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31 de Outubro

Raniere Sabará

“[…] O amor cuida com carinho
Respira o outro, cria o elo
No vinculo de todas as cores
Dizem que o amor é amarelo”

31 de outubro. Era 17:00 e o tempo se fecha. Nuvens cinzentas tomam conta do despejo da cidade. Coração dilata. Palpita. Acelera em disritmia. Pensei que aquele tempo fosse previsão. Era como caminhar na mata escura, percorrendo a caminho da luz, da chegada, do amanhã.

Dona áurea se encontrava nas margens da faixada do armazém do campo. Com seus 72 anos, mesmo sendo facultativa quanto ao voto, fez questão de ir as urnas. Dispôs de uma cadeira na calçada, aguardando desassossegada pela apuração. Havia um medo de sua parte, até mesmo porque, o “outro lado” era sinônimo de caos. Violência. Usurpação.

Roía as unhas, acendia um cigarro. Parecia que o tempo voltava. Corpo cansado, embora, movido de esperança. Não havia outra rota que não fosse a chegada da primavera e, Dona áurea, acreditava firmemente nisso. E havia mesmo de se acreditar. Às 19:50 já não havia mais suor pelo corpo de áurea. E a boca seca. Seca. Nem um cuspi. O que a molhava por fora era a chuva intensa naquela noite de domingo. Por dentro, havia amor guardado no peito, altruísta para se desinibir como carnaval.

20:05. Ocorre a reviravolta, como final de novela. Dona áurea entra em transe, transcende. Em prantos, exala um grito que ecoa nos três cantos da cidade. Era necessário. Vibrava os braços que estremeciam todo seu corpo, sempre nos dizendo: “Acabou! A primavera há de brilhar mais uma vez”.

Ao avistar tal cena, me veio a emoção. Não pude conter também um grito que estava entalado aqui dentro. Fiquei pensando em como o amor transforma as sociedades humanas. O amor é o imperdoável. É a razão do coração que a própria razão desconhece. É nevoeiro. Luta. Conciliação. É beijo molhado em domingo de luta. É se despir do medo e se lambuzar de tesão. É o outro. É a si.

O amor transforma sorrisos. Amor é espiritualidade. Ele nos traz Fé. Às vezes, pode ser até subentendido, mas, o amor nos uni. O amor não tá preso em uma religião. Na incerteza. Ele é concreto, não se abstrai. O amor também é político. É politico porque ser politico é cuidar do outro.

E se “dizem que o amor é amarelo”, naquele domingo, o amor voltou aos corações da nossa pátria tão distraída.

*
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