Oscar 2023 – Indicados e Previsões

Domingo, 12/03, é dia de Oscar! A 95a edição da festa da Academia de Artes e Ciências Cinematográficas (AMPAS) será realizada no Teatro Dolby, em Los Angeles, como tem sido, e conta com o apresentador e comediante Jimmy Kimmel à frente. São 10 indicados como Melhor Filme e um total de 23 categorias, o que costuma alongar a duração da cerimônia.

O filme com maior número de indicações esse ano é Tudo em Todo o Lugar ao Mesmo Tempo (Everything Everywhere All at Once, 2022). A protagonista,  Michelle Yeoh, é a primeira indicada como Melhor Atriz na história a se identificar como asiática. Angela Bassett, coadjuvante em Pantera Negra: Wakanda Para Sempre (Black Panther: Wakanda Forever, 2022), é a primeira atriz indicada por um filme da Marvel e apenas a quarta atriz negra a ter mais de uma indicação. O maestro e compositor John Williams é o indicado mais velho, aos 90 anos, e emplacou sua 53a indicação, perdendo apenas para Walt Disney (59). Williams já venceu cinco vezes

O diretor, produtor e roteirista Steven Spielberg é a única pessoa a ser indicada ao Oscar em seis décadas diferentes, e esse não é o único recorde dele. Ele empatou com William Wyler com 13 filmes indicados na categoria principal e tem nove indicações como Melhor Diretor, assim como Martin Scorsese.

Outra que fez um número bonito é Cate Blanchett, que esteve em dez indicados como Melhor Filme e emplacou a oitava indicação como atriz, empatando com Judi Dench, Glenn Close e Geraldine Page. Só perdem para Bette Davis (10), Katharine Hepburn (12) e a recordista Meryl Streep (21). Se ganhar, será seu terceiro Oscar, se igualando a Streep, Frances McDormand e Ingrid Bergman, abaixo apenas de Katharine Hepburn (4).

Abaixo, você confere a lista de indicados por categoria, com links para as críticas disponíveis no Pipoqueiro. O número 1 em frente indica o meu palpite para o vencedor e o número 2 indica aquele que eu gostaria que ganhasse. Se os dois coincidirem, terá apenas um X.

Melhor Filme

Top Gun: Maverick

Entre Mulheres

Tudo em Todo o Lugar ao Mesmo Tempo – 1

Os Banshees de Inisherin – 2

Triângulo da Tristeza

Os Fabelmans

Nada de Novo no Front

Avatar: O Caminho da Água

Elvis

Tár

 

Melhor Direção

Martin McDonagh – Os Banshees de Inisherin

Todd Field – Tár

Ruben Östlund – Triângulo da Tristeza

Daniel Kwan & Daniel Scheinert – Tudo em Todo o Lugar ao Mesmo Tempo – 1

Steven Spielberg – Os Fabelmans – 2

 

Melhor Ator

Brendan Fraser – A Baleia – X

Austin Butler – Elvis

Colin Farrell – Os Banshees de Inisherin

Bill Nighy – Living

Paul Mescal – Aftersun

 

Melhor Atriz

Andrea Riseborough – To Leslie

Michelle Williams – Os Fabelmans

Cate Blanchett – Tár – X

Ana de Armas – Blonde

Michelle Yeoh – Tudo em Todo o Lugar ao Mesmo Tempo

 

Melhor Ator Coadjuvante

Brendan Gleeson – Os Banshees de Inisherin – 2

Brian Tyree Henry – Passagem

Judd Hirsch – Os Fabelmans

Barry Keoghan – Os Banshees de Inisherin

Ke Huy Quan – Tudo em Todo o Lugar ao Mesmo Tempo – 1

 

Melhor Atriz Coadjuvante

Angela Bassett – Pantera Negra: Wakanda Para Sempre – 1

Kerry Condon – Os Banshees de Inisherin – 2

Jamie Lee Curtis – Tudo em Todo o Lugar ao Mesmo Tempo

Stephanie Hsu – Tudo em Todo o Lugar ao Mesmo Tempo

Hong Chau – A Baleia

 

Melhor Filme Internacional

Nada de Novo no Front – 1

Argentina, 1985 – 2

A Menina Silenciosa

Close

Eo

 

Melhor Roteiro Original

Tudo em Todo o Lugar ao Mesmo Tempo – Daniel Kwan, Daniel Scheinert – 1

Os Banshees de Inisherin – Martin McDonagh – 2

Triângulo da Tristeza – Ruben Östlund

Os Fabelmans – Steven Spielberg, Tony Kushner

Tár – Todd Field

 

Melhor Roteiro Adaptado

Living – Kazuo Ishiguro

Top Gun: Maverick – Christopher McQuarrie, Peter Craig, Ehren Kruger

Entre Mulheres – Sarah Polley – 1

Glass Onion: Um Mistério Knives Out – Rian Johnson

Nada de Novo no Front – Edward Berger, Lesley Paterson, Ian Stokell – 2

 

