O Tempo e o Vento é a nova novela de Monjardim

por Marcelo Seabra

O Tempo e o VentoEm 1949, foi publicada a primeira parte de uma saga que seria a obra definitiva sobre a formação do estado do Rio Grande do Sul. O escritor Érico Veríssimo planejou nos mínimos detalhes a estrutura de O Tempo e o Vento, incluindo aí a ficcional Santa Fé, vila onde se passa boa parte da trama. Estes personagens clássicos voltam ao Cinema em uma produção muito bem cuidada da Globo Filmes, que mostra que o diretor Jayme Monjardim aprendeu várias lições com o desastroso Olga (2004). O problema é tentar abraçar o mundo, contando uma história longa em duas horas.

Assim como Veríssimo, os roteiristas incumbidos da adaptação são do Rio Grande do Sul, o que deve ter pesado na escolha. Como Monjardim é paulista, trouxe Tabajara Ruas e Letícia Wierzchowski para ajudá-lo na missão. Em frente às câmeras, poucos são nativos, o que tornou o trabalho de preparação mais árduo. O característico sotaque gaúcho, por exemplo, passa despercebido na maior parte do elenco. A exceção é Thiago Lacerda, que praticou bastante para dizer “minha prenda” com autenticidade. O esforço do ator é tamanho que até dá para perdoar certa artificialidade nos diálogos, e ele acaba sendo o destaque, mesmo cercado de bons colegas. Impecável no uniforme do mítico Capitão Rodrigo, Lacerda tem uma presença forte e dentes brancos que doem o olho.

Um dos personagens mais famosos da literatura brasileira, o Capitão Rodrigo é o estereótipo do gaúcho: machão, beberrão, com acessos de violência, mas muito manso na conversa e na jogatina. Mas o forte da trama são as mulheres, talhadas para trabalhar, esperar por seus maridos e chorar. Ana Terra, vivida na maior parte por Cleo Pires, é provavelmente a mais famosa, seguida de perto por Bibiana Terra, que é interpretada por três atrizes em fases distintas: Marjorie Estiano, Janaína Kremer Motta e Fernanda Montenegro. O grupo de atores está bem coeso, sem ninguém destoando negativamente. Estão lá Paulo Goulart, Marat Descartes, Vanessa Lóes, Luiz Carlos Vasconcelos, Mayana Moura, Leonardo Medeiros, Suzana Pires, entre muitos outros. José de Abreu, inclusive, esteve também na versão para a televisão de 1985, que teve Glória Pires como Ana Terra – agora, substituída pela filha.

O Tempo e o Vento casal

Para os fãs dos livros, pode ser desapontador que outros vários personagens tenham sido deixados de fora, ou apenas mencionados e esvaziados de sua importância. Isso sempre acontece em adaptações entre mídias e é perfeitamente normal, mas muito do drama e do suspense se perdeu devido às escolhas feitas. Conhecemos os primeiros membros da família Terra e acompanhamos a passagem do tempo, descobrindo as próximas gerações, tudo muito rápido. Teria sido mais proveitoso focar em um trecho da saga, de preferência um menos conhecido, e deixar para outros cineastas e oportunidades a missão de completar a história. A velocidade com que tudo é pincelado torna a produção fria, não nos familiarizamos o suficiente com aquelas pessoas para nos identificarmos, e elas viram apenas tópicos a serem mencionados nas lembranças de Bibiana (Montenegro).

Monjardim ainda precisa dominar melhor a linguagem cinematográfica para que seus filmes não fiquem com essa cara de novela – o que já é bem provável de acontecer devido ao elenco de globais. Os diálogos e as metáforas visuais têm a sutileza de um elefante, como aquela em que a imagem de Ana Terra se funde à de uma fogueira. A fotografia, muito bonita e poética, não escapa de alguns clichês, como um contraluz com uma árvore no meio, enquanto o povo segue viagem, o que denota uma certa vontade de se tornar clássico. As cenas de guerra, inexistentes, fazem falta, já que não se pode ignorar o derramamento de sangue que marcou alguns dos períodos apresentados.

Outro ponto que causa estranhamento em O Tempo e o Vento é a conclusão com uma música estrangeira, em inglês, perdendo a oportunidade de tentar trazer um pouco de identidade ao filme. Passarim, de Tom Jobim, casou tão bem com a minissérie de 1985, e Monjardim perdeu a oportunidade de fazer algo tão marcante. Na verdade, várias oportunidades foram perdidas, e a produção ficou apenas no insosso. Mas, nem por isso, deixará de ser transformada em minissérie na Globo. Em breve, na telinha.

