
São tantos os livros de Stephen King adaptados ao Cinema todos os anos que sobra até para Richard Bachman, o pseudônimo falecido. Na década de 70, o escritor adotou o outro nome para não saturar o mercado, podendo assim lançar mais de um livro por ano, além de testar seu talento, vendo se conseguia vender sem o seu já estabelecido nome por trás. Pois a proposta, agora, chegou ao cinema, com dois filmes recentes baseados em livros assinados por Bachman. Só que, na ficha técnica, no entanto, consta King como o autor: ele realmente vende mais.
A Longa Marcha (The Long Walk, 2025) é um filme aparentemente simples, com um orçamento baixo para os padrões de blockbusters (U$20 milhões), que consegue um resultado muito bom. Apostando nas relações entre os personagens, o roteiro revela no conta-gotas o que precisamos saber sobre eles para nos importarmos, e logo temos nossos favoritos.

Seguindo um tema pouco explorado na época, que ganhou muita força nos anos 2000, King escreveu sobre um futuro (próximo) no qual uma crise econômica quebrou os Estados Unidos e o país promove anualmente uma disputa, selecionando um candidato de cada um dos 50 estados para a Longa Marcha. Eles saem caminhando e precisam manter o ritmo, ou recebem advertências. Na terceira, são executados pelos militares que acompanham a prova. A ideia é promover a bravura dos inscritos, que serviriam como exemplos para os cidadãos empobrecidos em casa que não viam uma luz no fim do túnel.
O diretor, Francis Lawrence, tem experiência com o tema, trazendo em seu currículo quatro longas da franquia Jogos Vorazes, além de Eu Sou a Lenda (I Am Legend, 2007). E o roteiro é de J.T. Mollner, mesmo nome que escreveu o surpreendente Desconhecidos (Strange Darling, 2023). No elenco, Cooper Hoffman (de Licorice Pizza, 2021) lidera um grupo menos conhecido, mas muito eficaz – e você deve reconhecer o eterno “Jojo Rabbit” Roman Griffin Davis. Do outro lado, liderando os fascistas executores, ninguém menos que Mark Hamill, o próprio Luke Skywalker, que dá o peso necessário ao misterioso Major.
A outra grande estreia da temporada que traz o nome de King (onde deveria constar Bachman) é O Sobrevivente (The Running Man, 2025), nova adaptação do livro de 1982. O diretor e roteirista Edgar Wright é responsável por bons filmes, como Todo Mundo Quase Morto (Shawn of the Dead, 2004) e Noite Passada em Soho (Last Night in Soho, 2021). Ao mesmo tempo, assina obras duvidosas, como Scott Pilgrim (2010) e Baby Driver (2017). Infelizmente, esse novo trabalho cai na segunda turma, com saídas e soluções bem fracas que, desde o início, deixam claro a preguiça dos roteiristas (Wright e Michael Bacall, também de Scott Pilgrim).

O filme começa mostrando (sem querer) que Ben Richards não era um bom funcionário, e ao mesmo tempo a empresa não dava boas condições de trabalho. Mostrando o sujeito como um coitadinho, vítima do sistema, acompanhamos sua luta para conseguir um paracetamol para a filha, que arde em febre. Parecendo sem saída, Richards aceita participar do programa espetaculoso The Running Man, no qual ele e mais dois candidatos devem sobreviver um mês sendo caçados por psicopatas mascarados contratados da Rede. E qualquer cidadão de bem que queira treinar a pontaria e ganhar um dinheiro.
O longa é bem mais fiel ao livro que a primeira adaptação levada aos cinemas, de 1987, que tinha Arnold Schwarzenegger como Richards. O personagem funcionava muito mais como um militar rebelde que se recusou a cumprir ordens fascistas. O atual, vivido pelo simpático Glen Powell (de Twisters, 2024), demonstra ter habilidades e consegue proezas que nenhum pai de família comum conseguiria. Se o programa, em 1987, era restrito ao prédio da Rede, agora é no mundo, o que torna as coisas para Richards muito mais difíceis. Ou, ao menos, deveria.

Dá para perceber, nas entrelinhas, que a intenção de Wright era fazer um filme divertido, mas aproveitar para fazer algumas críticas. Todas cabíveis, é bom afirmar. O programa força a barra de várias formas e o público compra as ideias facilmente. Tudo é deturpado via Inteligência Artificial, algo que já acontece hoje, e todos acreditam cegamente. Richards é pintado da forma que interessa aos executivos do canal, e isso torna o produtor Dan Killian (Josh Brolin, de A Hora do Mal, 2025) mais poderoso que o presidente de um país. O problema é que tudo isso é mostrado superficialmente e mal amarrado, parecendo o trabalho de um adolescente afobado.
A Longa Marcha e O Sobrevivente são duas histórias passadas em futuros distópicos, que ressaltam a espetacularização da miséria e mostram como o mundo ruma facilmente aos braços do fascismo quando a situação econômica não está boa. É muito fácil acreditar numa fala de crescimento e abundância quando não se tem nada, nem esperança. E os dois filmes atingiram quase o mesmo resultado nas bilheterias: pouco mais de US$60 milhões. A diferença é que A Longa Marcha faturou três vezes o seu orçamento, enquanto O Sobrevivente está longe dos US$110 milhões gastos.

Mark Hamill reforça o elenco de A Longa Marcha






