Melhores Efeitos Visuais

Top Gun: Maverick

Pantera Negra: Wakanda Para Sempre

Nada de Novo no Front

Avatar: O Caminho da Água – 1

The Batman – 2

 

Melhor Trilha Sonora

Babilônia – Justin Hurwitz – X

Tudo em Todo o Lugar ao Mesmo Tempo – Son Lux

Os Banshees de Inisherin – Carter Burwell

Os Fabelmans – John Williams

Nada de Novo no Front – Hauschka

 

Melhor Curta-Metragem de Animação

My Year of Dicks

Ice Merchants

An Ostrich Told Me the World Is Fake and I Think I Believe It

O Menino, a Toupeira, a Raposa e o Cavalo – X

The Flying Sailor

 

Melhor Filme de Animação

Red: Crescer É uma Fera

Pinóquio – X

Marcel the Shell with Shoes On

A Fera do Mar

Gato de Botas 2: O Último Pedido

 

Melhor Canção Original

Naatu Naatu – RRR – X

This Is a Life – Tudo em Todo o Lugar ao Mesmo Tempo

Lift Me Up – Pantera Negra: Wakanda Para Sempre

Hold My HandTop Gun: Maverick

ApplauseTell It Like a Woman

 

Melhor Curta-Metragem em Live Action

An Irish Goodbye – X

The Red Suitcase

Le Pupille

Ivalu

Night Ride

 

Melhor Documentário de Longa-Metragem

All That Breathes

Vulcões: A Tragédia de Katia e Maurice Krafft

All the Beauty and the Bloodshed

A House Made of Splinters

Navalny – X

 

Melhor Documentário de Curta-Metragem

Haulout

The Martha Mitchell Effect

Stranger at the Gate

Como se Mede um Ano?

The Elephant Whisperers – X

 

Melhor Som

Nada de Novo no Front

Avatar: O Caminho da Água

The Batman

Elvis

Top Gun: Maverick – X

 

Melhor Design de Produção

Nada de Novo no Front

Avatar: O Caminho da Água

Babilônia

Elvis – X

Os Fabelmans

 

Melhor Fotografia

Nada de Novo no Front – 1

Bardo, Falsa Crônica de Algumas Verdades

Elvis – 2

Império da Luz

Tár

 

Melhor Maquiagem e Penteados

Nada de Novo no Front

The Batman

Pantera Negra: Wakanda Para Sempre

Elvis – X

A Baleia

 

Melhor Figurino

Babilônia

Pantera Negra: Wakanda Para Sempre

Elvis – X

Tudo em Todo o Lugar ao Mesmo Tempo

Sra. Harris Vai a Paris

 

Melhor Montagem

Os Banshees de Inisherin

Elvis – 2

Tudo em Todo o Lugar ao Mesmo Tempo – 1

Tár

Top Gun: Maverick

Os cinco atores indicados na categoria principal são estreantes no Oscar

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Pânico VI empurra a franquia adiante

A boa arrecadação e as críticas animadoras do quinto Pânico (Scream, 2022) garantiram à dupla Tyler Gillett e Matt Bettinelli-Olpin a direção do sexto capítulo, e retornam também os roteiristas, James Vanderbilt e Guy Busick. É a primeira vez que acompanhamos uma trama que não visita Woodsboro, a cidade onde tudo aconteceu (e tem acontecido), e Nova York traz mais possibilidades. E mais suspeitos.

No início de Pânico VI (Scream VI, 2023), reencontramos os quatro sobreviventes do anterior, que se mudaram para uma grande cidade e foram cuidar de suas vidas. Tara (Jenny Ortega, mais conhecida como Wandinha) está na faculdade e tenta viver normalmente, deixando de lado toda a tragédia de seu passado. Já a irmã, Samantha (Melissa Barrera), não acha assim tão fácil seguir adiante e é superprotetora com Tara. Elas continuam tendo por perto os irmãos Mindy (Jasmin Savoy Brown) e Chad (Mason Gooding), e outros personagens aparecem para completar o quadro.

Pelo trailer já dá para entender que alguém em NY sabe do passado do quarteto e vai fazê-los reviver tudo aquilo. A campanha de marketing aproveita bem a sequência no metrô, mas a verdade é que o fato de termos uma cidade grande não é bem aproveitado pelo filme. Poucas cenas se passam em locais abertos e multidões. De resto, é como se eles estivessem em uma cidadezinha, sempre fechados em um lugar pequeno.

A estrutura dessa sexta parte é similar à dos anteriores, com uma introdução interessante com a linda Samara Weaving fazendo uma ponta – ela foi a protagonista de Casamento Sangrento (2019), dos mesmos diretores. A metalinguagem e as piadas e referências cinematográficas continuam fortes, com menos humor e piadas, o que é bom. Regras e conceitos novos são introduzidos (a participação de Tony “Flash” Revolori comprova isso), o que movimenta as coisas um pouco.

