Daniela Piroli Cabral
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Mais uma vez as mídias estão estampadas com manchetes de denúncias de assédio sexual. Agora, quem está lá é João de Deus. Mas já vimos vários outros denunciados: médicos, treinadores esportivos, coaches, dentistas, supervisores e chefes.
Não estou aqui para entrar no mérito de julgamento, todos eles tiveram ou terão a chance de apresentarem suas defesas e seus argumentos, cabendo à justiça a decisão final de mérito e possível reparação do danos envolvido na questão.
Meu objetivo aqui é enfatizar alguns pontos com caráter de repetição em todas essas histórias, que podem nos auxiliar a compreender mais a fundo a questão do assédio sexual e da violência contra a mulher.
Assédio nas relações de confiança
Um primeiro ponto que chama a atenção é que o assédio aconteceu dentro de uma relação de “confiança”, em que uma das partes, por fragilidade, problemas, conflitos ou desorientação, procurou a outra parte por busca de ajuda, mas acaba saindo mais machucada, prejudicada, violentada do que chegou.
Isso nos faz ficar atentos a relações de assimetria de poder, muitas vezes resguardadas pelo sigilo profissional, aliadas a uma certeza de “impunidade” e à cultura machista e de violência na qual estamos imersos. Como exemplo, em recente pesquisa do Ipea, 26% dos brasileiros acreditam que as mulheres que mostram o corpo merecem ser atacadas.
Uma fala, todas falam
Um segundo ponto comum é que basta uma das vítimas resolver abrir a boca e denunciar que se seguem a elas mais uma extensa lista denúncias semelhantes. No caso de João de Deus até o momento foram 89! E os relatos sempre trazem um caráter de paralisação/falta de reação frente a situação de constrangimento, dificuldade em oferecer resistência diante da agressão.
O tempo é uma particularidade
Existe uma lacuna de tempo entre o ato em si (às vezes repetidos) e a realização da denúncia, pois, mais que a violência física, a violência psicológica paralisa e silencia as vítimas. Muitas vezes por dificuldade de compreensão imediata da situação, por medo de retaliação, por constrangimento de compartilhar a história com pessoas próximas, por vergonha por ter se exposto a tal situação e não ter conseguido um desfecho diferente do daquele, por culpa de terem, de alguma forma, provocado a agressão.
A violência sexual está em todo o lugar: ambientes domésticos, ambientes profissionais, nas escolas, nos transportes coletivos. Estão aí o apitos distribuídos nos ônibus de Belo Horizonte.
Alguns se questionam: falar de assédio faz aumentar a quantidade de casos? Não, falar de assédio ajuda a disseminar a informação, o que promove consciência entre as mulheres que estão em situação ou relação de violência e não numa relação de ajuda.
Se você se sentiu, em algum momento, mais agredida que ajudada, mais invadida do que respeitada, mesmo que não tenha passado por uma situação de violência explícita, você pode ter sido vítima de assédio sexual e violência psicológica. Denuncie e procure ajuda profissional.
Para saber mais:
- MINISTÉRIO PÚBLICO DO TRABALHO. Assédio sexual no trabalho – Perguntas e respostas. Brasília, 2017.
Adorei a sua página. Muito bem explicada. Continuarei acompanhando.
Oi Roberta.
Que bom que gostou. E (re)descobriu um texto de 2018, ainda atual. Você chegou a assistir a série “Em nome de Deus”, que saiu agora em 2020? Fica como dica.