Escrever para uma coluna semanal implica em trabalhar as emoções ou apresentar fatos práticos e matemáticos. Quando fui convidada para contribuir com o Blog Mirante do Portal Uai, Estado de Minas, apresentaram-me a proposta de escrever sobre turismo – dicas, destinos, trajetórias – pois ser turismóloga e consultora de viagens é parte da minha profissão primitiva (acho que já é um termo adequado).
Aceitei o desafio na condição de ter liberdade para a escrita, pois além do turismo meus conhecimentos foram ampliados ao longo dos anos e cronologicamente passam pela biodanza, psicologia, meio ambiente e psicanálise. Relato esse mini curriculum porque nestes anos de pandemia, e diante desse papel em branco, a primeira e a última palavra que me vem à mente é: luto. Uma página inteira onde estaria escrito apenas a palavra luto. Contudo, diante desse momento divã, utilizarei o outro significado do termo – o de lutar. Agora… luto para a construção de um texto.
Escrevo na data de 09 de fevereiro, um dia antes da publicação, fato que está se tornando recorrente. Posterior a marca de 1.340 novas mortes pela COVID-19 registradas, totalizando 233.520 brasileiros falecidos. Estarrecida fiquei! O que vivemos não tem precedentes e é para deixar qualquer um mudo e em luto.
Me peguei pensando nas eleições presidenciais, e eu que nunca me identifiquei como política, me vi fazendo campanha contra o abominável homem que ainda hoje é presidente do país e mantém seus fiéis seguidores. Vou repetir para ficar bem claro: fiéis seguidores. Assistimos também a uma alienação política no Brasil sem precedentes.
Perdi amigas de muitos e muitos anos após ponderar que não compartilhávamos das mesmas convicções políticas. Na época, outros brasileiros titularam-me como comunista (o que é hilário e mostra a falta de conhecimento de tais pessoas), mandaram-me para o nordeste – aceitei o convite de bom grado e já estou organizando minha casinha na Bahia.
Enfim, pensando nisso tudo assisto no final do dia 08 a entrevista do Wood Allen e de imediato penso: estou salva, não preciso expor esse amargor que provavelmente irá para o texto.
“Não gosto de me afogar em lembranças agradáveis” – ele me surpreende com tal afirmação. Considera-se um chato e com seus personagens reais tornou-se um ícone do cinema – um comediante com papéis mais dentro da realidade. Relata que assistia a filmes compulsivamente. Continua sendo comediante quando Bial – entrevistador – pergunta sobre o que Freud e Lacan diriam se lessem sua autobiografia.
Desisti de falar somente de Woody na crônica, mesmo ele e sua arte estando sob suspeita de outro mal-estar no mundo real. Além das questões existenciais traduzidas em seus filmes, ele carrega acusações de abuso sexual familiar. Diante dessa ambiguidade: verdade/mentira do fato, recuei. Estou sendo injusta com o cineasta? Não sei, mas serei covarde como ele e diante de incertezas ficamos quietos. Mas achei genial o título da autobiografia.
A Propósito de Nada é um texto que traz somente o vazio da luta e do luto. Boas escolhas podem ser feitas, e, com certeza, bons planejamentos para uma nação e os enfrentamentos das catástrofes. É nesse buraco que podemos construir algo. Assim desejo!
A propósito, a foto é da escultura “Melancholy” do artista Albert György, que fica às margens do Lago de Genebra, na Suíça. Considero outro nome para ela e já vi a de um Buda na mesma posição. A primeira palavra que me veio no momento foi: reflexão.
Foto: “Melancholy” – Albert György
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Sandra... não concordo com o adjetivo ao presidente..... abominável foi feito com as verbas para a saúde no rio de janeiro