Cleo Pires venceu o trauma aceitou a personagem que foi da mãe

Cleo Pires venceu o trauma e aceitou a personagem que foi da mãe

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Amanda Seyfried brilha como estrela pornô

por Marcelo Seabra

Lovelace poster

Houve uma época em que era considerado chique e de bom gosto assistir a filmes pornográficos no cinema. Foi quando o famoso Garganta Profunda (Deep Throat) estreou, nos idos de 1972, e tornou sua atriz principal um ícone do Cinema adulto. Linda Lovelace, como ela ficou conhecida, tem sua história contada em Lovelace (2013), cinebiografia que chega agora às telas e traz um pouco de luz sobre essa figura que muitos conhecem de nome, mas sobre quem sabe-se muito pouco.

Linda, originalmente Boreman, é vivida por Amanda Seyfried (de Os Miseráveis, 2013) de forma melancólica, como alguém que se coloca na posição de dependente de outro, como se mesmo saindo da casa dos pais, ela continuasse submissa. Essa outra pessoa, na vida adulta, seria Chuck Traynor, mais um ótimo trabalho de Peter Sarsgaard (da série The Killing), que consegue ir facilmente do amável ao ameaçador. Essa dupla principal é o centro da produção, que acompanha o relacionamento deles do início ao fim. E o elenco de apoio é uma atração à parte: cada personagem que aparece teve seu intérprete escolhido a dedo e, na tela, vemos nomes como Sharon Stone e James Franco. Citar todos seria estragar uma agradável surpresa.

Couple

Como se trata de uma história real, uma reconstituição de época se fez necessária e ela realmente coloca o público nos anos 70, em um clima semelhante ao de Boogie Nights (1997), o que faz muita diferença. Imagens de arquivo de celebridades já falecidas, como Richard Nixon e Johnny Carson, ajudam no quesito veracidade, lembrando o espectador que não se trata de ficção. Linda virou uma estrela tendo apenas um longa no currículo e, para uma menina de 22 anos aparentemente ingênua, tudo aconteceu muito rápido. Essa é a imagem que é pintada de Linda, e Traynor acaba sendo o grande responsável por suas mazelas.

Ao fazer um recorte de muitos anos, o roteiro de Andy Bellin (de Confiar, 2010) é hábil ao focar em episódios mais relevantes, deixando pouca coisa de fora. Mas o reforço constante da figura de vítima incomoda. Linda, a personagem, parece deixar muito a dever à Linda figura histórica, e fica sempre à sombra de Traynor. Ao invés de identificação, empatia ou mesmo pena, o público pode acabar com raiva dela, tamanha é a passividade da moça. Se ela de fato era assim, não tinha mesmo o que inventar. Mas parece que nós, como as pessoas que conviviam com ela, só conseguimos ver o que ela deixa, o que não é muito fundo.

A atriz e a atriz

A atriz e a atriz

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Sandra Bullock se esforça em comédia sem graça

por Marcelo Seabra

The Heat posterApresentar um filme lembrando seu “parentesco” com Missão Madrinha de Casamento (Bridesmaids, 2011) já deveria enterrá-lo de cara. Isso, em um mundo perfeito. No nosso, o filme está praticamente destinado ao sucesso. Um roteiro fraco que serve como mera desculpa para um desfile de piadas de mau gosto: essa também é a descrição de As Bem Armadas (The Heat, 2013), que falha até nos momentos engraçados que deveria ter. Melissa McCarthy é a eterna gordinha mal humorada e isso, por si só, parece ser garantia de bilheteria.

Como McCarthy não consegue segurar um filme sozinha (ela sempre precisará de um “escada” para depositar suas reclamações), temos no papel principal ninguém menos que Sandra Bullock, oscarizada por Um Sonho Possível (The Blind Side, 2009), mas mais lembrada pelos dois Miss Simpatia (Miss Congeniality, 2000 e 2005). Novamente no papel de uma policial competente mas inábil socialmente, ela é Sarah Ashburn, uma agente do FBI a um passo de uma promoção, ou assim ela acredita. Seu chefe (o desperdiçado Demian Bichir, de Selvagens, 2012) a designa para uma nova missão para que ela, além de provar sua competência, mostre que sabe trabalhar em equipe.

