Emily Blunt não salva A Garota no Trem

por Marcelo Seabra

The Girl on the Train banner

Se tem um tipo de filme irritante de se assistir, é aquele que tenta te enganar. Não de uma forma inteligente, claro. Quando é um Sexto Sentido (The Sixth Sense, 19999) da vida, ótimo, você quer até assistir de novo para tirar a limpo as situações. Mas quando é um A Garota no Trem (The Girl on the Train, 2016), você só quer esquecer a experiência e tomar uma dose de vodka. Até porque a bebida parece ser a vilã do filme.

Baseado no livro de Paula Hawkins, o roteiro de Erin Cressida Wilson (do fraco Homens, Mulheres e Filhos, 2014) nos apresenta a uma mulher que é a notória bêbada da região e que, devido ao álcool, tem apagões e precisa que os outros a lembrem do que fez. Diariamente. E é impressionante o que Emily Blunt (de O Caçador e a Rainha de Gelo, 2016) consegue fazer com um papel tão antipático e pouco crível. A atriz demonstra realmente estar naquela situação, dando um pouco de dignidade para sua Rachel. Só passa pela cabeça o show que ela poderia dar com um texto melhor. E menos vodka.

The Girl on the Train Blunt

A falta de sentido do roteiro continua no fato de Rachel conseguir ver bem, em detalhes, o que acontece na vizinhança quando passa de trem. Não sabemos direito para onde ela vai ou o que faz, mas todos os dias ela pega o trem na cidade onde mora e ruma a Nova York. A melhor parte de seu dia parece ser a ida e a volta, quando olha ao redor e inventa histórias para as pessoas que vê. Quando uma dessas personagens some, ela se envolve, mesmo sem ter nada a ver com o peixe. Além de alcoólatra e vazia, ela é enxerida, e seus repetidos lapsos de memória não ajudam em nada.

Por causa dessa costura entre os fatos, o filme até consegue ser interessante em alguns momentos. Mas, quando mais situações são jogadas convenientemente, tudo parece desandar. No final, só queremos que termine e nem nos importamos que várias pontas fiquem soltas. Um roteiro cujo mistério depende da falta de memória da protagonista e da burrice de outros colegas não pode dar muito certo. Nas mãos de Tate Taylor, culpado por Histórias Cruzadas (The Help, 2011), é que não faria sentido mesmo. E há ainda outro agravante: as idas e vindas temporais. Parece que o simples fato de bagunçar a cronologia vai tornar as coisas mais interessantes. O resultado é confuso e mal conseguimos acompanhar esses saltos.

The Girl on the Train FergusonAlém de Blunt, o elenco tem outras duas atrizes que são propositalmente parecidas, e isso pode causar confusão. Rebecca Ferguson (de Missão Impossível: Nação Secreta, 2015 – ao lado) vive a atual esposa do ex-marido de Rachel, e ela ficou loira exatamente para que possamos confundi-la com Haley Bennett (de Sete Homens e Um Destino, 2016), a garota vista pela janela do trem. Temos ainda Allison Janney (de Mom), Laura Prepon (de Orange Is the New Black) e uma ponta de Lisa Kudrow (a Phoebe de Friends). No time masculino, o bom Justin Theroux (de The Leftovers) tenta se salvar com pouca coisa para trabalhar; Luke Evans (de Velozes e Furiosos 7, 2015) foi escalado por ter um abdômen malhado; e Edgar Ramírez (de Joy, 2015) é outro que não tem muito o que fazer.

Pela participação dos personagens, percebemos que as mulheres têm muito mais importância para a trama. Se fossem mulheres fortes e independentes, seria uma boa exceção num oceano de coitadinhas que vemos por aí no Cinema. Mas essas mulheres são exatamente isso: donzelas em perigo, fracas, que dependem de seus parceiros. A começar pela obsessão de Rachel por Tom (Theroux), que agora é o porto seguro de Anna (Ferguson). A trama falsamente intricada pode pegar parte do público. Mas não é mais do que outro desserviço de Tate Taylor para o feminismo e para a sétima arte.

Rachel não supera o divórcio

Rachel não supera o divórcio

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O Contador é ponto positivo para Ben Affleck

por Marcelo Seabra

The Accountant banner

Se já não bastasse ser o Demolidor e o Batman no Cinema, Ben Affleck ainda é O Contador (The Accountant, 2016). Mesmo não sendo propriamente um super-herói, nem mesmo um herói, este é o mais interessante dos três. O filme parte de alguns clichês para logo utilizá-los de maneira inteligente, chegando até a confundir o espectador, que mal pode esperar pela próxima peça do quebra-cabeça. Quando chegamos ao final, tudo se encaixa, faz sentido e é bem satisfatório.

O roteiro de Bill Dubuque (de O Juiz, 2014) nos apresenta a Christian Wolff (Affleck), um sujeito que tem um grau de autismo que lhe proporciona grande facilidade com números, mas traz alguns problemas de sociabilidade. A falta de jeito dele proporciona alguns momentos involuntários de humor que lembram Dexter, o psicopata da TV que se esforçava para sorrir para fotos. Ele trabalha como contador e seus clientes são, em sua maioria, criminosos perigosos. Ele, por assim dizer, lava a roupa suja deles. A grande habilidade em lutas e com armas permite a ele se defender de qualquer possível ataque, ou queima de arquivo. Todas essas informações são devidamente apresentadas e o personagem é bem construído.

