Capítulo 3
Ninguém sabe quem fez a promessa; quem disse que um dia poderia acontecer ou quem tinha certeza de que aconteceria. Tudo o que se sabe é que de geração em geração, um mantra era passado de estudioso a estudioso, de sonhador a sonhador: não estamos sozinhos no universo. Para provar isso, sensores foram instalados em pontos específicos da Terra. Estudiosos sentavam dias a fio em frente a monitores tentando captar o menor sinal de contato. Não existia nenhum. Nunca existiu nenhum. Mas, ainda assim, todos os dias, eles voltavam para os seus postos de trabalho com a esperança renovada. O pensamento, nunca dito em voz alta e opressivo como qualquer outro pensamento de solidão, era: não podemos ser os únicos. “Quem, por mais excêntrico que fosse, construiria um universo inteiro, ainda em expansão, apenas para seres primitivos como nós?”.
João estava no segundo ano da faculdade quando ouviu isso de um aluno de astronomia que tinha se demorado tempo demais em um bar na noite anterior. João não queria estar ali, mas a graduação era obrigatória para todos os jovens da Terra, era isso ou o trabalho braçal, para o qual não era nada apto. O lema, uma piada ao coro original, era: “sozinhos sim, ignorantes nunca”. João nunca conseguiu entender por quê. O conhecimento só é válido quando comparado, e os conhecimentos da Terra não podiam ser comparados com os de ninguém mais, ao não ser deles mesmos.
Acontece que, certo dia, sem aviso, os estudiosos, agora senis e sem fazerem nenhum avanço real, começaram a perder as esperanças. Não aconteceu tudo de uma vez, mas lentamente. Primeiro os centros de medição de contato do norte foram desativados. Eles tinham os próprios problemas com o desabastecimento de água e a falta de energia para se preocuparem. Sem o norte, o sul não tinha escolha senão largar a empreitada do descobrimento. Assim, um a um, todos os centros foram desativados. A esperança não estava mais no céu, e hoje em dia há quem diga que nunca esteve. Os grandes telescópios, que deviam ter impressionado as crianças da época, não passavam mais de olhos encarando o escuro, sem nada ver e nem piscar. As universidades ainda davam cursos de astronomia pelo saudosismo, e não por que alguém achava que alguma coisa a mais podia ser feita. Já se tinha tentado tudo. Se tinha clamado em todas as línguas e ninguém nunca clamou de volta. Ao final, perceberam que suas vozes seguiriam eternamente fazendo eco no infinito, sem ninguém para ouvir, especialmente quando eles próprios não ouviam os clamores entre si.
Um fiapo de sangue escorria da testa de João. Sem jeito, ele havia caído em uma pilha de pendrives deixados ao acaso. Ninguém se importava se carregavam dados importantes ou não. Nada era mais importante, e todas as coisas que existiam agora só eram coisas que nunca iam embora, mesmo que todo mundo fosse.
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“Só” é um conto de 10 capítulos, que serão publicados individualmente semanalmente.
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