Como é bom ir se transformando na gente. Assumir a própria esquisitice. Sair do armário social calçando meias e vestindo um cardigã quentinho.
Como é bom aceitar os silêncios, o gosto por estar sozinha, o apego ao lar, a aversão que tenho a festas.
Cancelar assinaturas, assumir que não ligo para muita coisa, sobrar energia para dar atenção para as pessoas que gosto ou simplesmente para ficar parada e contemplar as cenouras crescendo.
Ter coragem de escrever uma avaliação negativa de um livro famoso que achei terrível e gostar de assistir a alguns filmes burros apenas porque o ator principal é bonito.
Como é bom admitir pequenezas como o fato de que odeio calçar sandálias e que considero fazer as unhas no salão algo de insuportável. Que tenho preguiça de falar durante a maior parte do tempo. Que adoraria que existisse a profissão “ter pensamentos”. Que minhas maiores alegrias são comer, filosofar e ajudar os outros.
Como é bom conservar amigas antigas e gostar muito delas mesmo que não sejamos mais quem éramos quando nos conhecemos. Todos nós seres humanos somos parecidos e capazes de nos tornarmos amigos. Meu critério para gostar de alguém, hoje concluo, é a mão estendida e o afeto oferecido a mim em momentos de medo. Tenho amigos imaginários e até antepassados por esse motivo.
Minhas maiores dificuldades sempre foram assumir as emoções negativas, as raivas, os desgostos, as implicâncias que sinto e as sombras. Sigo na direção de buscar os meus nãos com maior veemência e de fazer mais vezes o que tenho vontade em detrimento do que supostamente devo. Priorizar o que verdadeiramente sinto dado que fiz o contrário disso durante muito, muito tempo.
Como é bom enaltecer a companhia dos meus filhos que prefiro à dos reis, rainhas e autoridades mundiais.
E é bom, principalmente, sentir-se amado sendo estranho e ter um amigo/amor até mais estranho para dividir o tempo, conversas, momentos, baguetes e refrigerantes.