The Accountant Affleck

Com o Departamento do Tesouro investigando de perto, Wolff busca um cliente legítimo para afastar suspeitas. Pessoas começam a serem mortas e ele precisa descobrir o que está havendo. No meio disso tudo, conhecemos um punhado de gente e uma das melhores qualidades do longa fica evidente: o elenco. Além de Affleck, temos Anna Kendrick (de A Escolha Perfeita 2, 2015), J.K. Simmons (de O Exterminador do Futuro: Gênesis, 2015), Jon Bernthal (o Justiceiro do Netflix), Jeffrey Tambor (de Transparent), Cynthia Addai-Robinson (de Arrow) e John Lithgow (de Interestelar, 2014). Conhecemos o suficiente de cada um deles para que o projeto funcione, e nada é simples como preto e branco.

Nos pequenos detalhes que o roteiro faz questão de apresentar, conhecemos melhor a cabeça de Wolff e seu comportamento nunca deixa de fazer sentido. Ele usa uma canção infantil para manter a calma, precisa terminar tudo que começa, tem suas coisas extremamente organizadas e está sempre pronto para uma possível fuga. Ao ajudar a colega contadora vivida por Kendrick, ele sai de seu modus-operandi e arrisca seu pescoço, algo totalmente novo para ele. Uma cena do início, em que vemos um quebra-cabeça faltando uma peça para ser completo, serve bem como metáfora para o filme, e só chegamos a essa peça ao final.

A montagem ágil é cortesia de Richard Pearson, que trabalhou também em A Supremacia Bourne (The Bourne Supremacy, 2004). O Contador tem características em comum com o universo de Bourne e isso certamente foi assunto entre os amigos Affleck e Matt Damon. A trilha discreta de Mark Isham (de Assassino a Preço Fixo 2, 2016) e a bela fotografia de Seamus McGarvey (de Peter Pan, 2015) ajudam a criar um clima de suspense muito adequado à trama, tudo muito bem amarrado pelo diretor Gavin O’Connor (de Guerreiro, 2011).

Simmons quer resolver um último caso antes de se aposentar

Simmons quer resolver um último caso antes de se aposentar

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Terror faz bom uso da tábua Ouija

por Marcelo Seabra

Ouija Origin

Depois de um primeiro filme bem ruim sobre o jogo de tabuleiro, é compreensível que muitos não dariam confiança a este Ouija: Origem do Mal (Ouija: Origin of Evil, 2016). Como o diretor se mostrou um artista interessante, ao menos algo no projeto soava atraente. E o resultado surpreende exatamente por isso: Mike Flanagan consegue fugir do usual e entrega um bom filme. Fora uns escorregões, é tudo muito calculado e comedido, e os sustos acontecem da forma correta, sem gatos pulando ou trilha alta.

Caso raro, esta é uma pré-sequência que não só dispensa o anterior como funciona melhor se você não tiver assistido a ele. Em Ouija: O Jogo dos Espíritos (Ouija, 2014), um grupo de amigos investiga a morte de uma garota e eles descobrem que tem algo a ver com o tabuleiro Ouija, que virou um famoso jogo da Hasbro. Faz sentido o enfoque no jogo porque a própria empresa que o produz ajudou a bancar a produção. Apesar do resultado duvidoso, o longa faturou 20 vezes o seu orçamento de cinco milhões e uma continuação era certa. A boa jogada dos produtores foi convocar um diretor mais competente que pudesse trazer um toque particular.

Ouija cast

O fraco O Sono da Morte (Before I Wake, 2016) pode ter deixado um pé atrás com relação a Flanagan. Mas o diretor e editor, novamente assinando um roteiro com o parceiro usual Jeff Howard, tem mais sucesso dessa vez. Lembrando as franquias de James Wan (Invocação do Mal e Sobrenatural), o filme explora bem os cantos e segredos de um casarão para contar a história de uma mãe e suas filhas. Pouco após um acidente de carro que levou o marido, Alice Zander (Elizabeth Reaser, de Crepúsculo) sobrevive atendendo como vidente, convencendo os clientes de que tudo é verdade com a ajuda das filhas. A adolescente Lina (Annalise Basso, de O Espelho, 2013, também de Flanagan) ficou um pouco rebelde após a morte do pai, enquanto a mais novinha, Doris (Lulu Wilson, de Livrai-nos do Mal, 2014), parece não ter entendido direito a perda devido à pouca idade.

Como já vimos em outras produções, não se brinca com espíritos impunemente. Logo, a família vai descobrir o preço a se pagar. E o diretor da escola das meninas, o Padre Tom (Henry Thomas, de Big Sur, 2013), acaba entrando no meio estranhando a mudança de comportamento da pequena. O trabalho de Thomas é competente, ele foi até escalado para o próximo projeto do diretor, Jogo Perigoso (Gerald’s Game). O mesmo vale para Reaser, uma mãe inteligente que busca o melhor para as filhas. Mas são as duas mais novas que chamam a atenção. Ambas têm grande facilidade para pular entre emoções. Wilson consegue nos fazer ver o capeta em sua carinha angelical e tem um monólogo sobre enforcamento que é no mínimo angustiante.

