Duas análises do novo Homem de Aço

por O Pipoqueiro

Man of Steel

Uma estreia dessa grandeza, que criou tanta expectativa (leia aqui), merece não uma crítica, mas duas. Confira abaixo as duas visões, que não diferem tanto, e se assemelham também evitando spoilers. Pode ler sem medo de estragar nada.

Superman ainda não consegue alçar um voo digno nos cinemas

por Rodrigo “Piolho” Monteiro

Man of Steel scene

Como vocês puderam conferir num artigo anterior, a expectativa pelo novo filme do Super-Homem (ou Superman, como queiram), O Homem de Aço (Man of Steel, 2013) era altíssima por aqui. Ao subirem os créditos ao final da película, ficou patente que essa expectativa fora exagerada e o filme fica muito abaixo do que era esperado, especialmente se levarmos em conta os nomes de seus realizadores: este novo reboot foi escrito por David S. Goyer e produzido por Chris Nolan – respectivamente escritor/roteirista e diretor da aclamada trilogia Batman – e dirigido por Zack Snyder, um nome que se tornou bastante renomado entre os fãs de quadrinhos graças ao seu trabalho em 300 (2006) e Watchmen (2009). A química, dessa vez, não deu liga.

Uma das maiores críticas a Superman: O Retorno (Superman Returns), de 2006, foi o fato de o filme ter muito pouca ação. O Homem de Aço parece tentar compensar isso e se torna uma produção que, honestamente, lembra mais uma mistura de um filme de Michael Bay com um filme catástrofe de Roland Emmerich, tamanhos os níveis de ação e destruição que ele proporciona. A história em si, que deveria ser o principal atrativo de qualquer filme, muitas vezes fica em segundo plano.

Como todo reboot, o longa traz uma história de origem. Ele se inicia em Krypton, um planeta que está à beira da destruição devido ao fato de sua população, ainda que altamente evoluída, tenha praticamente exaurido seus recursos naturais. Pior: ao tentarem obter minerais retirando-os do próprio núcleo do planeta, acabam tornando esse mesmo núcleo instável. Apesar da destruição iminente, o cientista Jor-El (Russel Crowe, de Os Miseráveis, 2012) propõe uma forma de salvar pelo menos parte do legado de Krypton, mas sua iniciativa nem sequer chega a ser considerada. Ao mesmo tempo em que ele a apresenta, uma tentativa de golpe de Estado está sendo levada a cabo pelo General Zod (Michael Shannon, de Boardwalk Empire – abaixo). Jor-El consegue enganar temporariamente as forças do general e garantir a sobrevivência de Krypton ao inserir o codéx – matriz genética da qual todo kryptoniano é gerado, já que Krypton abolira a reprodução natural de seus cidadãos – nas células de seu filho Kal, o primeiro bebê kryptoniano gerado por concepção natural em milênios. Depois de muita briga – com Jor-El mostrando seus conhecimentos de artes marciais – a história segue mais ou menos como tradicionalmente se conhece: Kal-El é colocado em uma nave espacial e enviado para ser criado na Terra; Jor-El é morto; Zod e seus comparsas são presos e condenados a uma prisão na chamada “Zona Fantasma”; e Krypton explode.

Krypton

Trinta e três anos se passam e vemos um homem desconhecido (Henry Cavill, de Imortais, 2011), barbado, realizando feitos impossíveis para um ser humano normal ao mesmo tempo em que segue uma vida nômade para impedir que as pessoas descubram seu segredo e coloquem seus entes queridos em perigo. Através de flashbacks, descobrimos que seu nome é Clark Kent e que ele fora encontrado e criado por um casal de agricultores, Jonathan e Martha Kent (Kevin Costner, de Hatfields & McCoys, e Diane Lane, de Secretariat, de 2010), que lhe ensinaram não só a controlar, mas, dentro do possível, esconder suas extraordinárias habilidades.

A coisa toda começa a degringolar para Clark quando ele está prestando serviços para o exército norte-americano em uma missão no norte do Canadá que examina uma espécie de veículo enterrado sob toneladas de gelo. A chegada da repórter Lois Lane (Amy Adams, de Curvas da Vida, 2012) ao mesmo local faz com que a história comece a andar mais rapidamente. Paralelamente a isso, o planeta é visitado por uma nave alienígena, tripulada por Zod e seus comparsas – que conseguiram escapar da Zona Fantasma quando da explosão de Krypton –, que passaram os últimos 33 anos em busca do “último filho de Krypton”. Dizer mais do que isso – e muito já foi dito – estragaria a experiência do filme pro leitor que ainda não assistiu à película.