The Heat scene

Chegando em Boston para investigar o caso das drogas de perto, Ashburn se vê obrigada a colaborar com a desbocada Mullins (McCarthy), detetive local que tem um irmão metido no submundo. Portanto, as duas têm motivos fortes para capturar o traficante mor, mas antes precisarão descobrir quem ele é. Obviamente, na interação entre as duas, teremos situações que deveriam ser hilárias, apesar de já vistas em diversas outras produções. Bullock ainda consegue trazer certa simpatia para sua personagem, uma mulher travada, cheia de regras, que parece querer ser mais simples e relaxada, mas não consegue lutar contra a sua natureza. Já Mullins é o tipo de estereótipo que você não explica como durou na polícia. A produção se esforça para mostrar que, apesar de anticonvencional, ela é comprometida. Talvez, ela ainda esteja lá por ter um chefe banana que não sabe o que fazer com ela (papel de Thomas F. Wilson, para sempre lembrado como o Biff Tannen da trilogia De Volta Para o Futuro).

O roteiro, de Katie Dippold (da série Parks and Recreation), consegue visitar todos os clichês desse subgênero “policiais-de-personalidades-opostas-que-devem-se-ajudar”, e passa longe da graça que deveria ter. O diretor, Paul Feig, não traz nada de novo, apostando na fórmula que funcionou em seu Madrinhas de Casamento. Afinal, foram mais de US$288 milhões arrecadados pelo mundo. As Bem Armadas já levou mais de US$220 milhões desde o fim de junho, quando foi lançado nos Estados Unidos. A continuação, claro, já está garantida. Ao menos, poderemos tirar esse gosto ruim ao ver a esforçada Bullock na elogiada ficção-científica Gravidade (Gravity, 2013), que chega aqui em outubro.

Diretor reúne a equipe na premiere de NY

Diretor reúne a equipe na premiere de NY

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Diretor de Distrito 9 cria Elysium

por Marcelo Seabra

Elysium

Ambientado em 2154, Elysium (2013) tem várias características de um bom longa de ficção científica, entre elas a primordial: discutir o futuro da humanidade e saídas para o que não parece nada bom. Para nós, brasileiros, há ainda outro grande atrativo: além dos grandes nomes de sempre em produções desse porte, podemos conferir Wagner Moura e Alice Braga em boas atuações e bons papéis, o que é mais raro quando a língua falada é a inglesa. E até aí o longa surpreende: no mundo de Elysium, as nacionalidades estão todas misturadas, e há atores de outros países também.

O protagonista, Max (Matt Damon, de Compramos um Zoológico, 2011), vive em meio ao caos e à destruição que os humanos causaram ao planeta. Guerra? Nada, só a rotina. Todos os dias, Max acorda e vai trabalhar, ao contrário dos vizinhos, que planejam o próximo assalto e mendigam nas ruas. A violência policial é gritante e acaba mandando nosso amigo ao hospital. Lá, conhecemos um pouco de seu passado pela figura da Dra. Frey (Alice Braga, de Na Estrada, 2012), e entendemos melhor aquele mundo e seus cidadãos. Só o necessário, porque o roteiro do diretor Neill Blomkamp é enxuto e parte logo para o que importa, o desenrolar da trama. Intrigas políticas não vão faltar, mas não se fica apenas nos diálogos: há pancadarias, corridas, até um clima de história em quadrinhos.

Elysium Moura Damon

Blomkamp, que ficou famoso fazendo de Distrito 9 (District 9, 2011) um filme bom e bem feito mesmo tendo relativamente pouco dinheiro, mostra agora do que é capaz com mais verba. De 30 milhões, ele pulou para 115 milhões de dólares, e teve condições de trazer astros do porte de Damon e Jodie Foster (de Deus da Carnificina, 2011), além de cercá-los de um ótimo elenco, com Diego Luna (de Contrabando, 2012) e William Fichtner (de O Cavaleiro Solitário, 2013). Quem não podia faltar é o amigo de longa data Sharlto Copley, de Distrito 9. Como a história deixa claro que o mundo não tem mais fronteiras e é possível ouvir várias línguas em Los Angeles, não houve problema em misturar tantas nacionalidades. Inclusive, o baiano Moura (de A Busca, 2012) não faz feio falando inglês, mesmo não tendo tanta experiência atuando no idioma. Seu Spider é exagerado na medida certa.