Dentre muitos filmes baseados em jogos de tabuleiro, este Ouija: Origem do Mal parece ser o mais bem sucedido. E, ao contrário do episódio anterior, ele não foca exatamente no tabuleiro, mas o utiliza para fazer a história andar. É por causa dele que tudo acontece, sua relevância para a trama é incontestável. Mas são os personagens que importam, e o roteiro toma tempo para desenvolvê-los, tornando possível ao espectador torcer por eles. Dependendo da arrecadação nas bilheterias, continuaremos torcendo por mais algum tempo.

A tradicional tábua, ou jogo do copo, é um jogo popular

A tradicional tábua, ou jogo do copo, é um jogo popular

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Sequências de ação povoam os cinemas

por Marcelo Seabra

Purge 3Mechanic 2Em cartaz nos cinemas, temos duas continuações nas quais falta originalidade, interesse e até sentido. Mas não faltam tiros, mortes e correria. A franquia Uma Noite de Crimes (The Purge) pode ter chegado à sua parte final com 12 Horas Para Sobreviver: O Ano da Eleição (The Purge: Election Year, 2016). E o carisma de Jason Statham garantiu uma sobrevida a um de seus longas mais interessantes, Assassino a Preço Fixo (The Mechanic, 2011), com esse A Ressurreição (Mechanic: Resurrection, 2016). Enquanto um soa como uma progressão natural, o outro é claramente uma forma de arrancar mais dinheiro do público.

Escritas e dirigidas por James DeMonaco, as três partes de The Purge conseguem ter unidade e lógica. O conceito é interessante: uma noite por ano, num futuro não muito distante, todo tipo de crime é liberado e os serviços de atendimento são suspensos. Nessas ocasiões, teoricamente, os cidadãos devem ir às ruas extravasar, colocando para fora toda a violência que guardam. Primeiro (2013), acompanhamos o drama de uma família atacada dentro de casa. Depois (2014), partimos para a loucura das ruas, onde todos estão armados e preparados para matar ou morrer. A cada minuto, temos uma noção melhor do evento e de tudo o que acontece durante.

The Purge: Election Year

Nessa terceira parte, a ação toma outra dimensão e invade o mundo da política. Imagine que loucura seria não precisar reunir vários caciques de partidos ameaçados, comprar a mídia e bolar um golpe de estado para tirar alguém do caminho. Bastaria aproveitar essa única chance anual para simplesmente eliminar a figura. Leo Barnes (Frank Grillo), o sargento que conhecemos no episódio anterior, está de volta, agora como segurança particular da senadora Charlie Roan (Elizabeth Mitchell, de Crossing Lines). Entre outras medidas impopulares entre seus pares, a senadora pretende acabar com a noite da expurgação, observando que ela tem sido usada para eliminar os pobres e necessitados da sociedade.

O ponto de partida é bem promissor, mas o rumo acaba sendo repetitivo. Eles precisam resistir a doze horas de perseguições, quando quase todos à volta parecem trabalhar contra. Sempre em cenários noturnos, urbanos e sujos, o filme nos dá uma boa ideia da geografia e acompanhamos a fuga claramente. Barnes insiste em ser rabugento e desconfiado, enquanto Roan é a personificação da política que todos gostaríamos que estivesse à frente do Planalto. Estereótipos misturados, algumas situações previsíveis e temos um longa correto, sem nenhum grande momento. E a distribuidora ainda ajuda colocando esse título inexplicável e acabando com a identidade da série, talvez para não afastar quem não viu os primeiros.

Mechanic 2 Statham

O outro exemplar do cinemão americano traz Statham novamente como Arthur Bishop, que conhecemos na refilmagem de um trabalho de Charles Bronson de 1972. Bishop é um assassino contratado para simular acidentes. Suas vítimas não podem simplesmente ser assassinadas, tudo deve parecer natural. O primeiro filme é bem acabado e tem uma trama envolvente, além dos malabarismos de Bishop. Tiveram que fazer um esforço hercúleo para bolar uma situação que tirasse o sujeito da aposentadoria que ele se impôs. E aí começa o problema: uma garota é usada de isca, revela o plano para ele e, mesmo assim, ele morde. Daí em diante, é só chute e situações implausíveis.

A exemplo de James Bond, ou até de um Robert Langdon, Bishop viaja em tempo recorde entre algumas paisagens lindas para realizar seus trabalhos, todos tidos como impossíveis. Os vilões e capangas têm uma mira horrível, ao contrário do nosso herói. E vamos acompanhando no piloto automático. Nem a beleza de Jessica Alba (de A Seita, 2016) ajuda, já que atuar não é dos seus fortes. Michelle Yeoh (de O Tigre e o Dragão: A Espada do Destino, 2016), bem mais competente, não tem oportunidade para fazer muita coisa, assim como Tommy Lee Jones (de Jason Bourne, 2016).

Entre Mercenários e Velozes & Furiosos, Jason Statham anda precisando de uns projetos bacanas. Com todos esses exageros, Assassino a Preço Fixo 2 consegue ser cansativo, a última coisa que esperamos de um trabalho com o ator. Se, no cinema, a dúvida estiver entre ele e 12 Horas Para Sobreviver, a escolha é bem óbvia.

