– É a maior liderança do mundo!
A frase era repetida a cada cinco minutos do tempo que o jovem Abílio da Farmácia ficava acompanhando o noticiário nacional e internacional do rádio no apagar das luzes da década de cinquenta.
Colonizado convicto e juramentado, ele se referia a seu líder maior, o então presidente dos Estados Unidos da América do Norte, o mundialmente popular John Kennedy. De futebol à missa, de polícia à macumba, não havia assunto que tirava da boca de Abílio as suas palavras de admiração pelo presidente americano. A tietagem era tanta, que a cidade inteira sabia de cor e salteado as últimas de Kennedy, sempre contadas e recontadas pelo farmacêutico.
Recém-casado e com a esposa já curtindo o terceiro mês de gravidez, Abílio tomou uma decisão que o transformou, durante semanas, em chacota preferida na pequena cidade do interior de Minas: escreveu uma carta ao presidente americano convidando-o e sua esposa, para serem padrinhos do primogênito. A cidade parou e mudou de opinião quando o carteiro, dias depois, saiu em disparada na direção da farmácia de Abílio com um telegrama na mão: era o presidente americano aceitando e agradecendo o convite.
Um ano depois, dia do batizado, a população da cidade se transformou num mutirão só. As mulheres mais velhas preparavam almoço para mil pessoas, as mais novas decoravam a cidade, as crianças colavam bandeirinhas dos dois países e os homens preparavam o foguetório. Na entrada da cidade, quinhentas pessoas e a banda de música esperavam as autoridades debaixo de um sol de 40 graus. Com duas horas de atraso despontou ao longe, levantando poeira na estrada, um carro grande e danado de bonito com uma bandeira brasileira de um lado e a americana de outro.
Foi uma festa só. Menos para Abílio da Farmácia. O casal presidente não pôde vir e mandou, para representá-lo, o embaixador americano no Brasil e sua esposa. Abílio ameaçou adiar o batizado, tratou o embaixador com casca e tudo e iniciou uma crise diplomática que só não teve maiores consequências graças à intervenção do prefeito e do padre. Ânimos serenados, o batizado foi realizado com grande festa e a comitiva americana se despediu certa do dever cumprido.
O tempo passou e, num belo domingo à tarde, as emissoras de rádio anunciam o assassinato, em Dallas, do presidente americano John Kennedy. A população inteira correu para a porta da casa do Abílio, mas chegou tarde. Desesperado e chorando muito, ele se trancara no quarto. A esposa pediu ajuda ao prefeito, que chamou o padre, que chamou o delegado, que chamou o juiz. Depois de uma hora e meia de reunião decidiram arrombar a porta e conversar com o Abílio.
– Meu filho, a gente compreende a sua admiração pelo Kennedy, mas você tem esposa, tem filho, tem amigos e a vida precisa continuar assim mesmo, emendou o médico.
– Abílio, você não pode ficar o resto da vida chorando a morte do Kennedy. Pare de chorar e converse com a gente, ordenou o prefeito.
Abílio da Farmácia levantou o rosto, enxugou as lágrimas nas mangas da camisa e falou entre soluços:
– Vocês não têm sensibilidade para entender o sofrimento dos outros. Compadre Kennedy já morreu mesmo e não adianta chorar. Eu estou chorando é de dó da comadre Jackie, coitada. O que vai ser dela sozinha no mundo?
Enquanto Abílio recomeçava o choro em prantos, os membros do conselho comunitário se retiravam para não encherem de palmadas a bunda do farmacêutico, na frente da mulher e do filho.
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