Além do quarteto do filme anterior, temos a volta de Courteney Cox, mais uma vez vivendo a enxerida repórter Gale Weathers, e de Hayden Panettiere, que foi ferida no quarto filme e aparece como agente do F.B.I. Algo que pode ser um problema para novatos na franquia é o número de citações diretas aos anteriores, dos assassinos às vítimas, passando por diversas situações. Para quem reclama do “esquema de pirâmide” do Universo Cinematográfico da Marvel, este não fica atrás.

Dentre as novidades do elenco, temos dois rostos conhecidos que chegam para reforçar a turminha jovem. Henry Czerny (também de Casamento Sangrento) é o psicólogo de Sam, enquanto Dermot Mulroney (mais lembrado por O Casamento do Meu Melhor Amigo, de 1997) faz o pai de uma nova amiga dos principais. Depois de fazer Sobrenatural: A Origem (2015) e a série The Purge, Mulroney se junta a outra bem sucedida franquia de terror.

Como sempre acontece, algumas das regras e clichês indicados pelos personagens são utilizados pelo roteiro, o que quebra um pouco a metalinguagem. Algumas situações são forçadas, como personagens que somem e aparecem apenas quando necessário, e parte do elenco faz caretas desnecessárias apenas para parecerem suspeitos. Assim, desconfiamos de todos e somos supreendidos por um final não muito inspirado. Nossa única certeza, desde o início da sessão, é que virão muitos Pânico por aí ainda. Só não sabemos se há fôlego para isso.

A sequência no metrô é de longe o melhor momento do longa

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Aftersun traz uma bela relação entre pai e filha

por Laís Simão

Um dos destaques da temporada atual de premiações, Aftersun (2022) retrata a lembrança de Sophie (Frankie Corio), que a partir de vídeos gravados por uma câmera caseira e por fragmentos de sua memória, relembra as férias que passou com seu pai (Paul Mescal). A história se passa em um hotel decadente na Turquia, com ambientação próxima aos anos 90. Por meio de cortes entre o que é lembrança e o que foi registrado em vídeo, a adulta Sophie reconstrói sua história na tentativa de entender melhor o pai.

Nos últimos anos, escutamos com frequência o termo “mãe solo”. A normalização do termo veio para denominar uma realidade vivenciada por diversas mães no Brasil. De acordo com o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), quase 12 milhões de mulheres brasileiras sabem e vivem essa realidade. No primeiro semestre de 2022, o Portal de Transparência de Registro Civil constatou que no Brasil 100.717 bebês vieram ao mundo sem o registro paterno em sua certidão de nascimento, o que equivale a 6,5% total de recém-nascidos.

O abandono paterno é uma possibilidade que, por vezes, não é alcançado como escolha da mãe. Muito se discute sobre a solidão na maternidade solo, mas pouco se fala sobre a lacuna que fica para o filho que cresce na ausência do pai.

A atuação de Mescal merece destaque. O jovem pai Calum é mostrado em camadas, aos poucos vamos conhecendo melhor suas questões. De pronto é apresentado como um pai companheiro, sensível e protetor. No entanto, a partir do desenrolar de história, percebemos as complexidades que carrega em sua bagagem, sobretudo em relação a sua difícil infância, bem como os atuais problemas financeiros, o que indiretamente é projetado em sua filha.

Mescal se tornou bastante conhecido em seu papel na série Normal People e também recentemente participou do filme A Filha Perdida (The Lost Daughter, 2021), atuando com a célebre Olívia Colman. A escolha por um rosto conhecido foi decisiva, pois auxiliou na imediata confiança e identificação com o personagem. Isso sem contar o carisma do ator, o que lhe garantiu a indicação como Melhor Ator no Oscar 2023, sendo essa a única indicação de Aftersun para a premiação.

A atriz Frankie Corio é um nome que vale acompanhar. Com apenas 13 anos de idade, já pode se orgulhar do excelente desempenho no filme, que foi seu primeiro papel. Corio soube interpretar os conflitos de uma pré-adolescência em descoberta, sem perder ainda aspectos importantes da infância. Em entrevistas, Mescal não economizou elogios à parceira de atuação e ainda contou que, por orientação da diretora e roteirista Charlotte Wells, antes de iniciar de fato as gravações os atores conviveram em um ambiente livre de câmeras e roteiro, apenas se preocupando em conhecer um ao outro e desenvolver a intimidade que foi perfeitamente demonstrada no longa.

A partir das lentes sensíveis de Wells, a história de Sophie e Calum se misturam com a sua própria. Wells não escondeu do público que Aftersun, seu primeiro filme, possui traços biográficos. A informação não é de todo irrelevante, até mesmo pela forma que a história foi contada: tal como a protagonista que pretende entender a si mesma, Wells fez de uma possível história de abandono uma obra de arte. Outro nome que vale a pena acompanhar.

Por fim, para todos que vivenciaram os anos 90, a trilha sonora foi quase um presente por nos permitir alcançar as lembranças movidas pelas músicas tocadas naquela época, tal como Losing My Religion, de R.E.M, Drinking in L.A., de Bran Van 3000 e Under Pressure, de Queen (embora seja dos anos 80, é quase onipresente entre as gerações).