Difícil pensar em um casal mais improvável

Difícil pensar em um casal mais improvável

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Time Lapse é boa opção na Netflix

Time Lapse poster

Mais um filme que aborda o enigma das viagens no tempo, assunto que sempre desperta curiosidade, indagação e imaginação. Intervalo de Tempo (Time Lapse, 2014) trata desse assunto de uma forma peculiar, porém não inédita. Não há propriamente uma viagem no tempo, mas temos imagens que preveem o futuro. O longa está disponível no catálogo da Netflix, aparentemente a única forma que conseguiu para chegar ao público brasileiro. E o título original é mais evidenciado.

Com um elenco pequeno e um cenário menor ainda, o filme nos apresenta a três jovens, o casal Finn (Matt O’Leary, de O Cavaleiro Solitário, 2013) e Callie (Danielle Panabaker, das séries Arrow e Flash) e o amigo Jasper (George Finn, de Lola, 2012), que moram juntos em um casa de um condomínio pacato. Eles descobrem que estão sendo monitorados pelo vizinho, que utiliza uma câmera fotográfica gigante virada para a sala da casa do trio. Até aí, poderia se tratar simplesmente de um tarado sem o que fazer, mas não é bem assim. Logo no início, descobrimos que a máquina registra flashes do futuro. Todos os dias, às 20h, ela tira uma foto tipo Polaroid que revela o que está acontecendo na sala no dia seguinte.

Time Lapse cast

Como Jasper já é habituado a fazer apostas, ele de cara pensa em aproveitar a máquina para ganhar dinheiro. Finn parece em um estado de conformidade extremo, se sustentando com o trabalho de zelador do condomínio e com bloqueio criativo para suas pinturas. E Callie busca se reaproximar do namorado, que mal conversa com ela. A oportunidade de ganhar dinheiro fácil, de maneira escusa, é uma ótima forma de testar relacionamentos, e é para isso que o recurso da ficção-científica acaba servindo. Com toda essa roupagem de tecnologia e suspense, o filme foca nas relações entre os três protagonistas.

Time Lapse agrada pela simplicidade com que é apresentado e mais ainda pela profundidade dos personagens. Entendemos melhor a relação do casal e a personalidade do amigo no decorrer da trama. No mínimo, ficamos curiosos para descobrir se o que estamos vendo é realmente a única verdade ou se existe alguma coisa a mais. Um ponto fraco é o vilão apresentado na trama, Ivan (Jason Spisak). Ele é uma espécie de “bicheiro” canastrão com um capanga incompetente com quem Jasper faz suas apostas. Como o jovem se aproveita das fotografias do futuro para ganhar muito dinheiro, logo atrai a desconfiança de Ivan, que quer entender a sorte repentina do cliente.

Com um final bastante satisfatório, não é o melhor filme de viagens no tempo, mas certamente é uma história surpreendente que foge do habitual. Ele marca a estreia de seus roteiristas, Bradley King e BP Cooper, sendo que o primeiro dirige e o segundo produz. Eles não parecem muito preocupados com os paradoxos temporais que geralmente surgem em histórias como essas. Mas conseguem arrematar de maneira instigante.

Time Lapse pics

 

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Professor Langdon volta aos cinemas com Inferno

por Marcelo Seabra

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Ler um livro de Dan Brown é como comer uma carne de terceira esturricada com um ótimo molho em cima. Parece bom, mas vai dar indigestão. E não seria diferente com as adaptações para o Cinema. A nova aventura a ganhar as telas é Inferno (2016), terceira a colocar o Professor Robert Langdon para decifrar pistas e salvar o mundo como o conhecemos. Mais do mesmo, mas ao menos alguém teve a ótima ideia de mandar o Tom Hanks cortar o cabelo.

Nas duas primeiras histórias, vimos exatamente a mesma coisa: um grupo tentando fazer algo ruim e o professor especialista em História e Arte fazendo deduções brilhantes, baseadas em sua bagagem acadêmica, para impedi-los. Ah, e Langdon sempre é incriminado ou desacreditado, e esclarecer os fatos torna-se ainda mais importante. O joguinho de quem é quem e quem é confiável permanece do início ao fim. Se o espectador é daqueles que gostam de solucionar o mistério antes da hora, a tarefa aqui se mostra inglória. Afinal, é preciso lembrar fatos, biografias e obras com riqueza de detalhes para chegar onde Langdon chega.

Se a primeira história (no Cinema, não nos livros) era toda construída em torno de um código baseado em Leonardo Da Vinci, agora é a vez do poeta Dante Alighieri, autor da Divina Comédia, estar nos holofotes. Obra-prima da literatura universal, o livro é dividido em três partes: Inferno, Purgatório e Paraíso. Dante, como protagonista de sua própria história, passa pelos três lugares e os descreve em detalhes. Dan Brown faz diversas referências ao Inferno, criando pistas que vão levar os personagens aonde eles devem ir para impedir que a Terra se torne um. Ou para fazer com que isso aconteça.