Desde o início da projeção, com a ambientação futurística distópica, várias produções vêem à mente, como o primeiro trabalho de Blomkamp. Mas também Oblivion (2013), O Vingador do Futuro (Total Recall, 2012) e até Johnny Mnemonic (1995), que coincidentemente tem um personagem chamado Spider que é responsável por implantes no submundo. Tantas semelhanças não são apenas coincidências, já que os temas tratados são similares e as visões podem se esbarrar. Elysium, no entanto, consegue ter uma boa mistura de ação e cabeça, o que muitas vezes falta no gênero. Autoritarismo e opressão são combatidos por um sonho de liberdade, algo que, naquele mundo, já deveria ter deixado de existir há muito tempo.

Isso é o que sobrou da Terra

Isso é o que sobrou da Terra

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Jobs de Kutcher fica no óbvio

por Marcelo Seabra

jOBS

Ficar marcado como um eterno adolescente burro como uma porta não pode fazer bem para a carreira de um ator. Depois do fim da engraçada série That 70’s Show (1998-2006), Ashton Kutcher vem tentando se encontrar e provar para o mundo que é capaz de uma atuação boa e séria. Se depender de Jobs (jOBS, 2013), continua devendo. Ele no máximo consegue imitar bem os maneirismos de Steve Jobs, o gênio criativo e administrativo por trás da Apple. E o filme até parece se maravilhar com essas imitações, tamanho é o tempo gasto no ator em momentos não exatamente marcantes.

A primeira pretensão do roteiro negativamente convencional do estreante Mark Whiteley é desmitificar o homem. Para isso, mostra-se bastante o lado negativo de Jobs, como a forma que ele trata a namorada e colegas e até a exploração do trabalho do amigo Steve Wozniak (Josh Gad, de Amor e Outras Drogas, 2010). O paradoxo é que, ao mesmo tempo, a aura de gênio é tão grande que parece desculpar estes comportamentos estúpidos. Whiteley não decide se quer criticar ou aplaudir, ficando num meio termo indefinido para logo assumir a adoração cega. Alguns aspectos da vida pessoal do personagem são mencionados, mas só o suficiente para deixar o público confuso – como a relação dele com a filha, que anda a passos largos e não acompanhamos.

Ashton KutcherKutcher brigou muito pelo papel, mesmo tendo muito mais gente adequada por aí. Não só mais competente, mas mais parecidos até, já que não é o caso do ator. Ele via no projeto uma grande oportunidade de se provar. Kutcher deve ser cego às suas próprias limitações. No fim, é apenas um comediante exercendo seu poder de observação, repetindo a casca de Jobs com uma interpretação fria, distante e calculada. E o público americano ainda vê Kutcher como Michael Kelso (de That 70’s) e tem na TV as novas (e ruins) temporadas de Two and a Half Men, na qual ele entrou na “vaga” de Charlie Sheen. Ou seja: ninguém acreditava realmente que isso daria certo. Na pior das hipóteses, o diretor Joshua Michael Stern (que estreou na função com o fraco O Segredo de Neverwas, de 2005, que também escreveu) sabia que chamaria a atenção para o projeto tendo o ator a bordo.

Apesar de as produções para a televisão estarem cada vez melhores, com muitas fazendo frente ao Cinema, não é exatamente um elogio dizer que um longa tem cara de filme para a TV. E é exatamente assim que Jobs pode ser descrito. Tudo muito certinho e episódico, como se Whiteley e Stern tivessem listado os grandes momentos de Steve Jobs para delimitarem o que entraria no filme. E isso é feito de forma pouco natural, pulando entre os eventos. O fato de a câmera sempre seguir Kutcher, como se estivesse reverenciando Jobs, chega a irritar, e deixa os bons coadjuvantes para escanteio. Gente como Dermot Mulroney (de Segredos de Sangue, 2013), James Woods (de Ray Donovan), Matthew Modine (de Batman Ressurge, 2012), J.K. Simmons (de Os Escolhidos, 2013) e Gad só entra para compor, já que a produção mal apresenta seu protagonista, o que dizer dos vários outros personagens. Vamos aguardar o próximo projeto sobre Jobs e torcer por algo melhor.

