiro aprendizado dos estudantes e o compromisso do educador transcendem os conteúdos escolares, embora isso mal seja percebido pelos próprios alunos e seus pais. Mesmo que isso faça toda a diferença na história de vida de cada um.

Ficção Americana (American Fiction)

Até quem não acredita em Deus reconhece que a crença nele afeta profundamente o comportamento humano, influenciando inclusive aqueles desprovidos de fé. No filme, o protagonista, um homem negro, diz que não acredita na ideia de diferentes raças. Instantaneamente, um táxi o ignora e prefere atender a uma pessoa branca próxima a ele, mostrando, de forma sutil, que as distinções raciais continuam a influenciar as interações sociais. Ficção Americana faz uma contundente crítica à ideia de que é possível transformar a sociedade pela linguagem, estratégia muito presente na academia e na militância de rede social. E chama a atenção para a capacidade do capitalismo de adaptar-se e continuar lucrando com o sofrimento da população negra: se já fez isso na escravidão, por que agora não lucraria vendendo livros e filmes sobre as consequências do que causou?

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Família da luta livre tem sua história contada em Garra de Ferro

A partir do final da década de 70 e por todos os anos 80, houve uma família que reinou no mundo da luta livre, prática conhecida nos Estados Unidos como Wrestling. Jack Adkisson criou um nome artístico para si, Fritz von Erich, e fez carreira nesse universo. E garantiu que cada filho que teve seguisse pelo mesmo caminho, eles querendo ou não. Como é costume nesse tipo de luta, cada lutador cria para si um golpe especial e isso se torna sua marca registrada. O golpe de Fritz von Erich era conhecido como a Garra de Ferro (The Iron Claw, 2023), que dá nome ao longa que chega aos cinemas essa semana.

O primeiro filho de Fritz a entrar para a luta livre, Kevin, é vivido por Zac Efron (de Operação Cerveja, 2022) e o ator deve ser a maior surpresa do longa. O corpo de Efron o cadidata ao papel de He-Man, e o corte de cabelo ridículo também. Muito bem caracterizado, ele dá a dimensão exata a seu personagem, o irmão mais velho (vivo) que quer cuidar de todos e ainda precisa aguentar os desmandos do pai, interpretado por Holt McCallany (da saudosa série Mindhunter). Projetando nos filhos o sucesso que não teve, ele perde de vista a vontade deles e impõe a sua, e tem ao lado uma esposa (Maura Tierney, de Querido Menino, 2018) permissiva, que finge não ver os problemas dos filhos.

Como o primogênito da família morreu aos cinco anos, Kevin se vê como o mais velho, e a escadinha segue com Kerry, o ótimo Jeremy Allen White (agora mais conhecido como O Urso). Kerry é quem mais se permite ser competitivo com os próprios irmãos e acaba sendo o personagem mais interessante, além de ter um intérprete que se funde ao papel. Allen White é outro que ficou impressionantemente forte, o que o afasta totalmente da premiada série que estrela. O outro destaque é Harris Dickinson, estrela em ascensão que chamou atenção em Triângulo da Tristeza (Triangle of Sadness, 2022) e aqui não faz feio.

Com dois longas bons e surpreendentes na carreira (Martha Marcy May Marlene, 2011, e O Refúgio, 2020), o diretor e roteirista Sean Durkin partiu para um trabalho mais convencional, e nem por isso menos impactante. Como havia muita história a contar, Durkin abriu mão de alguns personagens, como o irmão mais novo e um primo falso contratado por Fritz, e o longa ainda passou das duas horas. Marcada pela tragédia, a família von Erich não se permitia viver o luto, reflexo da busca cega do pai pelo troféu de campeão do mundo. É uma jornada dolorosa, mas interessante de se acompanhar.

Evitando os extremos, Durkin não cai na armadilha do sentimentalismo e nem transforma ninguém em um vilão caricatural. A recriação da época é bem apropriada e ainda salpicada por clássicos da música, como Don’t Fear the Reaper (Blue Öyster Cult) e Tom Sawyer (Rush), além da trilha original assinada por Richard Reed Parry, da banda Arcade Fire. Só continuamos sem entender, ao final de Garra de Ferro, como funcionam as lutas desse universo: os lutadores se consideram muito sérios, mas combinam golpes nos bastidores. Como é possível ter surpresa no vencedor e no perdedor de algo arranjado previamente?