Inferno duo

Quando reencontramos o Professor Langdon (Hanks), sete anos após Anjos e Demônios (Angels and Demons, 2009), ele está em um hospital se recuperando de um trauma na cabeça. Com a ajuda da Dra. Brooks (Felicity Jones, de A Teoria de Tudo, 2014), ele tenta se lembrar do que houve e como ele chegou ali. Isso, em meio a uma perseguição, já que parece que querem a cabeça dele. A condição de desmemoriado coloca o professor na mesma situação do espectador, que descobre os fatos à medida que ele se lembra. Assim, a trama vai se costurando e descobrimos que um carismático milionário (Ben Foster, de Warcraft, 2016), por acreditar que a Terra não comportará a população que logo atingirá, cria uma doença que vai matar gente como nunca antes. As indas e vindas da memória de Langdon são bem convenientes, já que tudo acontece quando o roteiro demanda.

Temos, claro, cidades lindíssimas servindo como pano de fundo. Florença, por ser a terra natal de Dante, é bastante explorada. Podemos acompanhar vários de seus pontos turísticos, que Langdon visita à procura das tais pistas. O diretor de fotografia Salvatore Totino, mesmo das duas aventuras anteriores, aproveita ao máximo as belas paisagens por onde o longa passa. Outro que retorna é Ron Howard, comandando a ação de forma genérica, com tudo muito explicado e linear. Isso enfatiza os buracos do roteiro do irregular David Koepp (de Anjos), que não tinha muito como fugir do livro de Brown – que inclusive é um dos produtores do filme.

Do elenco, que ainda inclui Sidse Babett Knudsen (de Westworld) e Omar Sy (de Pegando Fogo, 2015), quem parece se divertir mais é Irrfan Khan (de Jurassic World, 2015), com um personagem que é igualmente inteligente e cínico. Os demais fazem o que precisam, sem muita chance de arroubos de genialidade. Quem destoa negativamente é Ana Ularu (de Serena, 2014), que fica o tempo todo com uma expressão de psicopata bravinha, o mais estereotipado possível. Com tudo muito engessado, coube aos envolvidos apenas seguir as instruções e colocar o cachê no bolso.

O escritor e produtor Brown e Khan nas filmagens

O escritor e produtor Dan Brown e Irrfan Khan nas filmagens

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Westworld expande o conceito de Crichton

por Marcelo Seabra

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Com dois episódios exibidos, já dá para tecer alguns comentários a respeito de Westworld (2016), nova série da HBO que pretende ajudar a tapar aquele vazio existencial que o fim da sexta temporada de Game of Thrones deixou. Em 1973, o escritor Michael Crichton teve a oportunidade de dirigir um filme e escreveu um roteiro original no gênero pelo qual é mais lembrado, a ficção-científica. Este conceito agora ganha nova vida no canal a cabo, que tem grande liberdade para tratar o material como ele merece ser tratado, não se importando com violência, nudez ou qualquer outro aspecto “adulto”.

No longa de 73 (abaixo), além de restrições de orçamento, desmandos do estúdio e limitações tecnológicas da época, observamos um certo atropelo, já que os quase 90 minutos de projeção não seriam suficientes para desenvolver todo o conceito. Crichton, autor também do livro e roteiro de Jurassic Park (1993), conseguiu fazer o filme mais lucrativo do ano da MGM, que deu origem a uma continuação e a uma série de televisão de vida curta. O casal Jonathan e Lisa Joy Nolan vislumbrou uma boa oportunidade de desenvolver melhor a história e a HBO concordou.

Westworld movie

Entre filme e série, há poucas similaridades, além do conceito. Os personagens são radicalmente diferentes, guardando apenas os estereótipos. Entre os convidados, os humanos que vão ao parque à procura de diversão, há uma dupla de extremos, com um certinho e um meio canalha. Entre os anfitriões, os andróides que circulam indetectáveis pelo Velho Oeste, há uma mocinha, um caubói psicopata e outros tipos. Eles devem proporcionar boas histórias para os convidados, que podem interagir com as máquinas como lhes convier. Contando com o máximo de segurança possível e a garantia de não sofrerem nenhum ferimento, os humanos podem atirar, torturar e até estuprar os robôs, tudo de forma muito convincente.

Assim como em Jurassic Park, onde os dinossauros saem do controle e causam mortes e estragos, podemos esperar uma rebelião andróide no parque do Velho Oeste. No longa de 73, era Yul Brynner que dava vida a um caubói robótico que começava a tomar decisões e colocava os convidados em risco. Vestido quase exatamente como seu Chris Adams de Sete Homens e Um Destino (The Magnificent Seven, 1960), Brynner se torna praticamente o único andróide desenfreado do parque. A série consegue desenvolver isso de forma brilhante, apresentando melhor cada personagem, seja ele humano ou não, e o próprio conceito ganha um tratamento adequado. Qual seria a conseqüência de brincar de Deus? Essa parece ser a questão central, ao invés de ser apenas um passatempo escapista e esquecível, como o filme foi.

Contando também com o Midas J.J. Abrams na produção, a série Westworld tem um primeiro episódio instigante. O público de sessões promocionais ajudou muito na campanha boca a boca, elogiando a atração como algo revolucionário. Muito foi apresentado sem explicações detalhadas, o que mostra confiança na capacidade e curiosidade do espectador. O segundo episódio já ajuda a esclarecer o conceito, para os não familiarizados, e o revela na prática, para aqueles em dúvida, por exemplo, de como os andróides seriam reparados, no caso de um tiroteio. Os frequentes problemas de programação causam recalls que mal podem ser notados pelos convidados, já que há vários anfitriões para se revezarem.

