Na semana passada, falei um pouco sobre os discursos de invisibilidade do teletrabalho e, como a temática é complexa e as dificuldades do homeoffice estão na ordem do dia, resolvi continuar abordando o assunto do ponto de vista feminino.
Uma paciente, cujo regime de trabalho migrou exclusivamente para o teletrabalho por causa da Covid-19, me relata que realiza suas atividades “entre uma pia de louça suja e as lições escolares”. Uma outra me diz que se pudesse escolher, só aceitaria o homeoffice se houvesse escola disponível para deixar os filhos.
Se até bem pouco tempo atrás o teletrabalho “invadia” a vida doméstica, com a consequente “transferência de custos, a cessão de espaços de casa, a acumulação de tarefas e o excesso de horas trabalhadas” (COSTA, 2005), gosto de pensar que hoje a vida doméstica “invade” o mundo do trabalho de uma maneira peculiar e com consequências indeléveis.
As crianças, os cachorros, os ruídos e a intimidade do lar se fazem presentes no teletrabalho, o que não é necessariamente ruim. Isso “deixa à vista” a ginástica equilibrista que as mulheres faziam e fazem cotidianamente para lidar com as exigências domésticas, da família e as do próprio trabalho. Isso deixa evidente o invisível desequilíbrio de forças sociais que operam no sentido de fragilizar e esconder as mulheres, dificultando que elas ocupem seu lugar e sua identidade laboral.
O mundo do trabalho sempre foi do masculino, do local público, com horários fixos, de carreira para toda a vida (COSTA, 2005), e mesmo no mundo contemporâneo, muitas são as desigualdades entre os gêneros.
Mesmo com maior escolaridade, as mulheres tendem a ganhar menos que os homens, têm menos acesso a cargos de gestão e liderança, são menos ouvidas e reconhecidas nos trabalhos em equipe, opinam menos nas decisões. Muitas delas, para terem “seu lugar ao sol” acabam por negar sua condição feminina, se masculinizando nos comportamentos e vestimentas do mundo corporativo.
Historicamente, foi o espaço privado, o doméstico que ficou reservado para as mulheres e também as profissões “altruístas” da educação, do cuidado, da caridade, nas quais não se pode cobrar caro ou ter lucro. Aliás, às mulheres não se foi ensinado cobrar, mas trabalhar voluntariamente. Raramente se vê um homem nestas mesmas condições. Os homens não se sentem culpados em ganhar dinheiro (GUTMAN, 2018).
Novamente digo, não sei onde toda essa mudança vai nos levar, quais os caminhos possíveis serão construídos, mas acredito que o momento nos impõe uma reflexão cuidadosa como sociedade para essa questão – que é ampla e passa por representação política, por políticas de proteção à mulher, à infância e de educação.
Realmente torço para que haja uma mudança de cultura laboral na qual a lógica qualitativa seja tão valorizada como a lógica quantitativa. Espero mesmo que haja a incorporação e o reconhecimento do feminino no mundo do trabalho, com mais possibilidades de acesso e redução das desigualdades de gêneros.
– COSTA, I.S.A. Controle em novas formas de trabalho: teletrabalhadores e o discurso do empreendimento de si. Cad. EBAPE, volume III, n° 1, 2005.
– GUTMAN, L. As mulheres, a maternidade e o trabalho – Cap. 13. In: A maternidade e o encontro com a própria sombra. Rio de Janeiro: Best Seller, 2018
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