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O Feio não Assumido

Tadeu Duarte
tadeu.ufmg@gmail.com

Andando pelos lugares alternativos de Belo Horizonte, fiquei encasquetado quando vi a proliferação de um personagem demasiadamente coisado, que, embora force a barra pra chamar a atenção, acaba passando despercebido.

Me arrisco a dizer que tal personagem, de tão comum, é quase uma franquia. Basta passar no Mercado Novo, na rua Sapucaí ou no edifício Malleta para observar que a cidade está lotada de Feio Não Assumido.

Dizem que a beleza é relativa e está nos olhos de quem vê. Já a feiúra, não. A feiúra é concreta, não importando o desviar dos olhos de quem finge não querer ver.

Para um sujeito realmente feio, não há relativização possível. O indivíduo pode ser feio-charmoso, feio-legal, feio-simpático, feio-transão, feio-maromba, feio-mas-bom-partido, que, ainda assim, a feiúra será sempre seu pronome.

O Feio Não Assumido é, antes de tudo, um feio. E ele sabe disso. Tem tanta consciência de que é um inimigo dos Power Ranger’s que desesperadamente tenta disfarçar sua resolução de Playstation 1 e a skin de remanescente do CAPS com um visual e atitudes extravagantes.

A excentricidade é o disfarce dos feios.

O convívio social tem suas nuances já mapeadas. O careca se disfarça com barba, peruca ou chapéu. O gordinho se esconde nas roupas pretas. O pobre aposta em grifes da Shopee. Mas o Feio Não Assumido, que disfarça sua genética empenada se vestindo como Sambarilove and Liminha do SBT, acaba passando despercebido.

É difícil definir o visual do Feio Não Assumido porque, aparentemente, é um tipo diverso. Mas, já que estou aqui para falar de temas inconvenientes, vou ajudar.

Primeiramente, é preciso ter em mente um princípio básico: os diferentes são todos iguais, pois, se igualam na sua diferença.

Pense nas pessoas-personagens, como um metaleiro de Sabará ou Londres. Em um hippie da Califórnia ou hippie capitalista que vive na porta do Shopping Cidade. Imagine um sapatênis humano da Faria Lima ou Vila da Serra.

Os diferentes estão mais próximos que gêmeos xipófagos. Só mudam de água para water, de acordo com a localização.

O Feio Não Assumido exagera na gambiarra estética ao se vestir retrô, analógico, antiquado, modernoso, circense e brechozado, preferindo ser visto como doido a ser visto como feio.

Enquanto o virem como diferente e inusitado, esquecem-se de que o Pókemon raro em questão é mais feio que panelinha de fritura.

Na real, é indiferente a roupa que usa, desde que seja excêntrica. Sua aposta é sempre a mesma: ser o amostradinho do rolê. Evidenciar a sua suposta originalidade e personalidade berrando um estilo mais misturado que o mexidão do La Greppia.

Daí o mullet com franjinha feminista e risquinho na lateral, de dar vergonha até no Renato Gaúcho, o último dos mulleteiros. A blusa antiquada do vovô, seu All Star verde cano alto e sua a calça jeans cintura alta com boca de jaqueta, ao estilo atendente do Mcdonald’s

Se fizer frio, ele tem uma jaqueta com estampa parapente e um bonezinho do MST. Com seu bigode grosso, também conhecido como cachecol de rola, é sempre solidário. Afinal de contas, um boquete e um copo d’água não se nega a ninguém.

Traz consigo sempre um latão de cerveja barata, a conversinha vegana & desconstruída de descolonização dos corpos e suas tatuagens de pandeiro da Rotam. É pura simpatia com seu sorriso de dente amarelado e bafo de hambúrguer de soja. Seu cigarrinho mentolado, canelado, empalhado ou Bob Marleyzado é imprescindível pra compor o personagem de esquerdomacho.

E tudo bem ser feio. E, se for só feio, tá valendo. É da vida, faz parte.

O azar é de quem se relaciona com o diferentão de imenso ego postiço.

Cuidado, o feio Não Assumido é aparentemente inofensivo mas é uma bomba tóxica e radioativa. Como não se aceita, mais adiante ele fará de tudo pra que você se sinta a pessoa feia da relação.

Daniela Piroli Cabral

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