Westworld Ed Harris

No elenco da série temos nomes muito mais interessantes que os que vimos no filme. Hoje, James Brolin é mais lembrado como o pai de Josh, e o filho é extremamente mais talentoso que ele. E Richard Benjamin tem em Westworld seu provável papel de maior projeção, o que diz muito. Se os dois não são muito relevantes, não podemos dizer o mesmo de, por exemplo, Ed Harris (de Noite Sem Fim, 2015 – acima). Ameaçador e misterioso, seu “Homem de Preto” é sempre uma figura esperada. Evan Rachel Wood (de Tudo Pelo Poder, 2011) vai se firmando como uma das personagens mais importantes da série, além de uma das grandes atrizes de sua geração. Em meio a Jeffrey Wright, Thandie Newton, James Marsden, Sidse Babett Knudsen, Ben Barnes, Jimmi Simpson e Rodrigo Santoro, fica até difícil sobressair. Mas outro veterano merece destaque: Sir Anthony Hopkins (de Presságios de um Crime, 2015) traz um pouco do brilhantismo que todos conhecemos e que parecia perdido. Como o criador do parque, ele aparece pouco, mas sempre causa impacto.

Com um total de 10 episódios nessa primeira temporada, Westworld deixaria Crichton orgulhoso. Não só por ser algo bom baseado em um trabalho dele, mas por ser algo que expande e leva muito mais adiante seu argumento. Desde antes da exibição do primeiro episódio, a série já ocupava os postos mais comentados em redes sociais e esse status não deve mudar tão cedo. Jonathan e Lisa Joy provam mais uma vez que Christopher não é o único Nolan talentoso.

Hopkins, Wood, Newton e Wright são alguns dos nomes mais interessantes

Hopkins, Wood, Newton e Wright são alguns dos nomes mais interessantes da série

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Universo Marvel invade o Harlem de Luke Cage

por Rodrigo “Piolho” Monteiro

Luke Cage Banner

Criado por Archie Goodwin, John Romita Sr. e George Tuska para aproveitar a popularidade dos filmes voltados para a população urbana negra (os chamados blaxploitation) em 1972, por quase três décadas Luke Cage foi um personagem do quarto escalão da Marvel. Até que, no começo do século, passou a ter um destaque maior graças ao trabalho do roteirista Brian Michael Bendis, primeiro como coadjuvante de Alias (gibi solo de outra personagem que virou série na Netflix, Jessica Jones), e depois como integrante dos Vingadores. Desde então, Luke Cage não saiu mais dos holofotes. Depois de participar como um coadjuvante em Jessica Jones, eis que Luke estreia em sua própria série, cuja primeira temporada, a exemplo de todas as produções do Netflix, foi liberada toda de uma vez na última sexta-feira.

A exemplo do que acontece com os filmes da Marvel no cinema, Luke Cage segue uma cronologia própria, mas que deixa clara sua interdependência do que veio antes, tornando esse universo mais coeso. A série se passa pouco depois de Jessica Jones e da segunda temporada de Demolidor e mostra o que aconteceu com Luke após os eventos ocorridos em Hell’s Kitchen. Tentando fugir de tudo aquilo, Luke acaba indo parar no Harlem, bairro negro de Nova York, onde consegue emprego em uma barbearia e tenta passar despercebido. Seu plano, infelizmente, não demora muito a naufragar.

Luke Cage Cottonmouth

Quando a série começa, Luke (Mike Coulter, de The Following) se divide em dois empregos. Além da barbearia comandada por Pops (Frankie Faison, de Banshee), Luke também lava pratos na boate de Cornell “Boca de Algodão” Stokes (Mahersala Ali, de Jogos Vorazes: A Esperança, 2015 – acima), um gângster local que utiliza parte do seu dinheiro sujo para financiar a campanha de reeleição da prima Mariah (Alfre Woodard, de Capitão América: Guerra Civil, 2016) à câmara de vereadores de Nova York. Uma das formas de Boca de Algodão ganhar dinheiro envolve o tráfico de armas e é justamente quando uma dessas negociações dá errado e um dos protegidos de Pops é assassinado que Luke acaba sendo arrastado, totalmente a contragosto, para o submundo de corrupção e violência do Harlem. Aos poucos, a população local toma consciência de quem ele é e do que pode fazer e Cage pode dizer adeus à sua vida no anonimato.

Como era de se esperar, Luke Cage bebe bastante da fonte dos filmes de blaxploitation dos anos 1970 e tenta retratar o Harlem da forma que ele deve parecer para todos aqueles que não conhecem a região. A série mergulha na cultura negra especialmente no que diz respeito à trilha sonora, mas não se restringe a isso. Ao longo da temporada, vemos bastante do passado de Luke (destaque especial para o quarto episódio da série, que deixará os fãs de longa data bastante satisfeitos) e de como ele passa da posição de neutralidade para uma atuação ativa contra o que acontece de ruim em sua comunidade e as consequências que isso traz para ele e aqueles ao seu redor. Ou seja, nada muito diferente do que estamos acostumados a ver em filmes ou séries de heróis onde é necessário que uma história de origem seja estabelecida.