Os verdadeiros von Erichs e o elenco do filme

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Parte Dois de Duna chega mantendo o nível

Depois das 2h35min da primeira parte, chega aos cinemas essa semana Duna: Parte Dois (Dune: Part Two, 2024), filme um pouco mais longo: 2h46min. Com mais de cinco horas, Denis Villeneuve honra o livro de Frank Herbert e o resultado em momento algum fica cansativo. Como na primeira, essa segunda parte trata de vários temas, principalmente o fundamentalismo religioso e o militarismo, o que nos permite fazer vários paralelos com o mundo em que vivemos. E é isso que as boas obras de ficção científica fazem: proporcionar discussões e reflexões sobre o hoje.

Mais uma vez contando com um elenco excelente, Villeneuve trouxe gente nova a bordo: Austin Butler (de Elvis, 2022), Florence Pugh (de Oppenheimer, 2023), Christopher Walken (de Além das Montanhas, 2020) e Léa Seydoux (de 007: Sem Tempo para Morrer, 2021). Todos estão muito bem em seus papéis, com destaque para Butler, que malhou bastante e está bem ameaçador como o psicótico Feyd-Rautha Harkonnen. O grande mérito na atuação, no entanto, é de Timothée Chalamet, que pela primeira vez aproveita a oportunidade e se torna um líder messiânico, alguém em quem todo um povo deposita suas esperanças. Bom, nem todo, mas Paul Atreides de fato cresce em relação à primeira parte. Continuações se beneficiam de não precisarem começar do começo, pulando apresentações e partindo logo para a ação.

Toda a parte técnica de Duna: Parte Dois é impecável: não à toa, o longa anterior ganhou seis Oscars de um total de dez indicações. O diretor repete vários de seus colaboradores habituais e o resultado novamente é dos melhores. Fotografia, cenários, figurinos, trilha, efeitos visuais e sonoros se fundem pelo bem da história, que é bem contada, e os créditos pelo roteiro são mais uma vez divididos entre o diretor e Jon Spaihts. Tudo é bem desenvolvido e os personagens ganham espaço para avançarem. Sabemos o que precisamos saber, o resto descobrimos com eles. E a sala IMax potencializa o resultado, com uma tela enorme e um sistema de som impactante que comanda o tremor das cadeiras.

Continuando de onde a Parte Um parou, Paul se une aos Fremen, o povo livre do deserto, e Stilgar (Javier Bardem) tem certeza de que o jovem é o enviado que a profecia indica. Lidando com esse misto de esperança e medo que todos têm dele, Paul busca juntá-los para derrotar os Harkonnen, casa que domina a produção de especiaria, maior riqueza desse universo. Como Rabban (Dave Bautista) não está cumprindo sua obrigação a contento, o Barão Harkonnen (Stellan Skarsgård) começa a preparar o sobrinho (Butler) para assumir o comando e derrotar o messias que tanto comentam. Enquanto isso, o Imperador (Walken) e a filha (Pugh) ficando tentando prever as próximas jogadas dos envolvidos para se manterem no poder.

As cenas dos exércitos Harkonnen se reunindo e se apresentando evocam imediatamente a simbologia nazista, o que pode ser associado ao crescimento da extrema direita pelo mundo, com grupos perdendo qualquer pudor de se assumirem como os fascistas que são. E a ideia de ter uma pretensa religião dominando pela promessa da chegada de um predestinado é algo que podemos facilmente entender. E o aspecto espiritual rapidamente se mistura ao aspecto político, mostrando por que é fundamental termos estados laicos. Essa Parte Dois é tão rica e bem sucedida que saímos do cinema torcendo por uma Parte Três.

Villeneuve apresentou o longa e o elenco na Comic-Con

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Pacote Oscar 2024

Conheça melhor alguns dos indicados ao Oscar 2024:

Maestro (indicado a sete Oscars)

Esforço gigantesco de Bradley Cooper, depois da elogiada estreia na direção com Nasce Uma Estrela (2018), para tirar o projeto do papel e contar a vida do maestro Leonard Bernstein. O resultado é tecnicamente correto, mas frio, e evita possíveis críticas ao personagem, que sai quase como um santo. A interpretação de Cooper é bem afetada e o nariz falso chama bastante atenção, dando espaço merecido para Carey Mulligan brilhar como a esposa de Bernstein. Causou grande barulho ao estrear na Netflix e logo foi esquecido. A campanha massiva de marketing deu frutos e o filme teve indicações descabidas ao Oscar.