Para quem não conseguiu assistir ao filme nos cinemas, ele já está disponível no Amazon Prime Video, Apple TV, Youtube e Google Play Filmes.

Wells levou seu elenco a várias premiações

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Creed III pode ser um bom final pra história do lutador

Pela terceira vez, cumprindo a aparente tradição atual de fazer trilogias, Michael B. Jordan volta à pele de Adonis Creed. Em Creed III (2023), o sujeito está aposentado dos ringues, trocou o calção por ternos e se tornou empresário. Pela primeira vez em toda a franquia Rocky, alguns assuntos espinhosos são tratados, o que deve ter sido a causa do afastamento voluntário de Sylvester Stallone, que disse em entrevistas que “não queria ver seus heróis em lugares sombrios”, e Jordan ainda aproveitou para estrear como diretor.

Novamente com uma história de Ryan Coogler, diretor do primeiro filme, Jordan faz um trabalho seguro na direção, aproveitando para homenagear a franquia em algumas cenas, fazer interessantes contrapontos a momentos famosos e até inovar, criando belas sequências de luta. A corrida na colina do letreiro de Hollywood é bem simbólica, afirmando o astro que Creed se tornou e o espetáculo que será protagonizado por ele.

Como sempre acontece, o filme só funcionaria se houvesse uma boa desculpa para trazer Adonis de volta e se ele tivesse um bom antagonista. Para essa vaga, foi escolhido um dos nomes mais requisitados do momento: Jonathan Majors, atualmente em cartaz como o novo vilão do MCU, Kang, em Homem-Formiga e a Vespa: Quantumania (2023). A química entre os dois é ótima, a forma física em que estão exigiu treinamento extenuante e a ligação entre os dois no passado é perfeitamente crível.

Quando reencontramos Creed, ele está com uma vida bem confortável. Uma esposa fantástica, uma filha espertíssima e uma nova carreira como empresário do boxe. Longe dos ringues há três anos, ele sente falta, mas acha que sua época passou. Um amigo há muito distante reaparece e dá uma chacoalhada na situação, forçando Creed a reavaliar a sua vida. Ao contrário do filme anterior, Tessa Thompson tem muitas chances de brilhar como Bianca, que vive seu próprio dilema.

É possível fazer paralelos entre os lutadores principais e seus intérpretes. Jordan apareceu de uma vez, chamando a atenção em filmes como Poder Sem Limites (Chronicle, 2012) e Fruitvale Station (2013), e hoje é um grande astro. Majors explodiu com a série Lovecraft Country e hoje tem vários projetos simultâneos – e uma pequena passagem pela polícia quando mais jovem, por furto. É fácil perceber como eles se conectaram com as situações vividas por Adonis e Damian.

Umas boas doses de suspense misturadas ao drama dos personagens movimentam as coisas. O final de Creed III é facilmente previsível, mas, aqui, não é o que importa, e sim a jornada. Jordan faz boas escolhas para manter tudo emocionante e entrega um ótimo resultado, ainda mais por se tratar da primeira vez que comanda um filme. Estranha mesma é só a ausência de Stallone, já que Rocky certamente estaria por perto em vários momentos. Talvez o ator esteja pensando num próximo filme do ex-lutador, voltando a ter o seu próprio nome à frente da franquia.

As coisas correram tão bem que essa amizade deve durar

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Quantumania apresenta Kang e releva o Homem-Formiga

Com números fracos e críticas pouco empolgantes lá fora, o novo longa do Universo Cinematográfico Marvel chegou aos cinemas no nosso Carnaval, o que também não ajuda. Mesmo atualmente em primeiro lugar nas bilheterias nacionais, Homem-Formiga e a Vespa: Quantumania (Ant-Man and the Wasp: Quantumania, 2023) despencou internacionalmente entre suas duas primeiras semanas de exibição. Nem a promessa de apresentar o próximo grande vilão desse universo motivou o público.

Apresentado rapidamente na série do Loki, Kang, O Conquistador tem um pouco mais de sua história contada. Tido como a grande ameaça a todo o multiverso (após a derrota de Thanos), o sujeito tem sua grande força em seu intérprete: Jonathan Majors, muito elogiado em Lovecraft County e altamente esperado no novo Creed III (2023). O ator traz simpatia ao vilão e deixa o espectador em cima do muro quanto a seus propósitos. O que, no fim das contas, nunca fica muito claro.

Scott Lang, o Homem-Formiga vivido por Paul Rudd, continua uma figura agradável, numa quantidade menor de piadas, o que é ótimo. No entanto, Hank Pym, o primeiro Homem-Formiga, vivido por Michael Douglas, tem mais destaque na trama, assim como Janet (Michelle Pfeiffer), e isso torna Scott e Hope (Evangeline Lilly) um tanto apagados. E a filha de Scott, Cassie Lang (Kathryn Newton, de Freaky, 2020), aparece do nada como uma nova heroína. Assim como o Dr. Estranho (No Multiverso da Loucura, 2022), ela parece inteligente e experiente, mas causa toda a confusão.

