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Carta que não recebemos mais

Tenho uma caixa de arquivo, onde escrevi em letras vermelhas: AFETIVOS. É o lugarzinho de muitas cartas, cartões, bilhetinhos e poesias que recebi ao longo de minha vida.

Não guardo receitas médicas, nem contas de anos passados, nem prestações de dívidas que já passaram. Essas não me interessam.

Mas a caixinha, que não é tão pequena, foi engordando ao longo dos anos. 

Hoje, deparei-me com uma carta do final dos anos 70, de uma amiga. Não quis lê-la toda. Os sentimentos diante de tantas lembranças costumam ser ambíguos. Algumas pessoas que deixaram cartas e bilhetes escritos à mão, já passaram para o outro plano. Tenho amigas que relatam seus momentos na hora da escrita de forma preciosa e que me transportam para escuta de suas vozes com a riqueza de suas descrições. Cartas e bilhetes preciosos de minha filha e filho, irmãos e minha mãe marcam presença constante e compõem deliciosas lembranças.

Não é hábito abrir o “Afetivos”, e, quando isso ocorre, a memória de momentos surgem como uma fotografia. É a fotografia da escrita ou será a escrita da memória? Enfim, é bom e ruim. Um aperto no coração surge e aquilo que se foi, foi, mas se faz presente também.

Com o passar dos anos a caixinha deixou de engordar. As cartas pelo correio não chegam mais. Hoje me dei conta dessa experiência maravilhosa. Era uma boa surpresinha quando uma chegava. Pensei então sobre esse empobrecimento das comunicações humanas. Como era bom pegar um papel, uma caneta e letrinhas e emoções surgirem como num passe de mágica. Imagine quem não passou por essa experiência? Como era esperado o carteiro!

Deslocamos para os e-mails, em seguida para Whatsapps e tudo ficou muito imediato, sem o tempo do fazer em letras bordadas, passar a limpo, ir ao correio, selar, enviar… o tempo da escrita e o tempo da espera.

E a resposta? Poderia demorar!

Havia tempo,

Havia espera.

*
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Sandra Belchiolina

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