Há algo de podre no reino da Dinamarca

Victória Farias

Alguém, em algum momento, disse esses termos na obra de Hamlet, entre outras coisas; mas não sei se podemos validar isso, afinal, Hamlet falava com uma caveira. Bom, se colocarmos as coisas em equilíbrio, entre interlocutores com quadrúpedes e declamadores ao cálcio, acho que podemos classificar a loucura de Hamlet como leve.

A podridão no reino da Dinamarca estava exatamente onde se propõe: no reinado. Colocando em perspectiva, existem muitos infortúnios acontecendo em muitos lugares e vários espectadores – ou filhos – esperando pacientemente – ou não – para ascenderem ao protagonismo. Enquanto não, zeros à direita – pois os zeros à esquerda não acrescentam nada a uma quantia, correto? – chamam um pouco da atenção, já muito dispersa, para si.

Acho que quem disse a frase de abertura desse texto foram as três bruxas. Não posso confirmar, nunca li a constituição de Shakespeare, mas existem outras Cartas Magnas mais corriqueiras que deveriam chamar mais atenção de alguns ávidos por matarem coisas que se confundem, como viroses persistentes e aparições vermífugas perenes.

No final das contas, percebemos que já estava mesmo tudo meio podre. Tudo indo pelos cítricos, ou pelos cloros, dependendo de qual lado da Dinamarca estamos falando. Não havia outra saída, a não ser tirar um e colocar outro, e foi o que aconteceu. Saiu o velho, batido, acostumado, e o novo se fez. Nascendo como se nascem diferentes sóis para diferentes sombras alvoradas. Diferentes ou não, todas nascem.

Vamos à caveira. Acredito que foi a solidão, emendada a uma necessidade de escuta forçada.

Falando em zeros, e essa, juro, é a última alucinação shakespeariana que trago para a sua segunda-feira normal e minha segunda-feira pós-aniversário, é que fiquei sabendo que o nosso Plano Real nem-tão-real-assim, ganhou mais um componente. Dentro em breve, as notas de duzentos reais estarão entre nós enfeitando nossas carteiras… Não, espera. Não consigo fazer duzentos com duas notas de três, mas fazer noventa mil com seis meses dá sim e eu posso provar.

A plateia, como imaginado, ainda estará se perguntando “o que há de podre no reino da Dinamarca?”. A caveira, se não fosse tão diminuta na hierarquia animal, talvez soubesse responder.

*

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