Não, não tenho nada de racional a dizer hoje. Nada de interessante que possa ter alguma utilidade. Estou de volta ao mesmo patamar de um ano atrás. As palavras estão novamente todas presas em mim. De dia, elas me sufocam, me embrulham o estômago. À noite, elas escorrem na forma de lágrimas e invadem os meus sonhos.
Há um ano tudo ia passar. Estava escrito. Mas ainda não passou. Aonde foi parar o cuidado?
À noite, tudo parece pior: os pensamentos, o futuro, o frio. Tenho dormido mal. Tenho sonhado pesadelos. Tenho chorado sozinha. A história pesa sobre os meus ombros. Mas não posso brigar com ela. Aonde foi parar o afeto?
A história das quinhentas mil vidas rompe a minha bolha. Na soma de todas as perdas, está tudo obscuro, mas enxergo com clareza. É preciso agir. A verdade é que tudo termina: a gente, a ilusão, os dinossauros, a pandemia. O vazio é abissal. Quantos seremos ao final?
Lamento, é preciso coragem para recomeçar. É preciso coragem para sorrir.
Ando acumulando forças e esperanças. Mas será suficiente?
Ando investindo em sonhos, bicicletas, música e milk shakes. Mas existir no presente é mais difícil do que parece. Isso de viver um dia de cada vez é na verdade um grande desafio e talvez seja um grande engano. Um artifício criado para tentar dar sentido para o absurdo que estamos vivendo.
Uma vez, aprendi a ceder para evitar tempestades. Mas não há nada mais que eu possa fazer. Quero abrir os olhos. Quero abrir os olhos e perceber que a cada dia estou mais próxima de quem eu realmente sou. Mas estamos sofrendo de descontinuidades, de interrupções. O que há no meio? Conseguiremos resgatar o que ficou perdido do outro lado? Na outra margem?
A vida não voltará a ser normal. Mas na sombra do amor, tudo parece mais tolerável, alegre e leve. Sob sombra do amor, angústia se dissipa. Quero me diluir, me alienar nas suas bordas. A pandemia tira, mas a pandemia também traz. Aonde foi parar o amor?
Todos sangram. Todos têm as batalhas internas, invisíveis a olho nu. Às vezes é preciso acreditar em mentiras simplesmente porque elas são mais suportáveis que a dolorida verdade. Mas a realidade é o espelho do que precisa ser refletido, encarado. Aonde foi parar a empatia?
O que estará além?
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