O mito – Foto: Prometeu com o Fogo Divino. Pintura de Heinrich Fueger (1817)
Victória Farias

O mito do herói se constitui àquele personagem principal que, mesmo não tendo a confiança de ninguém, rompe barreiras sobre-humanas para salvar toda a humanidade de um mal – geralmente visível só a ele ou de outro mundo – que ameaça matar ou destruir a todos. 

Como um indivíduo invalidado de suas capacidades mentais, ele acredita possuir uma ligação única com o divino, que sopra em seu ouvido caminhos a seguir e ações que devem ser feitas para que aquele menino franzino e sem nenhuma força, consiga a redenção das nossas almas.

A intenção, é claro, não é de ter créditos pela sua empreitada. Com um falso moralismo e uma humildade hipócrita, prefere que seu nome seja esquecido dos autos da história, mas, ainda assim, nunca perde a oportunidade de pronunciar aos quatro cantos “eu sou o escolhido”.

Depois de algum tempo, o mito passa a ter não só a benção de Deus, mas também dos homens. Quando mais nada consegue pará-lo e com medo de que todo aquele poder alcançado aos trancos e barrancos seja tirado dele, o mito, que jurava ter derrotado o mal logo na primeira batalha, começa a ver o inimigo em todos os lugares. 

Quando descobre que os detentores da justiça da província libertaram o único que pode lutar de igual para igual com ele, ele começa a clamar aos deuses que ele jurou que o abençoavam, mas esses não o respondem. Aos homens, faz promessas e lembra de guerras que não existiram, recorda lances realizados com espada que não foram reais, e recita cânticos de guerra que não rimam.  

Ao inimigo promete a derrota eterna sob pena de morte, e aos que o ajudarem amaldiçoa com uma vida de dificuldades. 

Em segredo, toda a noite, o herói pinga duas gotas de colírio no olho esquerdo. Depois de passar por vários curandeiros, descobriu o motivo pelo qual via tudo em vermelho daquele lado. O cérebro, já corroído, se esforçava muito para inventar histórias, o que resultava na pressão e destruição dos vasos sanguíneos. Do olho esquerdo nada podia ver além de vermelho. 

Já muito conturbado, tinha certeza de que quando isso acontecesse ao olho direito, nada poderia o impedir de reconhecer a todos como inimigos da pátria.

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