Além de uma história sem graça e sem nexo, o outro problema desse Quantumania é o poder do antagonista. Vendido como extremamente poderoso, Kang poderia ter tomado medidas para garantir que seu plano fosse bem sucedido de cara, o que resolveria tudo em minutos. Decisões são adiadas apenas para que o filme exista, já que caso contrário ele não se justificaria. O personagem tem traços interessantes, mesmo que não o conheçamos direito, e os efeitos visuais melhoraram, mas ele perde a mão na reta final e vira mais um genérico qualquer.

A Marvel é sempre acusada de ligar suas produções a tal ponto que, se você perde alguma, fica difícil entender o que está acontecendo. Não é bem assim, mas algumas obras são realmente mais importantes para se pegar o fio da meada. Para acompanhar Quantumania, é bom ter visto Loki e as aventuras anteriores do Homem-Formiga. Figuras como MODOK serão melhor compreendidas. As cenas dos créditos (duas) são sempre pistas para o que vem pela frente, reforçando essa ligação tipo esquema de pirâmide. Para os fãs do eterno caça-fantasma Bill Murray, a ponta pode valer a sessão.

Kang ainda vai causar muitos problemas no MCU

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The Bear é um caótico cotidiano que vale a pena acompanhar

O sucesso de The Bear, série da Star+, nas redes sociais parece daqueles fenômenos difíceis de explicar. A trama acompanha um renomado chefe de cozinha, Carmen (Jeremy Allen White, de Vigiados, 2020), assumindo o popularesco restaurante de seu finado irmão Mikey (Jon Bernthal, de Ford vs Ferrari, 2019), com a difícil missão de não deixá-lo acabar.

A tarefa de fato não é simples. Na cozinha, uma equipe de pessoas pouco preparadas em comparação a Carmy, mas que sabem fazer o que sempre fizeram: preparar comidas populares a fregueses aparentemente menos criteriosos.

Carmy divide a missão de levar o empreendimento para frente ao lado do sócio Richie (Ebon Moss-Bachrach, de The Dropout), um sujeito difícil, imbecil e cheio de orgulho próprio, mas que sabe a importância de preservar a memória do antigo amigo, irmão do novo chefe.

Na cozinha, há elementos que nos fazem julgar um restaurante de pouca estrutura, como sujeira, espaço reduzido e uma equipe desorganizada e barulhenta. As imagens fechadas, ligeiras, e o barulho alto até lembram um lugar de pressão, como uma panela, que pode a qualquer momento explodir. Mas não explode.

São oito episódios de uma trama amarrada e que aos poucos parece revelar uma solução ao caos liderado por Carmy, mas não sem antes um grande problema colocar tudo por água abaixo. Cada um dos episódios revela uma nova história, com um problema a ser solucionado ali, mas que gira em torno de um trama maior: a antiga relação de Carmy com seu irmão morto, bem como a deles com o restaurante.

The Bear tinha tudo para cair no ódio do público graças à sua caótica estrutura, com poucas filmagens em espaços abertos e diálogos que beiram um ataque de nervos. No entanto, o roteiro azeitado, a bela interpretação de Jeremy Allen White e a interação entre os personagens fazem com que a série seja um dos grandes sucessos de 2022.

Oliver Platt é um dos rostos conhecidos que aparecem em pontas em The Bear

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A Baleia conta com muito mais que ótimas interpretações

Quem achou que o máximo que o diretor Darren Aronofsky iria bagunçar a cabeça do espectador era com Réquiem para Um Sonho (Requiem for a Dream, 2000) estava enganado. Se precipitou. Chega aos cinemas essa semana A Baleia (The Whale, 2022), uma história muito bem contada e extremamente bem atuada que deve arrancar lágrimas do mais frio dos corações. E ainda marca a volta de Brendan Fraser aos holofotes, coberto de elogios e com vários prêmios.

Adaptando sua própria peça, o roteirista Samuel D. Hunter trata de vários assuntos espinhosos de uma vez só e com tamanha sensibilidade que consegue amarrar todas as pontas e nos apresentar a personagens críveis, pelos quais nos afeiçoamos de cara. Paternidade, homossexualidade, religião, redenção, amadurecimento, luto, depressão… Parece muita coisa para abarcar, mas Hunter faz uma mistura sadia e envolvente e Aronofsky nos conduz com maestria ao final dessa jornada.

Fraser, lembrado pelas aventuras da Múmia (1999, 2001 e 2008) e comédias como George, o Rei da Floresta (George of the Jungle, 1997 – abaixo) e Endiabrado (Bedazzled, 2000), nunca desapareceu totalmente, mas passou a fazer filmes e séries menos badalados e, para boa parte do público, sumiu. Seu talento não era segredo para ninguém, podendo ser atestado em longas como Deuses e Monstros (Gods and Monsters, 1998) e O Americano Tranquilo (The Quiet American, 2002).

