Tais Civitarese
Quando fiz prova de residência para pediatria, fui aprovada em alguns hospitais. A Santa Casa de Misericórdia foi um deles. Nesse serviço, além da prova, era necessária uma entrevista como segunda etapa para avaliação dos candidatos.
Ao enfrentá-la, as perguntas foram simples, a maioria relacionada ao trabalho. No entanto, uma delas me pegou desprevenida: “Cite um defeito seu”. Ao contrário dos clássicos: “sou muito perfeccionista” ou “me cobro muito para fazer sempre o melhor”, soltei a seguinte resposta: “Meu raciocínio é um pouco lento”.
Após chegar em casa, passada a ansiedade gerada por aquela sabatina, adquiri outro tipo de emoção: choque. Fiquei me perguntando que espécie de pessoa daria uma resposta dessas em uma entrevista de emprego. Estaria eu louca? Não que não fosse verdade… Mas revelar um defeito real e provavelmente comprometedor não me parecia uma estratégia muito sábia de sobrevivência.
Por algum motivo – talvez a sinceridade -, me convocaram. A verdade, porém, é que o mundo realmente não foi feito para nós, os lentos. O mundo exige ação, atitude, velocidade. Quer que sejamos ágeis, acelerados, eficientes. Quer respostas rápidas e atitudes assertivas. E exalta quem resolve os problemas a toque de caixa.
A suavidade está em desuso. A timidez é quase uma blasfêmia. O retraimento é frequentemente encaminhado para diagnóstico mental.
No entanto, há quem não padeça do afã pela velocidade. Há quem precise de tempo, que goze da ponderação demorada e que se sinta confortável em um longo silêncio. Há quem não tenha nenhuma pressa.
Desconfio de que o modus operandi vigente em grande parte de nosso ocidente não seja exatamente a melhor escolha… Haja vista o endurecimento social, o adoecimento coletivo em que vivemos. A epidemia de ‘burnout’, o estado de estresse e sofrimento mental que acomete muitos de nós.
Ironicamente, essa semana, bati o carro. Se eu estivesse indo rápido, talvez não estaria aqui para escrever essa crônica. O carro estragou todo, teve que ser rebocado. Foi um susto enorme. Felizmente, ao fim do dia, voltei para casa a pé, devagarinho.