Olhei bem dentro dos olhos do monstro. Suava a pálpebra, logo abaixo das sobrancelhas. Senti a lenta a dilatação das minhas pupilas. E uma contração estranha no músculo ao lado do nariz que afunda quando sinto medo. O ar entrava nas narinas em lufadas curtas e rápidas. Do resto do corpo, não dou notícia…
Quando mirei sua face, ele não me pareceu tão terrível quanto em meu imaginário. Ele me pareceu feio. Mais feio do que a feiúra imperiosa que assusta. Era uma feiura feia, fraca. Não era tão brutal quanto eu pensava. Ele ainda rescendia a enxofre e alho. Porém, não tanto. E só pude perceber isso estando ali bem perto. Achei que suas emanações seriam suficientes para provocar um desmaio há muitos metros. No entanto, eu estava face a face com ele e ainda estava de pé, ainda viva.
Ouvi a voz do monstro. Ruidosa, áspera, assustadora. Ela entrou em meus ouvidos e não causou nenhum dano. Vibrou a cóclea e logo silenciou tal como uma cantiga ouvida ao longe. Não provocou nenhum terremoto. Tampouco foi trovão seguido de relâmpago.
Olhei o horizonte ao redor do monstro e ali havia outras coisas a se enxergar. Havia objetos para se mirar. Havia com o que se distrair. Não era só o monstro e suas monstruosidades. Havia também flores, havia outras pessoas. Ele não contaminou tudo. Ele não era, por mais que tentasse, nenhum buraco negro.
O monstro não bloqueou minha saída. Fui e vim em liberdade. O monstro não bloqueou meus pensamentos. Consegui desprender-me. O monstro, embora feio, era pequeno e foi se apequenando até tornar-se quase insignificante. Quase invisível. E tudo isso, esse estar invisível, foi porque mirei bem nos olhos dele. Foi porque encerrei a projeção e parti para o palco, para o ato e performance, logo após gritar “merda” e rezar de mãos dadas comigo mesma…
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