Eis o verdadeiro Jobs, imitado por Kutcher

Eis o verdadeiro Jobs, imitado por Kutcher

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A natureza humana é o verdadeiro assunto de Rush

por Marcelo Seabra

Rush

Dois pilotos de corrida, não dos mais famosos no Brasil, viveram uma rivalidade cerrada na década de 70. É até curioso o tanto que suas vidas se cruzaram e tiveram semelhanças. De olho nessa interessante história real, o diretor Ron Howard e o roteirista Peter Morgan decidiram repetir a dobradinha do ótimo Frost/Nixon (2008) em outra cinebiografia: Rush – No Limite da Emoção (2013). Mais uma vez, eles são bem sucedidos, e ainda contam com um elenco bem afiado e adequado para cada papel.

Apesar de ter as corridas como desculpa, Rush foca na dualidade talento contra dedicação. Os pilotos James Hunt e Niki Lauda são os lados de uma mesma moeda. Enquanto o britânico é um boa vida carismático e destemido, o austríaco é meticuloso e não se importa em parecer inescrupuloso ou grosso. Ele credita seu sucesso a esse comprometimento e não agüenta ver o colega, aparentemente nada esforçado, ter sucesso. Com o tempo, um passa a ver no outro sua nêmesis, alguém que deve ser vencido naquela disputada temporada de 1976. O mais interessante do longa é não tachar qualquer um como herói ou vilão. São dois seres humanos buscando se exceder e, claro, ganhar o campeonato mundial. As vitórias de um servem como combustível para o outro. São como astros do rock do asfalto, e mortais.

Rush 2013

Começando na Fórmula Três e chegando à Fórmula Um, os caminhos de Lauda e Hunt sempre se cruzam, aumentando a rivalidade – até na vida pessoal, diga-se de passagem. Como Hunt é um tipo simpático e querido por todos, seria fácil colocá-lo como herói, deixando para vilão o obsessivo e sisudo Lauda, que ainda era exigente com os mecânicos por entender muito do assunto. Mas o que acontece é que ambos têm defeitos, como qualquer um, e os atores potencializam as boas escolhas do roteiro. Daniel Brühl (de Bastardos Inglórios, 2009) domina as cenas em que aparece, dando profundidade a Lauda, enquanto Chris Hemsworth (ou simplesmente Thor) confere um charme a Hunt que parece irresistível, tamanho é o número de mulheres que caem a seus pés – ou em sua cama. Alguns exemplos são Natalie Dormer (de The Tudors e Game of Thrones) e Olivia Wilde (de A Fuga, 2012), lindas como sempre.

Ainda não tínhamos visto tantas imagens interessantes em um filme de Ron Howard, que costuma ser um cineasta bem convencional. Em Uma Mente Brilhante (A Beautiful Mind, 2001), por exemplo, ele brincava com as palavras que o esquizofrênico professor via nos jornais. Aqui, ele filma pelo capacete do piloto, há imagens de dentro do motor do carro de corrida, as tomadas das curvas das pistas tiram o fôlego e denotam a iminência do perigo que sempre espreita. Afinal, ser piloto de Fórmula Um é arriscar a vida frequentemente, que seja 100 ou apenas 20%. O diretor de fotografia Anthony Dod Mantle (de Quem Quer Ser um Milionário, 2008) teve trabalho para criar as técnicas para captar o que vemos no longa, e o compositor Hans Zimmer (de O Homem de Aço, 2013) ajuda a criar o clima com uma trilha grandiosa que casa bem com a situação.

É bom perceber que não foi necessário ser exagerado ou tendencioso para criar dramaticidade, como acontece na primeira luta de Hurricane (1999), que enfraquece o filme por insinuar algo que não estava lá em uma história que já era forte o suficiente. O roteiro enxuto e bem amarrado de Morgan apresenta o que precisamos saber e evita maniqueísmos – mesmo que caia vez ou outra na armadilha dos clichês, como mostrar mulatas sambando para introduzir o grande prêmio do Brasil. Os demais pilotos são mencionados por alto, inclusive nosso velho Emerson Fittipaldi, e há uma série de bons coadjuvantes. Mas o filme pertence mesmo a Hemsworth e, mais ainda, a Brühl.