A interpretação do ator em A Baleia é realmente digna de colocá-lo no topo do talento hollywoodiano. Com uma maquiagem pesada para torná-lo exageradamente obeso, ele vive Charlie, alguém que claramente tem muitos problemas psicológicos, que vamos conhecendo ao longo da sessão. Dá grande agonia acompanhar a rotina de Charlie, ele tem dificuldade com coisas cotidianas devido ao seu tamanho. Pegar algo no chão, por exemplo, é uma tarefa ingrata. Com contato apenas com uma amiga que serve de enfermeira (Hong Chau, de O Menu, 2022), resta a ele se dedicar ao trabalho.

Seu mundinho sofre um terremoto quando sua filha adolescente (Sadie Sink, de Stranger Things) resolve procurá-lo depois de anos sem contato. Charlie não parece se importar consigo mesmo, como se não merecesse ser feliz. Ou mesmo viver. Quase como um Despedida em Idaho – lembrando do personagem de Nicolas Cage em Despedida em Las Vegas (Leaving Las Vegas, 1995). E, como Cage, Fraser deve levar o Oscar de Melhor Ator.

Além do ator principal, todo o elenco de A Baleia é ótimo. Chau (acima) também emplacou uma indicação ao Oscar (como Melhor Atriz Coadjuvante). Sink faz uma adolescente atormentada na medida certa. Acreditamos naquela revolta, ela de fato tem motivos, e qualquer exagero é evitado. Ty Simpkins, o Dalton da franquia Sobrenatural (Insidious), faz um missionário religioso e acerta na composição. E temos ainda a fantástica Samantha Morton (de Cosmópolis, 2012), que faz muito em pouco tempo de cena. O roteiro e os diálogos criados por Hunter facilitam bem o trabalho de todos os envolvidos.

É uma injustiça que A Baleia tenha sido indicado ao Oscar apenas nas duas categorias de atuação e na de Maquiagem e Cabelo. Roteiro e Direção seriam outras duas categorias a serem honradas, além até da Trilha Sonora de Rob Simonsen, tocante sem ser invasiva ou piegas. Mesmo em um espaço restrito, a fotografia de Matthew Libatique, constante colaborador de Aronofsky, é bem sucedida, explorando bem os cômodos e reforçando a impressão de restrição que Charlie vive. São muitos pontos positivos compondo essa bela obra.

Dentre os vários pontos positivos de A Baleia, Fraser é o que mais tem chamado atenção

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Master classes movimentam a Mostra de Cinema de Tiradentes

por Laís Simão

Para aqueles que acham que a Mostra de Cinema de Tiradentes é um evento para apenas exibir novos longas, curtas e documentários, teremos que dar o primeiro spoiler da história do Pipoqueiro: eles estão absurdamente enganados.

Já publicamos sobre o documentário de encerramento, Amazônia, a Nova Minamata? (2022), de direção de Jorge Bodanzky, e caso ainda não tenha lido, fica aqui o convite para a leitura.

Embora a produção do evento tenha construído uma verdadeira sala de cinema no meio da praça, e quando mencionamos o termo “sala” não é nenhum exagero estético – um ambiente escuro, climatizado, com cadeiras confortáveis e estrutura de som melhor que diversos cinemas de rua, o Cine-Tenda merece todo os louros. Mesmo com todo conforto de um cinema de excelente qualidade à disposição dos cinéfilos, a Mostra convidava ao passeio em torno da cidade para outros eventos, debates e apresentações.

Assim, na rua de cima, a famosa Rua Direita, Tiradentes recebia dois grandes roteiristas para lecionar suas master classes no então designado Cine-Teatro. Em um auditório lotado, com direito a pessoas assistindo do lado de fora pela televisão que reproduzia o palco, provavelmente arrependidos por não terem chegado antes, Rosane Svartman (Malhação: Intensa Como a Vida, 2012 – abaixo – e Totalmente Demais, 2015) lecionou a primeira master class do dia. Considerando que se trata de uma cineasta, autora, diretora e produtora, diversos poderiam ser os temas da aula, e o escolhido foi “Em Busca de Um Personagem”.

A roteirista foi muito feliz em prezar pela técnica nos seus ensinamentos. Para isso, inicialmente elencou aspectos importantes que bons personagens devem apresentar em sua jornada, como por exemplo os obstáculos que se tornam meios de transformação e a própria importância do antagonista para o enredo. Assim, ensinou alguns exercícios. Entre eles, o que chamou mais atenção foi o de refletir sobre qual é o nosso maior medo e colocá-lo em uma história, com o personagem vivenciando isso.

Outro exercício que chamou atenção foi a aplicação dos 3Ps: vida pública, vida privada e vida pessoal do personagem. Trata-se de uma forma de humanização do ser fictício, provendo dimensões e complexidades a ele. Depois, a roteirista sugeriu sentar-se em uma cadeira na frente do seu personagem e imaginar uma conversa. Após a experiência, escrever um monólogo sobre ele, suas angústias, seus sonhos, seus medos, narrado em primeira pessoa.