Luke Cage Coulter

Outro ponto a se destacar é a preocupação de produtores de apresentar mais personagens que terão importância no futuro da Marvel na Netflix. A policial Misty Knight (Simone Missick, de séries como Ray Donovan e Scandals), uma das responsáveis por investigar o tiroteio que acontece logo no começo da série, sempre foi uma personagem coadjuvante de relativa importância no universo de Luke Cage e já está confirmada tanto para a série do Punho de Ferro quanto para os Defensores, que reunirá Cage e Punho a Demolidor, Jessica Jones e possivelmente ao Justiceiro. Outra que dá as caras em Luke Cage e faz a ponte entre essa e as séries que a precederam é Rosario Dawson, reprisando o papel da enfermeira Claire Temple. Para aqueles que não se lembram, Claire foi uma personagem recorrente tanto nas duas temporadas do Demolidor quanto em Jessica Jones, o que meio que faz com que ela seja o elo principal entre as séries da Marvel na Netflix até o momento. Os roteiristas e produtores resolveram, inclusive, mostrar um pouco da origem de Claire aqui, introduzindo a personagem Soledad Temple, mãe de Claire, vivida pela atriz brasileira Sônia Braga (de Aquarius, 2016). É a personagem de Claire que situa Luke Cage em termos de cronologia, já que menciona fatos ocorridos tanto em Jessica Jones quanto na segunda temporada de Demolidor.

Ainda que totalmente diferente de Jessica Jones e mesmo de Demolidor, Luke Cage cumpre bem o papel de expandir o Universo Marvel no Netflix. Para os fãs do personagem, a série é um prato cheio; para aqueles que nunca haviam ouvido falar dele, é uma boa diversão e cria expectativas para o próximo ato – no caso, a série solo do Punho de Ferro, personagem cuja bibliografia está intrinsecamente ligada à de Luke Cage, já que ambos dividiram o mesmo gibi por bastante tempo na Marvel. É aguardar até 2017 para ver como isso tudo se desenrolará.

O visual clássico e o atual de Cage nos quadrinhos

O visual clássico e o atual de Cage nos quadrinhos

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Sequência tardia de Bridget Jones é grata surpresa

por Marcelo Seabra

Bridget Jones' Baby banner

Depois de ter passado por quase todos os perrengues possíveis da vida de solteira, Bridget Jones está de volta para enfrentar um daqueles tabus que parecem saídos das décadas passadas: ter um filho sem ser casada. Doze anos depois da fraca segunda aventura, a personagem aparece em O Bebê de Bridget Jones (Bridget Jones’s Baby, 2016), longa que retoma o bom humor do primeiro e funciona até para quem chegou agora na franquia. O pouco de informação prévia necessário é logo apresentado e situa todo mundo.

Nascida de uma coluna de jornal escrita anonimamente por Helen Fielding, a personagem ganhou um livro em 1996 e, no ano seguinte, após muita propaganda boca a boca, ele chegou aos mais vendidos e virou um grande sucesso. Em 1999, foi lançada a continuação e Jones chegou ao Cinema em 2001. Com um intervalo de apenas três anos do primeiro filme para o segundo, era de se esperar outro na sequência. Baixa bilheteria e muitas trocas na direção e roteiro impediram que isso acontecesse, inclusive afastando Hugh Grant de uma possível participação. Mas a longa espera fez bem ao projeto, essa terceira parte é bem mais interessante e engraçada que a anterior e conseguiu contar com a diretora do primeiro, Sharon Maguire.

Após ganhar peso e forçar um sotaque britânico, Renée Zellweger caiu nas graças do público como Bridget, mas não aparecia em qualquer coisa desde 2010. No meio do caminho, foi levantada a hipótese de que tenha havido uma cirurgia plástica, bastante comentada por ter alterado drasticamente o rosto da atriz, mas ela negou e disse apenas ter envelhecido. Contra todos esses percalços, ela voltou à personagem e já tem até outro trabalho engatilhado. Mais um nome importante do elenco, Colin Firth, está de volta, já que o filme não estaria completo sem o eterno interesse amoroso Mark Darcy.

Bridget Jones' Baby cast

Sempre muito atrapalhada e passando vergonha em grandes eventos, Bridget é produtora de um programa de TV e só tem a apresentadora como companheira de farra, já que todos os seus amigos estão casados, muitos com filhos. Em uma dessas saídas, ela passa a noite com um estranho bonitão (Patrick Dempsey, de Grey’s Anatomy). Pouco depois, reencontra Mark Darcy (Firth), que está se separando. Para quem estava com uma vida sexual inexistente, ela tem uma boa movimentada, mas aí vem o impasse: ao descobrir que está grávida, ela não sabe de quem é o bebê.