Eis os verdadeiros Lauda e Hunt

Eis os verdadeiros Lauda e Hunt

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Demonologistas protagonizam belo suspense

por Marcelo Seabra

The Conjuring

De tão famosos em sua área de atuação profissional, era de se esperar que logo um filme seria feito sobre o casal Ed e Lorraine Warren. Trata-se de Invocação do Mal (The Conjuring, 2013), novo trabalho de James Wan, diretor que ficou famoso com Jogos Mortais (Saw, 2004) e comandou recentemente o interessante e tenso Sobrenatural (Insidious, 2010). Trata-se do velho tema da casa bem assombrada, para onde vai morar uma inocente família feliz, mas a realização é bem feita e prende o público como poucas. E o que é o melhor: à moda antiga, sem muitos efeitos visuais, buscando realismo.

Em 1952, os Warrens fundaram a Sociedade de Pesquisa Psíquica da Nova Inglaterra, grupo que se ocupa de investigar supostos fenômenos paranormais, e eles alegam terem participado de mais de 10 mil casos em todos esses anos. Ed faleceu em 2006, e Lorraine segue firme dando suporte às novas gerações, além de ainda manter o Museu do Oculto Warren, onde eles guardavam as peças ligadas aos casos em que trabalharam. No longa, coube a Patrick Wilson (repetindo a parceria com Wan de Sobrenatural) e a Vera Farmiga (da série Bates Motel) viverem o casal, e ambos mostram composições sóbrias, contidas, bem adequadas à seriedade do projeto.

The Conjuring

Ao contrário de vários outros filmes, que trazem sabichões que buscam desvendar fraudes (como O Despertar, 2011, e A Colheita do Mal, 2007), este apresenta um casal de demonologistas que realmente acredita no que faz, empregando a ciência onde é possível. Assim como em Sobrenatural, os recursos tecnológicos da época são empregados para tentar capturar alguma prova incontestável da presença de espíritos e ajudar os assombrados. Nesse caso, a família composta por Roger (Ron Livingston, de Virada no Jogo, 2012) e Carolyn Perron (Lili Taylor, de Inimigos Públicos, 2009) e suas cinco filhas. Eles se mudam para um casarão no campo e logo começam a sentir influências externas, com barulhos estranhos, hematomas inexplicáveis e toda a sorte de sintomas de obsessão espiritual. A ajuda dos Warrens é necessária.

The Conjuring dollDepois de uma longa carreira na TV, os gêmeos Chad e Carey Hayes estreiaram no Cinema com os dois pés esquerdos escrevendo A Casa de Cera (House of Wax, 2005), e assinaram o fraquíssimo Terror na Antártida (Whiteout, 2009), mas A Colheita do Mal fez contrapeso na balança, sendo agora ajudado por este Invocação do Mal. Mas parece mais um filme de Wan que dos roteiristas, já que repete muitas ideias que o diretor já usou em outros trabalhos. A similaridade com o já citado Sobrenatural é grande, e Wan ainda traz uma boneca demoníaca que remete a Gritos Mortais (Dead Silence, 2007).

A casa da família Perron é praticamente um personagem à parte. Mesmo tendo diversos cômodos, ela nunca para de surpreender com compartimentos sendo descobertos, dando a impressão de estar em fase de crescimento (como a Rose Red de Stephen King). O uso do cenário faz a tensão crescer e Wan sabe o que é melhor não revelar, ou quando revelar. Dessa forma, o espectador fica na expectativa e muitas unhas podem sair roídas no processo. Que venham os inevitáveis próximos longas com os Warrens.

"Olha, o problema aqui é sério!"

“Olha, o problema aqui é sério!”

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Crossing Lines é novo suspense policial da NBC

por Rodrigo “Piolho” Monteiro

Crossing Lines

Numa manhã nublada em Paris, o corpo de uma jovem é encontrado horrivelmente desfigurado e mutilado em um parque da cidade. O assassino foi bastante cuidadoso, não deixando para trás qualquer evidência de sua identidade ou da de sua vítima. Impossível identificá-la através de seus registros dentários ou impressões digitais e ela não figura em nenhuma lista conhecida de pessoas desaparecidas.

Ao ser apresentado ao caso, o major da Polícia Metropolitana de Paris Louis Daniel (Marc Lavoine) sabe que tem um grande enigma em suas mãos e a coisa piora quando ele relaciona esse assassinato a outro semelhante ocorrido recentemente em Londres. Em um cenário onde agências policiais não trocam informações sobre casos em andamento para não prejudicar as investigações e as jurisdições são delimitadas pelas fronteiras de cada país, Louis sente que a única forma de solucionar esse caso – e outros que cruzam fronteiras dentro da União Européia – seria a criação de uma força-tarefa especialmente para esse tipo de crime.