Outro ponto que chamou atenção no evento foi a pontualidade. Apenas dez minutos após o encerramento da fala da Svartman, se iniciou a do também roteirista Pedro Riguetti (Sob Pressão, 2017 – abaixo), que tinha como tema “Estrutura para Séries”. A aula começou com um aspecto técnico, a partir da apresentação de teorias sobre estrutura de roteiro, se aprofundando no conhecido “início, meio e fim”.

Riguetti explicou como cada temporada pode ser uma ferramenta de transformação do personagem, de modo que quando ele consegue, fracassa ou desiste, o desejo chega ao fim. Só que o conflito precisa permanecer vivo, é ele que dá continuidade à trama.

Para ilustrar a teoria, Riguetti fragmentou a célebre série Fleabag (2019), em específico a segunda temporada. Com uma narrativa sensível, deixou o tom professoral de lado, arrancando lágrimas de alguns alunos, inclusive a que vos escreve, para mostrar que o conflito do personagem pode ser algo banal, como amar e não saber o que fazer com isso.

Depois de quatro anos do pior tratamento imaginável à imprensa por parte do governo passado, a assessoria da Mostra fez uma espécie de reparação histórica e tratou os críticos e jornalistas da melhor forma possível. E a assessoria está devidamente antenada com os tempos atuais, diversos conteúdos produzidos pela 26a Mostra de Cinema estão disponíveis online, no Canal Universo Produção, no Youtube. Para quem não pôde comparecer em Tiradentes, o Cinema Mutirão permanece acessível a todos.

A Mostra foi realizada entre 20 e 28 de janeiro

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A mediocridade instagramável naufraga no Triângulo da Tristeza

por Carvalho de Mendonça

Nem mesmo a Palma de Ouro conquistada em Cannes no ano passado foi o suficiente para livrar Triângulo da Tristeza (Triangle of Sadness, 2022) de uma certa contestação quanto a suas três indicações ao Oscar de 2023 (Melhor Filme, Melhor Diretor e Melhor Roteiro Original). Entretanto, não se pode dizer que isso seja algo totalmente negativo, tendo em vista que incomodar e gerar controvérsias parecem ser os principais objetivos da nova comédia dramática do diretor sueco Ruben Östlund (de The Square: A Arte da Discórdia, 2017).

A obra potencializa absurdos da sociedade contemporânea para refletir acerca da mediocridade que assola as relações humanas, em suas diversas camadas. Com o sarcasmo característico de seus trabalhos, Östlund escancara a fragilidade das bases sobre as quais está estruturada toda a desigual configuração piramidal dos atos de poder.

“Triângulo da tristeza” é um termo utilizado por esteticistas para fazer referência à região do rosto, localizada entre a testa, o nariz e os olhos, constantemente articulada pela exteriorização de sentimentos, que acaba por desenvolver rugas de expressão e marcas do tempo. Consequentemente, é também foco central das selfies e das buscas por procedimentos e cirurgias plásticas. Além disso, o título do filme também faz uma óbvia brincadeira com o lendário Triângulo das Bermudas e suas embarcações desaparecidas.

O longa é dividido em três partes. Na primeira, o público é apresentado a Carl (Harris Dickinson, de Um Lugar Bem Longe Daqui, 2022) e Yaya (Charlbi Dean, de Raio Negro, 2018, atriz sul-africana falecida precocemente), um casal de jovens modelos que vive um relacionamento de aparências, mantido unicamente para agradar seguidores e multiplicar os lucros da garota como influencer. Logo de cara, os dois protagonizam uma prolongada discussão, ancorada em falsos argumentos que questionam as convenções de gênero, o que já dá o tom do que viria pela frente.

Na segunda parte, os namorados embarcam em um cruzeiro de luxo, acompanhados de uma gama de milionários excêntricos, regado a champagne e Evian, recheado de Nutella e pratos instagramáveis, e comandado por um capitão marxista (Woody Harrelson, de Venom – Tempo de Carnificina, 2021). Na terceira e última fase, com os passageiros isolados em uma ilha, despidos de suas cascas burguesas e entregues a suas próprias essências, surge uma nova ordem.

Inegável que a película tem boas sacadas e traz à tona debates importantes. Porém, acaba pecando muito pela ausência de sutileza. A grande dificuldade da ironia é saber dosar a acidez, é ter o pleno domínio dos elementos disponíveis para conseguir desferir o golpe sem ser notado. Östlund, assim como a sua câmera na escatológica cena do jantar, não faz questão nenhuma de se manter em equilíbrio, e o resultado é um filme polêmico, corrosivo, mas muito abaixo de outras sátiras sociais exaltadas pela Academia recentemente, como Corra! (Get Out, 2017) e Parasita (Gisaengchung, 2019), por exemplo.

Em tempos de superficialidade, é possível dizer que Triângulo da Tristeza naufraga no raso, mas serve como fonte de risos nervosos e de ridicularização de uma elite cafona, que vende merda e armas para sustentar seus mimos e poder vomitar futilidades nas telas de seus iPhones.

