Minha filha acabou de completar 12 anos e está aprendendo as conjugações verbais. Ela chega da escola frustrada, sem entender para que existem tantos tempos. Diz que nunca vai usar aquele conteúdo na vida, já que o único momento que existe é o agora.
Concordo, balançando afirmativamente a cabeça, uma sabedoria que demorei muito mais tempo para ter. Mas pondero: o tempo é uma abstração, aquelas conjugações permitem preservar a história do que foi vivido e se projetar no futuro, fazendo previsões certeiras (ou nem tanto assim).
Ela fica cismada com o futuro do pretérito.
– Para que isso, mãe?
– Uai, para os casos de dúvidas ou incertezas.
Ela resmunga a contragosto, não sei se porque não entendeu ou porque não quer encher sua memória com mais esse conteúdo.
Paralelamente vivo momento de introspecção, tentando entender a temporalidade, segurando com as mãos as ondas do tempo e a rotina enfadonha. Acumulo tarefas e listas, me sentindo um resto, ao mesmo tempo em que tento salvar o mundo. Invento fugas, querendo ser o oráculo de mim mesma. Previsões para 2023? Não há. Tudo conjugado mesmo no futuro do pretérito.
Invento mil teorias, todas contra mim. Mas descubro. O tempo muda, apesar de querermos preservá-lo. Todos estão indo.
Esse foi um ano de muitas perdas: Gal, Jô, Erasmo, Elza, Arnaldo, João e até a imortal rainha Elizabeth. Todos estamos indo. Cada um na sua cadência.
Preciso sustentar a densidade do viver e essa, às vezes, estranha existência. Não é que eu queira morrer, só queria deixar de existir. Quero estrangular o tempo até só restar o instante. Sou finita, não vou durar para sempre. Quero dizer isso a ela, mas posso. Então escrevo o que não é hipótese.
– Eu morrerei, filha. Não morreria.
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