Os Rejeitados (indicado a cinco Oscars)

O diretor Alexander Payne tem grande facilidade para trabalhar com personagens intragáveis e este é o caso do professor Hunham, numa nova parceria com o ótimo Paul Giamatti (de Sideways, 2004). No período de festas de fim de ano, os alunos de um colégio interno vão para casa e fica um grupinho que não tem para onde ir. Tido como difícil pelos colegas, o Prof. Hunham é escolhido pela direção, como castigo, para acompanhar os “rejeitados”, formando um trio inusitado com um aluno problemático (Dominic Sessa) e a cozinheira da escola (Da’Vine Joy Randolph). Filme divertido, gostoso de assistir, que guarda uma mensagem otimista para o final.

Ficção Americana (indicado a cinco Oscars)

Um humor irônico muito bem interpretado por todo o elenco, em especial os indicados ao Oscar Jeffrey Wright (Principal) e Sterling K. Brown (Coadjuvante). O diretor estreante e roteirista Cord Jefferson faz uma crítica aos guerreiros engajados que defendem causas que não conhecem e caem na primeira armadilha que aparece, como quem lê um livro altamente estereotipado e exagerado e sai dizendo ser a melhor coisa já escrita apenas pelo fato da escritora fazer parte de uma minoria (ou duas). Cansado de tentar vender livros inteligentes, o escritor negro Monk (Wright) coloca num texto todos os lugares comuns que conhece, fazendo o que julgava ser uma paródia, e vira um fenômeno. É bem interessante ver Monk lutando contra seu próprio sucesso repentino, vendo incrédulo as pessoas elogiarem o que considera um lixo.

Nyad (indicado a dois Oscars)

Uma das personagens mais irritantes vistas ultimamente, Diana Nyad era uma nadadora em sua juventude que acaba abandonando um sonho que tinha: ir de Cuba à Flórida a nado. Mandona e dona da razão, ela mobiliza uma equipe, liderada pela amiga Bonnie, para tentar realizar seu sonho. Detalhe: após os 60 anos. Correto e sóbrio, o filme refaz os passos (e braçadas) de Nyad e se firma nos ombros de suas atrizes, ambas merecidamente indicadas ao Oscar: Annette Bening (Principal) e Jodie Foster (Coadjuvante).

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Zona de Interesse revisita as atrocidades nazistas

A partir de 1941, durante a Segunda Guerra Mundial, os nazistas implementaram o que chamavam de “Solução Final da Questão Judaica” e, até o fim da guerra, em 1945, estima-se que tenham executado seis milhões de judeus. Isso sem falar em quem era acusado de ser comunista ou homossexual, prisioneiros de países inimigos, ciganos e outros grupos minoritários. Um dos principais nomes desse genocídio, que testou, aperfeiçoou e colocou em prática técnicas de assassinato em massa em campos de concentração, foi Rudolf Höss, oficial da SS e comandante de Auschwitz, o mais infame dos campos. Ele é o protagonista de Zona de Interesse (The Zone of Interest, 2023), que chegou aos cinemas recentemente.

Mesmo com os elogios recebidos por Sob a Pele (Under the Skin, 2013), Jonathan Glazer levou dez anos para dirigir outro longa, e escolheu adaptar o livro homônimo de Martin Amis. Ao contrário do escritor, Glazer preferiu ser mais claro e colocou nomes reais e situações comprovadas por documentos em seu roteiro, narrando um curto período na vida de Höss em que o nazista, a esposa e os cinco filhos viviam ao lado de Auschwitz, uma das muitas “zonas de interesse” de Hitler e seus asseclas. Ao mesmo tempo, o título também serve para descrever a sensação da esposa, Hedwig, que se via realizada por morar lá, numa casa confortável, com piscina e empregadas. Não ligava que isso tudo estivesse ao lado do inferno, exemplificando a teoria da banalidade do mal elaborada por Hannah Arendt.

Por todos os registros que se tem, Höss parecia um sujeito sereno, calmo, um corriqueiro cidadão de bem, que discutia a construção de câmaras de gás como quem elabora uma lista de compras no supermercado. Christian Friedel (de A Fita Branca, 2009), com o mesmo corte de cabelo horroroso visto em fotos da época, faz um ótimo trabalho, atraindo para si boa parte do ódio dos espectadores. Surpreendentemente, uma figura ainda mais nefasta era Hedwig, vivida de maneira magnífica por Sandra Hüller, indicada nas principais premiações nesta temporada como atriz principal de outro filme excelente: Anatomia de Uma Queda (Anatomie d’une Chute, 2023).

