Todos os preparativos, naquele sábado, pareciam exigir mais concentração de esforço. Afinal, havia muito o que preparar para a comemoração e esperávamos a chegada dos irmãos para o reencontro que se tornara evento padrão em todos os natais. Ademais, meu filho já contava dois aninhos e os cortes cirúrgicos gerados pelo reimplante da minha mão já estavam cicatrizados.
Havia para mim, claro, alguma dificuldade com brincadeiras infantis que esperava compartilhar com aquele bebê. Eu me esforçava. Para poder carregá-lo comigo, dependente que sou dos braços para equilíbrio ao caminhar, comprei uma “bolsa canguru”. Esperava, com isso, dar a ele segurança e a mim alguma desenvoltura. Ora, pelo fato de ter as pernas atrofiadas pela pólio, mais leves que o normal; o tronco hipertrofiado, o meu baricentro é bem mais alto do que o comum nas pessoas. Dessa forma, o caminhar com meu filhinho preso ao corpo criava uma instabilidade ainda maior. E cada passo ampliava o movimento pendular nos meus deslocamentos. Para o Matheus, provavelmente, a sensação deveria ser de um balanço intencional e ele se ria, com aquele riso espontâneo e feliz de quem frui o momento com despojada alegria. Acho que tive por isso a sorte de ouvir as suas primeiras gargalhadas. Um prêmio extraordinário para qualquer pai.
Era 1.975 e já se ouvia, aqui e ali, algumas previsões para dali a cinco anos. Com o tal “a mil chegará, de dois mil não passará”; as previsões aterradoras quanto ao “bug do milênio”; as profecias estapafúrdias e enviesadas produzidas pelo medo e pela ignorância; as superstições religiosas. Eu olhava o futuro com outros olhos, procurando oportunidades de sucesso e opções para o desenvolvimento; tentando vislumbrar um mundo em que aquele menino inocente e risonho pudesse se sentir feliz, realizado.
Na segunda-feira seria o Natal. Junto com um cunhado e um dos meus irmãos, tendo o mais belo de todos os presentes numa bolsa canguru colada ao peito, fomos ao Mercado Central para “iniciar os trabalhos”. Se você que nos honra lendo este artigo ainda não conhece o Mercado Central de Belo Horizonte, devo dizer que falta alguma coisa em sua vida. O lugar é mágico e ao mesmo tempo real. Tem uma energia absolutamente salutar, capaz de emprestar felicidade a quem o visita.
Tivemos a grata sorte de conseguir uma mesa no tradicionalíssimo “Bar do Mané Doido”. Aquela esquina interna, na saída da Padre Belchior, entre a Goitacazes e a Curitiba, tem histórias demais. E uma delas, pelo menos para mim, aconteceu naquele dia. Uma alegria incontida e vibrante me dominava. Muitos dos que por ali passavam faziam gracejo para meu filho, ao colo, de sorriso fácil e olhinhos atentos. O burburinho do lugar, tantos rostos felizes, muita gente apressada para os comprar os últimos presentes ou ingredientes da ceia natalina e outros tantos já comemorando, faziam do lugar uma grande festa. De repente, num movimento coordenado, na escada, um grupo de pessoas se aglomerou e cantou lindamente “Jesus Alegria dos Homens”, do alemão Johann Schop.
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Tadeu Duarte tadeu.ufmg@gmail.com Com a proximidade do Natal e festas de fim de ano, já…
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