Detesto experimentar roupas, calçados e periféricos. Com os 70 anos de idade batendo na porta, Eloíza avisou que as filhas queriam saber o que eu precisava como presente de aniversário.
– Pode ser um chinelo porque os meus estão pela hora da morte.
Entro na casa das filhas no dia D e, entre camisas e outras coisitas mais, apareceram os chinelos.
– Tem que experimentar para saber se precisa trocar, – já foi dando ordens a patroa.
– Qual o número? – insistiu ela.
– Meu número é 39 e estou conferindo aqui. Bateu! Não precisa experimentar.
– Precisa sim. Chinelo tem que ser número maior senão incomoda. E o prazo para trocar é só uma semana…
Para encurtar a conversa e mostrar que eu estava certo, enfiei os pés nos chinelos e subi o tom da voz:
– Serviu! Está vendo como tenho razão?
– Mas é melhor com um pouco de folga, – insistiu Eloíza.
Para encerrar o assunto eu disse:
– Está muito confortável. Podemos mudar de assunto?
Eloíza concordou e seis meses se passaram. Os chinelos apertam muito, não são confortáveis e estou morrendo de saudade dos velhos. No entanto, me falta coragem para reconhecer o desconforto e dar o braço a torcer.
Ontem cheguei em casa e Eloíza estava usando meus novos chinelos apertados.
– Uai, Coração, usando meus chinelos?
– Sim. São muito confortáveis.
Aproveitei a deixa e não perdi tempo:
– Pode ficar com eles pra você.
E ela respondeu sem deixar espaço para negociação:
– Nem pensar. Sua filha quem lhe deu e é seu.
Cá estou eu vendo TV com os pés descansando sobre os chinelos apertados e convencido que experimentar é muito melhor que usar.
A vida é assim mesmo. O preço da teimosia aperta até os pés.
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