São várias as características louváveis do longa, como toda a recriação dos ambientes internos da época, dos mais simples aos suntuosos, e dos externos, como a entrada de Auschwitz e as paisagens idílicas dos arredores. O que mais marca, no entanto, é o desenho de som, justamente indicado ao Oscar. Como era possível aproveitar um dia ensolarado na piscina com tiros sendo ouvidos tão perto? Com diversos barulhos vindo do vizinho, todos indicando morte, tortura e afins? Seria muito merecido ter Tarn Willers e Johnnie Burn (este também de Pobres Criaturas, 2023) sendo chamados na premiação da Academia, nenhum outro filme da temporada usou tão bem o som.

Há momentos em Zona de Interesse em que temos a sensação de que Glazer conta com a experiência prévia de seu público, já que muito não é explicado. Situações são mostradas já iniciadas, exigindo um um pouco mais do espectador, o que é louvável e pouco comum, já que cineastas costumam incorrer no contrário: explicar demais. O longa cresce ao se pensar a respeito, mas (como escreveu meu amigo Tullio Dias) não é para ser visto mais vezes, e isso é um elogio. Dois ou mais socos seguidos no estômago fazem um estrago maior.

A discussão sobre formas de matar com mais eficácia corria tranquilamente

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Sobreviventes de acidente formam a Sociedade da Neve

Em 13 de outubro de 1972, um avião da Força Aérea Uruguaia bateu em uma montanha da cordilheira dos Andes e caiu. Ele levava uma equipe amadora de rugby para uma competição no Chile e tinha 40 passageiros, entres os jogadores, amigos e familiares deles, além de cinco tripulantes. Dos 45 envolvidos, 29 sobreviveram à queda, mas o que viria a seguir não seria nada fácil. Essa é a história contada em Sociedade da Neve (La Sociedad de la Nieve, 2023), longa que garantiu à Espanha uma indicação ao Oscar de Melhor Filme Internacional, além de ser lembrado também na categoria de Maquiagem e Cabelo.

Na cadeira de direção, o experiente J.A. Bayona já contou a história de outra tragédia: em O Impossível (The Impossible, 2012), acompanhamos Ewan McGregor e o filho mais velho (Tom Holland, o Homem-Aranha) tentando encontrar a esposa (Naomi Watts) e o caçula após o tsunami de 2004 na Tailândia. Juntando esse drama humano com os efeitos especiais de um Jurassic World: Reino Ameaçado (2018), Bayona tinha a bagagem necessária para contar o chamado “milagre nos Andes”.

Ao conseguirem fazer o rádio do avião funcionar, os rapazes escutam que as buscas por eles foram suspensas devido às terríveis condições climáticas no local. Ninguém acreditava que haveria algum sobrevivente. Por isso, quem ficou teve que se virar. E é impressionante a capacidade que eles demonstram de lutar pela vida, inventando formas de aproveitar o que tinham à mão. A informação que provavelmente ganhou mais ênfase com o passar dos anos foi a forma como eles conseguiram sobreviver: canibalismo. Na época, esse elemento foi mantido em segredo: muitos deles eram católicos e tinham medo de serem atacados pela Igreja – isso o filme apenas sugere.

O livro que serve de base ao roteiro de Bayona e seus três colaboradores foi escrito por Pablo Vierci, amigo dos sobreviventes, e lançado em 2008. A riqueza de detalhes na história de Vierci serviu como guia para o design de produção da obra, que conseguiu recriar os restos do avião, o que era essencial para entendermos os fatos. Em 1993, foi feita a versão hollywoodiana da história, Vivos (Alive), mas baseada em outro livro, cuja riqueza de detalhes não chega aos pés do livro de Vierci. Dessa vez, com atores menos conhecidos e prioritariamente uruguaios e argentinos. Muito competentes, de forma geral.

O maior mérito de Bayona em Sociedade da Neve talvez seja conseguir levar o público para perto dos personagens, nos fazendo ter uma ideia da tensão sentida por eles. Sem a necessidade de ser muito gráfico com o que há de pior, o diretor consegue comover sem ser piegas. E ainda há surpresa para quem acha que já conhece aquela história. A forma de contá-la faz toda a diferença. Ganhando ou não o Oscar, o filme é indispensável.

Foto tirada pelos verdadeiros sobreviventes

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