A Baleia conta com muito mais que ótimas interpretações

Quem achou que o máximo que o diretor Darren Aronofsky iria bagunçar a cabeça do espectador era com Réquiem para Um Sonho (Requiem for a Dream, 2000) estava enganado. Se precipitou. Chega aos cinemas essa semana A Baleia (The Whale, 2022), uma história muito bem contada e extremamente bem atuada que deve arrancar lágrimas do mais frio dos corações. E ainda marca a volta de Brendan Fraser aos holofotes, coberto de elogios e com vários prêmios.

Adaptando sua própria peça, o roteirista Samuel D. Hunter trata de vários assuntos espinhosos de uma vez só e com tamanha sensibilidade que consegue amarrar todas as pontas e nos apresentar a personagens críveis, pelos quais nos afeiçoamos de cara. Paternidade, homossexualidade, religião, redenção, amadurecimento, luto, depressão… Parece muita coisa para abarcar, mas Hunter faz uma mistura sadia e envolvente e Aronofsky nos conduz com maestria ao final dessa jornada.

Fraser, lembrado pelas aventuras da Múmia (1999, 2001 e 2008) e comédias como George, o Rei da Floresta (George of the Jungle, 1997 – abaixo) e Endiabrado (Bedazzled, 2000), nunca desapareceu totalmente, mas passou a fazer filmes e séries menos badalados e, para boa parte do público, sumiu. Seu talento não era segredo para ninguém, podendo ser atestado em longas como Deuses e Monstros (Gods and Monsters, 1998) e O Americano Tranquilo (The Quiet American, 2002).

A interpretação do ator em A Baleia é realmente digna de colocá-lo no topo do talento hollywoodiano. Com uma maquiagem pesada para torná-lo exageradamente obeso, ele vive Charlie, alguém que claramente tem muitos problemas psicológicos, que vamos conhecendo ao longo da sessão. Dá grande agonia acompanhar a rotina de Charlie, ele tem dificuldade com coisas cotidianas devido ao seu tamanho. Pegar algo no chão, por exemplo, é uma tarefa ingrata. Com contato apenas com uma amiga que serve de enfermeira (Hong Chau, de O Menu, 2022), resta a ele se dedicar ao trabalho.

Seu mundinho sofre um terremoto quando sua filha adolescente (Sadie Sink, de Stranger Things) resolve procurá-lo depois de anos sem contato. Charlie não parece se importar consigo mesmo, como se não merecesse ser feliz. Ou mesmo viver. Quase como um Despedida em Idaho – lembrando do personagem de Nicolas Cage em Despedida em Las Vegas (Leaving Las Vegas, 1995). E, como Cage, Fraser deve levar o Oscar de Melhor Ator.

Além do ator principal, todo o elenco de A Baleia é ótimo. Chau (acima) também emplacou uma indicação ao Oscar (como Melhor Atriz Coadjuvante). Sink faz uma adolescente atormentada na medida certa. Acreditamos naquela revolta, ela de fato tem motivos, e qualquer exagero é evitado. Ty Simpkins, o Dalton da franquia Sobrenatural (Insidious), faz um missionário religioso e acerta na composição. E temos ainda a fantástica Samantha Morton (de Cosmópolis, 2012), que faz muito em pouco tempo de cena. O roteiro e os diálogos criados por Hunter facilitam bem o trabalho de todos os envolvidos.

É uma injustiça que A Baleia tenha sido indicado ao Oscar apenas nas duas categorias de atuação e na de Maquiagem e Cabelo. Roteiro e Direção seriam outras duas categorias a serem honradas, além até da Trilha Sonora de Rob Simonsen, tocante sem ser invasiva ou piegas. Mesmo em um espaço restrito, a fotografia de Matthew Libatique, constante colaborador de Aronofsky, é bem sucedida, explorando bem os cômodos e reforçando a impressão de restrição que Charlie vive. São muitos pontos positivos compondo essa bela obra.

Dentre os vários pontos positivos de A Baleia, Fraser é o que mais tem chamado atenção

Sobre Marcelo Seabra

Jornalista e especialista em História da Cultura e da Arte, é atualmente mestrando em Design na UEMG. Criador e editor de O Pipoqueiro, site com críticas e informações sobre cinema e séries, também tem matérias publicadas esporadicamente em outros sites, revistas e jornais. Foi redator e colunista do site Cinema em Cena por dois anos e colaborador de sites como O Binóculo, Cronópios e Cinema de Buteco, escrevendo sobre cultura em geral. Pode ser ouvido no Programa do Pipoqueiro, no Rock Master e nos arquivos do podcast da equipe do Cinema em Cena.
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