No livro “A República”, de Platão, há um interessante debate entre Adimanto e Sócrates quanto à natureza dos deuses gregos e quanto à forma como poetas e escritores os apresentam. Em princípio, por exemplo, considerando que não estariam de forma alguma sujeitos a cometer iniquidades, nem seriam capazes de externar quaisquer sentimentos que não fossem eminentemente bons.
Ou seja, nem Pirito, filho de Zeus, nem Teseu, filho de Poseidon, poderiam cometer os delitos que lhes são atribuídos nos textos poéticos e, consequentemente, não poderiam ser condenados, por toda a eternidade, ao inferno de Hades. Sócrates defende com desenvoltura que tais deuses estão acima das vicissitudes humanas, dos sentimentos menores, como ciúmes, raiva, inveja, entre outros.
Também, considerando as divindades, elas podem ser apresentadas sob formas e características distintas, dependendo de qual religião ou seita os descreva. Observa-se, quase sempre, todavia, o reconhecimento de que são entidades ilibadas, superiores em todos os aspectos mensuráveis, conhecidos pela humanidade como bondade, atemporalidade, disposição, poder, graça e beleza, entre outros. A despeito disso, no entanto, muitos súditos fiéis, levados a condições extremas, podem se indispor contra seu criador que, a julgar por sua onipotência, se revestiria, sempre, da disposição de perdoar e acolher.
Na parede da cela de um dos inomináveis desumanos campos de concentração nazistas, estava escrito, em tradução livre: “Se existe um Deus, ele terá que implorar pelo meu perdão”. Essa frase nos mostra um nível de dor e sofrimento extremos, a que pessoas foram submetidas apenas por serem distintos da classe então dominante.
Quando os ótimos Ivan Lins e Victor Martins, em 1979, lançaram o belo samba “Desesperar Jamais”, intuindo que “…afinal de contas, não tem cabimento entregar o jogo no primeiro tempo.”; avaliaram situações com previsibilidade de um fim. Como um jogo de futebol, por exemplo. Não é, no entanto, possível prever a duração de certas circunstâncias na vida das pessoas. Quem poderia imaginar o tempo de sobrevida naqueles infernos doentios de “Auschwitz-Birkenau”, na Polônia; ou Treblinka, ou Sobibór?
Muitas PcD, e as pessoas próximas que as querem bem, às vezes questionam o porquê de aquela pessoa em especial experimentar viver o drama de uma deficiência. Não tenho, naturalmente qualquer resposta e este questionamento, porém sou bastante adepto da fala de uma PcD austro-americano, Nick Vujicic, que nasceu sem pernas nem braços. Ele nos mostra uma força de vontade muito acima da média. Desafia a própria deficiência e com sua empatia e fé serve de modelo a milhares de pessoas. Suas palavras são poderoso estímulo à resiliência e certeza de tempos amenos: “Acredito que Deus poderia, se quisesse, fazer o milagre de me dar pernas e braços; mas também creio que, talvez, eu seja o milagre que ele queira apresentar ao mundo”.
Sinto que essas palavras são muito consistentes e nos fazem pensar e, talvez, nos ofereçam o estímulo para continuar na luta; para enfrentarmos nossos obstáculos e desafios.
A inabalável crença em que sempre haverá uma razão para sorrir, de certa forma, respondem à questão: “Porque eu?”.
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texto profundo.. realmente nos faz refletir sobre a complexidade de nossa existência.