Com Maguire na direção e Emma Thompson (Oscar por Razão e Sensibilidade, 1995) reescrevendo o roteiro da própria Fielding, poderíamos esperar uma protagonista forte, independente, que busca uma companhia masculina apenas para adicionar, e não para completar. Bridget Jones é bem completa, e isso é algo fantástico de se ver. Com tantos filmes colocando grandes atrizes como coadjuvantes de luxo, escadas para os atores, é bom ver na tela uma mulher de verdade, que inclusive não se importa muito com a questão da paternidade. E o embate entre os dois rivais é ótimo, já que ambos parecem ser adultos responsáveis e não há nenhum tipo de apelação. Eles querem o melhor para a nova mamãe, sem nunca roubar os holofotes dela.

Três personagens críveis e interessantes interagindo não é algo que vemos todos os dias. Ainda mais com um deles sendo uma mulher como Bridget Jones. O elenco de apoio não deixa a dever, inclusive trazendo novamente os pais de Bridget, vividos por Gemma Jones e Jim Broadbent. A mãe simboliza o ranço de uma sociedade parada no tempo que criticaria uma mulher por ter um filho solteira, enquanto o pai é o porto seguro de sempre. Thompson também entra como atriz, fazendo a médica que acompanha o pré-natal – uma profissional competente, mas que ninguém gostaria de ter por perto, uma espécie de House de saias.

E já se vão 15 anos do primeiro filme

E já se vão 15 anos do primeiro filme

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Tim Burton nos apresenta a crianças bem peculiares

por Marcelo Seabra

Ms. Peregrine banner

Entre um filme correto que parece ser de um diretor qualquer (Grandes Olhos, 2014) e umas estranhezas com a cara dele e ruins (Sombras da Noite, 2012), Tim Burton parecia estar acertando apenas com animações (Frankenweenie, 2012), e mesmo assim era material recauchutado do início de sua carreira. Por isso, pode-se dizer que O Lar das Crianças Peculiares (Miss Peregrine’s Home for Peculiar Children, 2016) representa uma volta à boa forma, com uma história que mistura bem aventura, humor e morbidez, bem o que ele parece gostar.

Coletando fotografias antigas, o americano Ransom Riggs decidiu usá-las para contar uma história, mas foi persuadido por seu editor para usar uma narrativa mais tradicional. As fotos entraram como ilustração e ajudaram a narrar a saga de Jake Portman, um garoto que decide ir atrás das lendas contadas pelo avô falecido e descobre que era tudo real. Fãs do livro têm se manifestado contra as alterações que a obra sofreu ao chegar ao Cinema, mas isso só deve incomodar os mais xiitas. O resultado é algo próximo de um Peter Pan, uma trama infanto-juvenil divertida que nos apresenta às crianças peculiares do título.

Ms. Peregrine cast

É comum que fábulas tenham um fato triste como pano de fundo. A exemplo das Crônicas de Nárnia, aqui temos a Segunda Guerra Mundial e personagens que se mantêm protegidos dela. Outros temas adultos tratados são a perda, o envelhecimento e a solidão. Jake, o protagonista, é outro ótimo trabalho de Asa Butterfield, mais lembrado como o Hugo Cabret de Martin Scorsese. O garoto fica ainda mais solitário após a morte do avô (Terence Stamp, de Grandes Olhos), e a psicóloga o incentiva a visitar a ilha onde se passavam as histórias contadas pelo veterano. Com o pai (Chris O’Dowd, de Um Santo Vizinho), Jake vai até o país de Gales para descobrir o tal orfanato destruído por um bombardeio.

Não demora até o garoto descobrir que, em uma realidade paralela, ou uma fenda no tempo, a casa está intacta e lá moram todos os personagens narrados pelo avô, e ele sente como se já conhecesse todos eles. E todos já esperavam por ele. Como nem tudo são flores, Jake toma conhecimento dos etéreos, criaturas malignas que se alimentam de crianças peculiares. Valendo-se dos poderes de cada um, ele precisa ajudá-los a vencer a gangue do vilão, Barron (Samuel L. Jackson, de A Lenda de Tarzan, 2016). Claro que essa jornada vai ajudar a fortalecer a personalidade abalada de um jovem ignorado pelos pais e atacado pelo colegas.

Ms. Peregrine Green

Com um elenco que ainda conta com uma bela atuação de Eva Green (de Sin City 2, 2014 – acima) e participações especiais de gente do calibre de Allison Janney (da série Mom) e Judy Dench (a M de Skyfall, 2012), O Lar das Crianças Peculiares é o tipo de longa que agrada aos pais e aos filhos. Ao mesmo tempo em que o lar parece conservado pela fenda, ele não é exatamente novinho ou bem cuidado. Assim como o figurino das crianças, tudo parece levemente deteriorado, equilibrando luz e sombras. E esse é o forte de Burton: escapar dos extremos e circular entre o doce e o assustador. Nada é mórbido a ponto de espantar o público mais novo, mas também não é bonitinho.

Os poderes dos peculiares transitam bem nesses dois lados, e eles são bem desenvolvidos pelo roteiro – algo que a roteirista Jane Goldman tem experiência em fazer (por exemplo, em Kingsman, 2014, e X-Men: Primeira Classe, 2011). A riqueza de detalhes nos cenários é impressionante e a história casa tão bem com o estilo do diretor que parece ter sido escrita pelo próprio, como Burton afirmou em entrevistas no lançamento.

Algumas das fotos usadas no livro

Algumas das fotos usadas no livro

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