Assim sendo, logo ele consegue a autorização para liderar uma pequena agência de combate ao crime multinacional, composta pelo alemão Sebastian Berger (Tom Wlaschiha, de Game of Thrones), a francesa Anne-Marie San (Moon Dailly), o irlandês Tommy McConnel (Richard Flood), a italiana Eva Vittoria (Gabriella Pession), a inglesa Sienna Pride (Genevieve O’Reilly, de Episodes) e, como não podia deixar de ser, o americano Carl Hickman (William Fichtner, de O Cavaleiro Solitário, 2013), que parece ser aquele que, na visão de Luis, trará o diferencial ao grupo. Desnecessário dizer que, como em toda série policial em que uma nova força-tarefa ou unidade é montada, cada um dos escolhidos tem uma especialidade que “completa o grupo”: o alemão é um hacker experiente, a francesa é especialista em crimes de tráficos de pessoas, o irlandês tem experiência com armas e táticas e por aí vai. O americano é um excelente ex-investigador do Departamento de Polícia de Nova York especialista em traçar perfis de criminosos que é forçado à aposentadoria após um tiro na mão direita o deixar praticamente inválido, o que faz com que se torne um lixeiro em um parque em Amsterdã, Holanda.

Crossing Lines cast

Não há muitas novidades em Crossing Lines, atração criada pelos produtores Edward Allen Bernero e Rola Bauer. Tão logo o novo grupo se une o espectador é apresentado aos mesmos clichês vistos em todas as séries de TV, filmes, livros e etc no qual um grupo de pessoas com experiências diferentes – tanto de vida, quanto profissionais – se unem em um mesmo grupo para um objetivo comum. O que, apesar de ser clichê, não deixa de ser interessante. Os atores interagem de maneira competente e crível e há até a presença de Donald Sutherland (de Jogos Vorazes, 2012), como um advogado responsável por fazer a ligação entre o grupo e seus superiores, para dar mais peso à série. E, claro, aos poucos os segredos e o passado de cada integrante do time vai sendo revelado e uma mitologia própria para a série é construída.

Com dez episódios em sua primeira temporada, Crossing Lines é uma boa opção para fãs de séries como Criminal Minds e suas familiares. A segunda temporada já está confirmada, com 12 episódios, e foram anunciados como convidados Ray Stevenson (visto recentemente em Dexter) e Carrie-Anne Moss (a eterna Trinity de The Matrix). A série está sendo exibida no Brasil desde o dia 4 de setembro, todas as quartas-feiras às 22:00, pelo canal a cabo AXN.

"Você deve se lembrar de mim da cena do assalto a banco de O Cavaleiro das Trevas."

“Você deve se lembrar de mim do assalto a banco de O Cavaleiro das Trevas.”

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Colin Farrell é um homem morto!

por Marcelo Seabra

Dead Man Down

Colin Farrell continua trabalhando como sempre, mas anda aparecendo menos. Os últimos filmes que escolheu não eram dos mais badalados, alguns com rápidas passagens pelos cinemas (como Sete Psicopatas e um Shih Tzu, 2012) ou indo direto para as locadoras. Sem Perdão (Dead Man Down, 2013) se encaixa nessa última categoria, mesmo tendo um elenco interessante e o diretor do Os Homens que Não Amavam as Mulheres original (The Girl with the Dragon Tattoo, 2009), Niels Arden Oplev. A fraca recepção no exterior pode ter sepultado a carreira do longa, que teria arrecadado alguns reais se entrasse em cartaz.

Como o título nacional genérico já indica, Sem Perdão não é nada memorável, fica bem em cima do muro entre o bom e o ruim. Os protagonistas são construídos decentemente e o ritmo lento, que pode ser interpretado como aborrecido pelos mais exaltados, é adequado. Mas o problema vem no trecho final: apesar de previsível, surpreende negativamente quanto ao extremo que chega. De repente, o filme é outro e todas as pontas se amarram à força. A esta altura, você só quer que tudo termine, independente do que vai acontecer.

Scene

Farrell vive Victor, um capanga entre muitos outros de um gângster de importância média, Alphonse (Terrence Howard, de Sem Proteção, 2012). Alguém está ameaçando o sujeito com cartas enigmáticas e apagando alguns de seus comparsas. O clima crescente de desconfiança deixa todos de sobreaviso. Como se não bastasse essa situação no “trabalho”, Victor ainda se vê em outro aperto: sua vizinha (Noomi Rapace, de Prometheus, 2012) o chantageia para que mate o homem que a desfigurou em um acidente de carro. Os elementos de um bom noir estão aí, e muita coisa ainda vai se revelar.