O diretor comanda seu elenco no navio

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Mostra de Cinema de Tiradentes exibe Amazônia, a Nova Minamata?

por Laís Simão

Em 21 de agosto de 2012, Jorge Bodanzky foi entrevistado pelo inesquecível Antônio Abujamra em seu programa Provocações, transmitido pela TV Cultura em rede nacional. Quando o entrevistador questiona sobre a maior transgressão que o diretor já praticou, e ainda o estimula a dizer verdade, ou o público pensaria os piores tipos de transgressão, Bodanzky responde que é fazer cinema. “Fazer cinema é um ato de transgressão. Porque se a arte não for transgressora, ela não tem sentido”.

Na constante busca desse sentido, onze anos depois, no interior de Minas Gerais, entre as serras mineiras, enquanto a chuva fina molhava as típicas casas coloniais da famosa Rua Direita, aconteceu a 26ª Mostra de Cinema de Tiradentes, que teve como temática o Cinema Mutirão. O tema veio da necessidade do esforço coletivo para construção de novas bases e a importância do reforço das já consolidadas estruturas do audiovisual brasileiro. A escolha do termo “mutirão” endossa a importância do coletivo, de modo que essa reconstrução se daria a partir da junção de forças em um contexto de precariedade, após o apagamento das instituições culturais e das políticas de fomento e incentivo ao cinema e à cultura nos últimos anos.

Com esse ímpeto, agora com 60 anos de cinema e 80 anos de vida, foi exibida na Mostra a mais recente obra de Bodanzky, o documentário Amazônia, a nova Minamata? (2022). Fugindo na estética “docudrama”, a fronteira entre documentário e ficção, traço frequente do diretor de Iracema – Uma Transa Amazônica (1974), o filme pretende demonstrar a relação entre os sintomas neurológicos apresentados pelo povo Munduruku e a contaminação por mercúrio, utilizado de forma indispensável e irresponsável pelo garimpo na região. Ainda, como a interrogação é enfatizada no próprio título, pretende questionar as semelhanças entre os acontecimentos na região amazônica e o desastre vivenciado pela comunidade japonesa em Minamata, severamente envenenada por mercúrio em 1954.

O projeto tomou forma quando o Bodanzky gravava a série Transamazônica – Uma Estrada Para o Passado” (disponível na HBO Max, 6 capítulos de 60min cada), em Jacareacanga, no Pará. A região é território da comunidade indígena Munduruku e, em meio às gravações, o diretor se deparou com uma grande assembleia de caciques, que discutiam sobre as barragens construídas na região. O que deu destaque à reunião das lideranças indígenas foi a presença de um médico, demonstrando eventual crise de saúde ou sanitária na região.

O território Munduruku está situado em regiões ricas em ouro, atraindo o garimpo ilegal para o local. Diante do adoecimento da população, as próprias lideranças solicitaram auxílio da Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz) para que investigassem o que estava acontecendo. Após análise dos sintomas, foi constatada uma grande demanda por cadeira de rodas, além de constante comprometimento neurológico, levando à desconfiança quanto às consequências de contaminação por mercúrio, substância utilizadas pelos garimpeiros na extração de ouro.

Acontece que esse mesmo quadro foi identificado na década de 50 em Minamata, uma pequena cidade no Japão. De forma irregular, uma indústria de plástico lançava dejetos contendo a mesma substância tóxica na baía que circundava a região, contaminando a biodiversidade local desde 1930. No entanto, apenas duas décadas depois, em 1956, foi constatado o primeiro caso de contaminação humana, demonstrando uma certa lentidão entre a contaminação dos rios e o aparecimento do primeiro sintoma. Embora o primeiro caso tenha demandado um longo período de tempo, logo a questão se tornou pandêmica, afetando diversos japoneses que viviam na região. A alta contaminação culminou para que a doença fosse conhecida como o “Mal de Minamata”.

O garimpo ilegal na região amazônica repete o mesmo padrão da indústria de plástico japonesa. Não se trata, pois, de mera semelhança sintomática, vez que a pesquisa realizada pela Fiocruz constatou a presença de mercúrio no sangue munduruku acima dos limites normais, bem como a contaminação dos rios da região. Portanto, a finalidade do documentário é a de alerta, sabendo que se trata de uma história repetida e que, diferente do Japão, novas medidas podem ser tomadas a fim de impedir outro desastre.

De uma sensibilidade incrível, 75 minutos de fotografia impecável que te leva a pisar em solos amazônicos, o documentário se tornou um instrumento poderoso, como uma voz aos indígenas após os últimos anos de invisibilização. Bodanzky, com essa obra, materializa um dos seus mais importantes trabalhos artísticos, não apenas pela transgressão anunciada dez anos antes, mas porque verdadeiramente entende que o Cinema é instrumento da sociedade civil organizada. Como um manifesto, não só de proteção aos indígenas, mas uma forma de reafirmar algo aparentemente esquecido nos últimos anos: a Amazônia é do Brasil e precisa ser preservada.

Representantes dos Mundurukus protestam contra o garimpo ilegal

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