Victória Farias

A esperança está na memória.

Nessa história nossa personagem foi, repentinamente, preenchida por uma sensação de vazio. Pensou ser incrível como o vácuo pode ocupar tanto espaço. Assim como ocupa todos os cantos do universo. Acaricia todas as estrelas e planetas, mas abre espaço para os asteroides. Dança no vórtex das supernovas. 

Ainda assim, sentiu o vazio total, a absência real. A falta de tudo. Esse é o vazio que ocupa espaço. Que caminha entre o fígado e o baço, que se aperta entre os pulmões. Não é a ausência, mas a falta de presença. Foi esse vazio que ela sentiu. Indistinto de qualquer outro, mas nem por isso novo. É o tipo do vazio que não pede licença. Que por alcançar os cometas, acha que pode ter tudo. Não era um vazio de fim de tarde, mas um vazio de fim de vida. E saber disso enchia esse vazio com outras faltas e todas elas se perdiam na imensidão de todo resto. 

Mas ela não sabia disso nessa altura. Na verdade, agora, neste exato momento, nossa personagem não sabia de nada. Não sabia não como alguém que é desinformado, mas como alguém que não se importa. Que não liga de ir a um enterro de branco ou preto, contando que possa ir embora o mais rápido possível. Ela não estava preocupada com supernovas nem com cometas, muito menos com descobertas que poderiam mudar o mundo. E também não se interessava por tal mudança.

Hoje, nossa personagem entende que todos os caminhos por onde passou e todas as vielas pelas quais entrou a levaram exatamente para o lugar que está. Mas, assim como antes, não sabia o que fazer com essa informação, e, por isso, decidiu continuar sem fazer nada. O que a nossa personagem também não sabia, era que todo mundo não sabia de nada. Compartilhava do conhecimento geral e o conhecimento geral parecia ter empobrecido nos últimos anos. Mas ela não queria fazer nada sobre. Não queria ter que carregar o peso do conhecimento sozinha, preferia, por pior que fosse, nesse momento, caminhar, junto com todo resto, pela estrada da ignorância.

Por isso, nossa personagem foi, repentinamente, preenchida por uma sensação de vazio. Porque nada ocupa tanto espaço quanto a falta de tudo. 

*

Pintura: Anne Magill, To You, 2019

*
Curta: Facebook / Instagram
Victória Farias

Share
Published by
Victória Farias

Recent Posts

Pra onde tenha Sol É pra lá que eu vou

Sandra Belchiolina Essa é a introdução da música “O Sol”, da banda Jota Quest. A…

10 horas ago

Cafarnaum

Daniela Piroli Cabral danielapirolicabral@gmail.com Ultimamente, tenho me interessado muito pelo campo das palavras e sobre…

1 dia ago

Reencontro de milhões

Luciana Sampaio Moreira Espero com uma ponta de ansiedade e alegria, a chegada do cartão…

2 dias ago

Transparência nossa de cada dia

Eduardo de Ávila Se tem algo que não aprendi, embora estímulos não me tenham faltado,…

2 dias ago

Só — Capítulo 5

Victória Farias Capítulo 5 Era três e vinte da manhã quando o celular tocou, despertando…

3 dias ago

Amor à primeira vista

Silvia Ribeiro Quando ouvimos alguém dizer que apaixonou-se à primeira vista, parece meio piegas, e…

3 dias ago