Andar no calçadão de Copacabana no Rio de Janeiro é sempre um privilégio, pela beleza cênica, pela multiplicidade de tipos de pessoas, pela brisa, pela sensação de liberdade vinda do mar e também pelo aglomerado de sotaques que tornam o ambiente receptivo e caloroso – é um compartilhamento de experiências culturais com tribos tão diversas.
Opa! É Drummond! Não deu outra, dou meia volta e volto para Drummond. Sempre digo que por duas pessoas eu correria atrás para pedir autógrafos, tirar fotos, tentar segredar algo de bobo com o ídolo, uma delas é Drummond. Então, dá para sentir a emoção, mesmo sendo uma representação de sua memória, é o mito Drummond revivido ali e este momento captado por sua legítima fã – eu. Mas, espere aí! O que é isto? Uma senhora fazendo o nome do pai enfrente a Drummond? Oba! É das minhas!
Imagine o que aconteceu? Puxei o maior “papo” com a senhora, queria saber sobre a sua crença. A senhora Heloísa era simpática, aparentava ter uns 70 anos e introduzi-me perguntando se ela conheceu Drumond (parecia não ser turista por estar muito familiarizada com o ambiente, ela e seu cãozinho). Pois bem, para meu delírio a Sra. Heloísa começou a falar que o conheceu e que teria sido aluna dele. Diz que ele era um bom professor de português e de francês.
Aponta para um prédio a uns 40 metros do outro lado da calçada dizendo que era ali que ele morava. Continuou seu depoimento, de fã para fã: “É aquele edifício pintado de amarelo, foi pintado há pouco tempo. Tá vendo? O penúltimo andar. A estatueta está aqui em homenagem a suas vindas para este banco. Ele sentava muito aqui!”. Penso: “Além de gênio com as palavras não era nada bobo”.
A sra. Heloísa contou-me que gostaria de ter sido jornalista e por isto procurou Drummond como professor. Lamenta que tenha se casado com um militar e por isto foi obrigada a percorrer o Brasil todo, o que atrapalhou sua aspiração. No momento somente pude imaginar sua frustração, pois nunca se fixava em algum lugar para desenvolver seus estudos. Mas lembrei-lhe de Cora Coralina que começou a escrever, ou melhor, que publicou seu primeiro livro aos 76 anos. Lembro-me dela ainda repetindo: “Cora Coralina”. Pois é Dona Heloísa! Cora Coralina! Esta senhora que também teve de esconder sua escrita e que apareceu com este codinome maravilhoso (Cora – coração, coralina – que advém do vermelho, cor vermelha; rio da vida de Cora Coralina, que corre às margens e desafia sua casa até hoje em Goiás Velho, sua cidade – que por sinal é imperdível).
Pois bem, voltemos a Drummond. “Sabe Dona Heloísa que foi Drummond um dos impulsionadores da carreira de Cora”? Ela escrevia com este codinome para o jornal de São Paulo (Acho que chamava “Cor de Rosa”), Drummond descobriu os textos de Cora e mandou para redação do jornal a seguinte carta:
“Rio de Janeiro, 14 de julho, 1979
Cora Coralina,
Não tendo o seu endereço, lanço estas palavras ao vento na esperança de que ele as deposite em suas mãos. Admiro e amo você como a alguém que vive em estado de graça com a poesia. Seu livro é um encanto, seu lirismo tem a força e a delicadeza das coisas naturais. Ah, você me dá saudades de Minas, tão irmã do teu Goiás! Dá alegria na gente saber que existe bem no coração do Brasil um ser Chamado Cora Coralina.
Todo o carinho, toda a admiração do seu Carlos Drummond de Andrade.”
Tudo isto é o Calçadão de Copacabana, que me deixa fluir entre Drummond, Cora Coralina, Sra. Heloísa, lembranças de Goiás, e oportunidade de falar de Minas (pois não sou mineira?) e Dona Heloísa quis saber e falar sobre meu estado.
Hora importante para uma fã – tirar a foto junto ao seu ídolo! “Dona Heloísa tira uma foto minha com Drummond?” E ela dá seu reconhecimento de fã – “claro!” Sra. Heloísa e meu celular com uma minúscula câmara (que não era digna da ocasião, mas era o único recurso que possuía), bem, depois de ajeita aqui o aparelhinho e o cachorrinho, pose aqui, pose ali, tiramos minha preciosa foto. Corro para ver, mas que pena! Sombras em mim e Drummond, pois estávamos em oposição à luz, era manhã em Copacabana. Diante desta movimentação um casal se aproxima e a mulher quer também tirar uma foto. Espero! Quero saber se é problema da minha poderosa câmera. Era a luz mesmo! Fico com as sombras em mim e Drummond. Despeço da Sra. Heloísa – com endereço dela na cabeça, pois não é que ela me deu seu endereço! Somente identificações de fãs para justificar a uma senhora carioca de 70 anos a confiança em uma estranha –, vou-me rumo ao Posto 12, grata com tanta generosidade.
À noite, conversando com uma amiga e querendo mostrar o registro e contar sobre o inário acontecimento. “Onde está?” Não foi salva?
Seis anos após…
Voltei ao Rio, mas não pude ir tirar a desejada foto. Então… eis-me na cidade natal de Drummond, Itabira – aquela que entrou num de seus poemas como uma paisagem na parede.
Percorrer os Caminhos Drummondianos na cidade é um deleite para os fãs de nosso poeta mor. Depois da visita na sua terrinha, voltei ao Rio e consegui outra foto com meu “gauche” favorito.
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