Rapace, que tem sido contratada para várias produções, despontou para o mundo exatamente em Os Homens que Não Amavam as Mulheres, como a hacker Lisbeth Salander, e reencontra Oplev na estreia do diretor em solo norte-americano. Três veteranos foram chamados para engrossar o caldo: F. Murray Abraham (de Amadeus, 1984), Armand Assante (de O Gângster, 2007) e a francesa Isabelle Huppert (de Amor, 2012). O elenco ainda conta com um mal aproveitado Dominic Cooper (de Dublê do Diabo, 2011), que merecia um destaque maior. O que mais chama a atenção no longa é a seriedade com a qual os atores o tratam, todos parecem estar dando o melhor de si para salvar um texto mais ou menos, cortesia de J.H. Wyman (roteirista da série Fringe). Apesar desse esforço, o resultado não sai do mediano.

Howard, Repace e Farrell lançam o longa em LA

Howard, Rapace e Farrell lançam o longa em LA

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Nova série do AMC merece uma chance

por Marcelo Seabra

Low Winter SunO canal americano AMC tem produzido ótimas séries de televisão e batido recordes de audiência sucessivamente. A nova atração, Low Winter Sun, é mais uma aposta dos executivos para ter vida longa na programação, mas há um porém: a série já estreia com um sentimento negativo em torno dela. O AMC tem associado LWS ao fim de Breaking Bad, este um sucesso como poucos, como se uma fosse a sucessora da outra. Resultado: o público rejeita sem nem ter conferido, por pura raiva de ser forçado a gostar de algo.

Uma situação parecida aconteceu recentemente com Ray Donovan, nova série do Showtime, mesmo canal que produz Dexter, programa que chega ao fim este ano em sua oitava temporada. Só falta dizer, na publicidade, que o público não ficará órfão porque uma substitui a outra em seus corações. Comparações geralmente são um tiro no pé, o programa deixa de ter uma existência própria para viver em função do outro. Como as táticas do Showtime foram um pouco mais discretas que as do AMC, Ray Donovan não foi tão prejudicada e não perdeu tantos pontos de audiência após a estreia. Mas é isso que vem acontecendo com LWS, já em seu terceiro episódio nos Estados Unidos.

Colocar trechos de uma série durante a exibição da outra é um golpe baixo, o sujeito que acompanha as desventuras de um grupo de personagens é obrigado a conhecer o outro. Essa amostra atrasa o que ele realmente quer, e começa aí o fracasso da novidade. LWS teve 2,5 milhões de espectadores em seu primeiro episódio, e caiu para 1,46 milhão já no seguinte. De acordo com a mídia especializada estrangeira, muito disso não é culpa da série propriamente, mas dessa estratégia agressiva e inconveniente do AMC. É o mesmo que vender Equilibrium (2002) como “o novo Matrix”, o produto já chega devendo.

Low Winter Sun

Low Winter Sun, seguindo a moda sombria das séries atuais, tem como protagonistas dois policiais que, logo de cara, cometem um crime. Com o andar da carruagem, descobrimos as circunstâncias que os levaram àquele ato e os acompanhamos enquanto tentam se safar. O nome mais famoso do elenco é o de Mark Strong, que costuma ser escalado como vilão (caso do Lorde Blackwood de Sherlock Holmes, 2009), mas mostra ser muito mais que um ator de um papel só. Ele inclusive viveu o mesmo personagem na série original escocesa, cujos dois episódios foram exibidos em 2006. Seu colega, Lennie James, é um coadjuvante freqüente, daqueles que conhecemos, mas não sabemos de onde – talvez, de The Walking Dead, ou 72 Horas (The Next Three Days, 2010), ou…

Se as tentativas do AMC de equiparar Frank Agnew (Strong) a Walter White (de Breaking Bad) puderem ser relevadas, a série se mostrará um passatempo interessante. Um canal que tem, além de The Walking Dead e BB, Mad Men, Hell on Wheels e The Killing não precisa desse tipo de subterfúgio para conseguir chamar público. A qualidade de seus programas está mais do que comprovada, e Low Winter Sun está aí para manter a tradição.

O elenco principal posa para foto

O elenco principal posa para foto

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