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Independência

Mário Sérgio

Há alguns anos, uma querida amiga se viu na iminência de utilizar cadeira de rodas por um longo período. A cirurgia no fêmur criaria limitações para que ela ficasse de pé. E a notícia foi recebida com grande pesar e também alguma resistência. Muito ativa e atuante nas ações em prol da inserção social de PcD, ela sabia dos problemas que envolvem a vida de pessoas tidas como “diferentes”, especialmente quando sujeitas ao uso de próteses ou órteses. Preconceitos, impaciência, capacitismo, entre outros impactos, infelizmente, comuns na vida de pessoas com deficiência.

Num tom brincalhão, apesar de notável alguma apreensão (o corpo às vezes contradiz o que a boca expressa.), ela se valia da célebre frase do Imperador Dom Pedro I, às margens do Ipiranga: “- Independência ou morte!”

Todo esse conjunto de circunstâncias leva a pensar sobre o tema. A história das PcD tem páginas carregadas de sofrimentos, assassinatos, rejeição, humilhação, desamor e, em casos raros, até heroísmo. Superação, todavia, deve ser entendida em relação às barreiras e adversidades, não da própria deficiência, pois quando é perene, como são, por exemplo, as sequelas de poliomielite (paralisia infantil), nunca são suplantáveis.

O que seria, para minha amiga, a tal independência? A não utilização de uma cadeira de rodas? Bengalas? Muletas? Óculos? São todos órteses. Ou se livrar de alguma prótese, como um implante dentário; um stent cardíaco; ou um marca-passo? Muitas pessoas avaliam que algum infortúnio pode leva-las a ficarem presas numa cadeira de rodas. E aqui é importante observar que se trata exatamente do contrário: órteses e próteses são libertadoras. Isso mesmo! São esses equipamentos que nos permitem o deslocamento, apesar da perna fraturada, de uma lesão medular, de baixa visão, enfim, são nossos salvadores, nossos libertadores para que, ainda que parcialmente, estejamos mais próximos de uma vida independente. E liberdade pressupõe optar por coisas ou situações que nos pareçam mais aprazíveis, ou talvez menos adversas. As tecnologias na área de saúde se prestam a ser o ombro amigo quando o amigo não pode estar perto. São os apoios que nos eximem de ser cargas para quem nos quer bem.

As deficiências, frequentemente, têm o condão de restringir significativamente a autonomia das PcD, as órteses e próteses fazem o trabalho dos anjos, dando apoio e devolvendo a liberdade de que se estaria afastado sem tais aparelhos.

O filme Avatar (EUA/2009) nos apresenta uma premissa interessante, que em corpos biológicos controlados pela mente humana, inclusive daqueles que têm seus corpos reais, humanos, dilacerados.

Como a extensão da mente controlando um corpo distinto do original. E mais uma vez o cinema nos premia com um mundo imaginário em que as deficiências podem ser esquecidas. Isso remete à memória recente de que as PcD eram chamadas de Inválidas; Portadoras de Deficiência; Portadora de Necessidades Especiais (PNE). A partir da década de 1970, iniciando na Europa e nos EUA, ouviu-se um grito pela liberdade, pela autonomia, pelo respeito. E começou a se formar uma nova geração depois daquele primeiro grito de Independência.

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