As orquídeas daqui de casa floriram em setembro. Todas elas desenvolveram botões que desabrocharam em flores. Na maior parte do ano, elas são hastes vazias, depenadas. Parecem mortas, hibernantes, não fossem as folhas verdes e largas de sua base.

Um dia, elas formam botões que evoluem para um espetáculo de pétalas. Este dura pouco tempo. Dois meses, algumas semanas. Para depois adormecerem novamente.

Há muitas coisas na vida que se comportam dessa forma. Que passam a maior parte do tempo em vigília. Que mostram exuberância em um único e derradeiro momento. Em todos os outros, exibem-se ordinárias.

Assim também são muitas pessoas. Como o herói que salvou a criança, conforme informava o jornal outro dia. Era um homem comum, passante da avenida. Ao perceber o perigo, pôs-se alerta, correu, agiu e recuperou uma vida. Tudo porque estava ali, naquela hora. Provavelmente, fazendo coisa alguma que importasse. E de repente, muda. Ele salva uma pessoa, restaura uma família. Tornou-se um herói para todo o sempre.

Isso me mostra que aqueles momentos considerados medíocres, talvez insossos e sem brilho ocultam potenciais imensos. Em uma palavra que se diga, em um gesto que se faça. Ou mesmo em algo ruim que se deixe de fazer enquanto isso. E assim, tudo passa a importar, inclusive o que parece chocho e desmaiado.

Talvez por isso, possa-se aprender a se ter paciência. A não querer o foco o tempo todo em si mesmo. A não ansiar diariamente pelo brilho. A acolher a calmaria e o silêncio que precedem qualquer explosão maior de alguma coisa.

Gosto muito dos hiatos porque neles permaneço pela maior parte do tempo. Não são os dias mais vistosos, mas são os que precedem e preparam. 

 

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