Tais Civitarese
Meus filhos não conheciam relâmpago.
Nunca tinham visto uma cigarra.
Achavam que o céu tinha estrelas, mas não tantas.
Arco-íris, só no desenho animado.
Granizo? Parecia palavra escrita errado.
Dia e noite davam meio que no mesmo.
Estavam sempre do lado de dentro,
sob alguma lâmpada de led.
Árvore era coisa para as férias.
Insetos, uma preocupação mortífera.
Nunca tinham plantado uma semente na terra.
Frio e calor eram só para trocar de roupa.
A sola dos seus pés, lisinha, sempre em cima do chinelo.
O vento era incômodo,
o silêncio, impossível.
Verde era a cor de suas canetas,
muito mais do que as matizes do horizonte.
Nuvem não tinha forma.
Flor era coisa que vinha em buquê ganhado.
Passarinho era pombo.
Bicho era cachorro e gato.
Fruta vinha do supermercado.
Cheiro era perfume.
Terra, sujeira.
Liberdade era poder assistir à tevê
além das horas preconizadas.
Havia alguma coisa de muito errado com a nossa vida.