Nunca escondi das pessoas com quem convivo minha paixão pelos trens. Não os trens mineiros, que se transformam em milhões de coisas. Falo de trens, daqueles que escorregam pelos trilhos. Falo dos trens barulhentos que apesar de tão grandes e pesados, deslizam sutis sobre o ferro. Falo dos trens que, via de regra, são escuros e metálicos, mas no fundo são tão lindos. Uma simples faixa de cor, de que tamanho for, os veste de gala.
Costumo dizer que trens estão sempre usando gravata borboleta. São imponentes, fortes e determinados. Ao mesmo tempo, presos sempre ao mesmo destino: os trilhos. Qualquer fotografia de trilho de trem termina em perspectiva, já reparei. Eles sempre nos levam a viajar em suas imagens, que teimam em nunca acabar.
Mas acabam sim, depois de cada curva, abraça uma montanha, deita sobre uma ponte, segue uma reta, mergulha num túnel e, de repente surge aos gritos na próxima estação.
À noite o trem faz do farol a lua prá quem beira os trilhos e mesmo prá quem está de longe. É uma lua em disparada, querendo chegar a algum lugar. Que a sigam os namorados … e corram! Essa é uma lua que não espera, tampouco despenca do céu a cada manhã.
E o trem sempre continua. Mesmo em dias de chuva ele não deixa a paisagem entristecer. Que nada! Dentro dos trens o sol segue firme, ainda que em cartões postais …
Falava da louca disparada do trem. Do seu deslizar sobre a terra e nela desenhadas escadinhas. Sobre as escadinhas uma linha de ferro, bordada sobre os campos, saída de um novelo antigo.
Dentro do trem saudades chegam e outras teimam em ir embora. Lágrimas enxugadas e outras soltas, esparramadas pelos nossos rostos. Mas o trem é tão sábio que já nos dá o antídoto. Basta abrir a janelinha, colocar o rosto para fora que o vento trata de varrer da nossa alma qualquer pensamento de melancolia. Uma rajada de vento na cara é um remédio milagroso. Apesar de nos obrigar a fechar os olhos, nos permite ver tanta coisa …
O trem é taciturno, porém feliz. Se observarmos de frente, lá está um sorriso escancarado a lamber os trilhos, um triângulo pontiagudo, cheio de dentes.
Como é lindo ver o trem chegar à estação. Vai diminuindo a velocidade, mantendo, contudo, o rosto ereto, e para sempre com fidalguia. As pessoas acorrem, se amontoam nas suas portas e janelas, como a querer tirar de dentro dele toda a saudade de que mora em seus peitos. Querem arrancar a saudade a qualquer custo.
E falemos a verdade, tem coisa mais linda que uma estação de trem? Invariavelmente brancas, com bancos de madeira que merecem mais o olhar que as nossas costas, e que não nos cansamos de admirar.
Estação de trem, via de regra, tem o nome da cidade em alto relevo, em letras comuns de cimento, pintadas em cor escura. São simples nomes, e abaixo deles ficamos nós, a esperar…
O trem chega e parte, parte e chega, num movimento monótono, mas certeiro. Ele vai de nome em nome, de estação em estação. Leva beijos, presentes, cartas de amor, saudades, leva até gente que em nada está pensando. Simplesmente sentadas, lendo o jornal, com letras pregadas no papel. Esperdiçam o olhar da paisagem, como que a evitar o sofrimento, saindo de lado de seus problemas. É o trem carrega nossos problemas também e às vezes não os consegue resolver.
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Belíssimo texto do meu amigo Peter. Viajei com ele, parando nas estações da saudade, dos encontros, das despedidas, das lágrimas e dos agradecimentos de quem chegou, de quem partiu....
Peter vc sempre nos traz memórias inesquecíveis!! Que saudade do trem de ferro.
Nas intermináveis viagens, deslubravamos com lindas paisagens, uma boa conversa com amigos , e também flerts de um amor platônico.
Quantas lembranças maravilhosas!!
Volta trem.....só quem vivenciou sabe o quanto era gratificante esperar as chegadas das visitas e a partida de um amor.
Saudades.