Antigamente eu achava que ser mulher era fácil. Era praticamente igual a ser homem. Mudavam os interesses, mas o objetivo era o mesmo. A missão era estudar, assim como a de meus colegas meninos.

Na adolescência, minha mãe me mandava pentear os cabelos e não usar calças de moletom com camiseta larga. Dizia que eu era mocinha e deveria andar arrumada. Eu acatava o pedido para agradá-la, sem entender o por quê de ter que vestir um macaquinho de sarja ao invés do camisão de malha de que eu tanto gostava.

Com o tempo, fui compreendendo. A mulher precisava ser bonita. Precisava ser servil. Precisava ser elegante e bem comportada. Eram as regras. O motivo? Não importava.

No Natal, eram sempre as mulheres que arrumavam a cozinha, mesmo que, assim como meu pai, minha mãe trabalhasse fora o dia todo. Nos encontros de família, era sempre minha avó quem cozinhava. Eram sempre minhas tias que cuidavam da família e quem resolviam os problemas. Achava tudo isso muito estranho.

Quando me casei, as diferenças se acirraram e a ficha definitivamente caiu com a maternidade: minha vida virou do avesso e a de meu marido continuou quase a mesma. Tal discrepância não se limitou apenas ao fato de ser eu quem amamentava o bebê. Era também um consenso com o aval de todo o nosso entorno social.

Minha garganta amargou e fui procurar entender. Busquei Bell Hooks, Angela Davis, Simone de Beauvoir, Annie Ernaux. Ouvi centenas de entrevistas com mulheres que admirava. Pensei com carinho sobre aquelas que conhecia. Embarquei na literatura e em suas perspectivas tão reais ainda que fictícias.

E um dia, compreendi de fato o que era ser mulher. O que nos unia à parte das roupas, do leite de peito e da cozinha. À parte a doçura, a suposta elegância ou os atos de cuidado. O traço mais marcante de nossa performance de gênero.

Ser mulher era ser forte. Era suportar injustiças de cabeça erguida. Era não vergar diante das dificuldades e trabalhar com inteligência para mudar o mundo. Era partir de uma posição de desvantagem e lutar por si mesma, pelos seus, pelos próprios direitos e pela igualdade.

Ser mulher é ser forte e, para mim, não há nada que nos defina melhor do que esta palavra. Ainda que tal fato advenha da necessidade. Ainda que isso seja consequência epigenética de nossa existência histórica. Somos fortes e tanto mais o seremos quanto mais for necessário. Nossa resiliência é gigante e nossa força reside na sororidade.

Tais Civitarese

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