O Homem de Aço tem seus méritos, mas, infelizmente, a maior parte deles se resume à parte técnica. Os efeitos especiais são praticamente perfeitos e Zack Snyder sabe como trabalhar com eles. Todo o elenco tem atuações que não comprometem – ainda que não se destaquem – e há até uma química decente entre Cavill e Adams. O roteiro, que chega a reciclar até mesmo situações vistas no primeiro Homem-Aranha (Spider-Man, 2002), no entanto, não funciona. Mesmo aqueles que não são fãs dos quadrinhos do personagem notarão que ele está bastante descaracterizado e isso causa incômodo. O fato é que, quando os produtores chamaram Christopher Nolan e Goyer para o projeto, eles queriam que a dupla conseguisse inserir aquele aspecto de “mundo real” no filme da mesma forma que fizeram na trilogia do Homem-Morcego. Infelizmente, o Superman não é o Batman e essa abordagem mais realista e até mesmo sombria, pelo menos nessa primeira tentativa, não deu certo. Apesar da boa bilheteria no exterior e da garantia de uma continuação, O Homem de Aço mostra que, na briga nas telas do cinema entre DC e Marvel, a Warner Brothers (dona da DC) ainda tem muito a aprender com a sua concorrente.

Man of Steel Wallpaper

Homem de Aço destrói até sua própria mitologia

por Marcelo Seabra

Finalmente, já estão disponíveis as primeiras pré-estreias do aguardado O Homem de Aço (Man of Steel, 2013), longa que retoma a carreira cinematográfica do Super-Homem – que está na geladeira desde o fracasso de Superman – O Retorno (Superman Returns, 2006). O herói ganhou um tratamento similar ao que deu muito certo com Batman, tentando lhe dar um aspecto mais real, pé no chão. Na prática, vemos que isso é mais fácil de fazer com um milionário que teve os pais assassinados que com um alienígena indestrutível que vive na Terra desde bebê. Os realizadores tiveram carta branca para mudarem o que acharam necessário nas origens conhecidas do personagem, o que deve desagradar muitos fãs.

Como é um herói mais do que conhecido, há alguns elementos que rodeiam o Super-Homem que já são esperados em um filme. Romance é um deles, e humor passou a ser após as palhaçadas feitas com a cinessérie das décadas passadas. Talvez, a falta destes dois elementos tenha feito alguns se desanimarem um pouco com a nova aventura. De fato, o clima sisudo da produção dificilmente se quebra, um pouco de humor não faria mal. Do romance, sinceramente, não dá para sentir falta. Ele aparece, mas bem dosado, numa medida aceitável, que não vira o centro das atenções. Uma coisa irritante é a necessidade de sempre se voltar à origem, que já foi mais do que explicada, e os envolvidos ainda acabam se vendo na obrigação de acrescentarem algo novo, para justificar recontar tudo. O mesmo se observou no recente O Espetacular Homem-Aranha (The Amazing Spider-Man, 2012), que se enrolou ao inventar em cima do que todos já sabiam. Bastava uma introdução bem feita situando o público, como acontece em Superman II (1980).

Clark

O básico é o que todos já sabiam: um menino cresce na fazenda dos Kent, cidadãos do interior dos EUA que parecem ser modelos de integridade e cidadania. Em meio a flashbacks, conhecemos a história de seu planeta-natal, Krypton, que explodiu em decorrência da exploração desmedida de seus recursos naturais. Jor-El, um cientista kryptoniano, envia seu filho numa nave prevendo que ele seria um deus na Terra, já que as características do planeta fariam o pequeno ser muito poderoso. O garoto cresce tendo que lidar com suas diferenças: desde cedo, ele se descobre muito mais forte que os outros, além de talentos como uma audição sobre-humana, entre outros que vão aflorando com o tempo. Já crescido, Clark decide sair pelo mundo ajudando pessoas, aceitando trabalhos diversos e conhecendo melhor os humanos. Seu pai adotivo havia alertado-o para o risco de se mostrar, dizendo que o planeta não estaria pronto para tantas descobertas, como não estarmos a sós no universo. Por isso, ele se mantém anônimo.

No espaço, nesse momento, Zod, um general dissidente de Krypton que estava preso com seus asseclas na Zona Fantasma, consegue rastrear o filho de seu antigo aliado, Jor-El. Um encontro se dará na Terra e é aí que as coisas começam a ficar aborrecidas. Enquanto o filme cuida de desenvolver seus personagens, tudo corre bem, mesmo com as tais alterações na origem clássica. Mas, quando começa a ação desenfreada e genérica que mais lembra as destruições de Roland Emmerich, o filme fica bem chato. Não vale a pena entrar em mais detalhes, mas alguns fatos estranhos que aparecem a partir daí não fazem muito sentido e fica a sensação que o foco foi concentrado numa parte da trama, deixando a outra para se resolver em dois minutos, no finalzinho. E descaracteriza-se ainda mais o Super-Homem, que teoricamente nunca causaria tantos prejuízos no centro de Metrópolis.

MAN OF STEEL

No campo dos atores, não há altos e baixos, fica tudo em campo seguro. Para o papel principal, corrigindo um dos erros de O Retorno, que contava com um ator totalmente inexpressivo, foi chamado Henry Cavill (mais aqui), lembrado como o Charles Brandon da série The Tudors – seus últimos trabalhos no Cinema não merecem ser citados. Ele tem uma atuação discreta e adequada, e mostra músculos compatíveis com o título de Homem de Aço. O longa exige menos de Cavill, que não precisa buscar a versatilidade de um Christopher Reeve, por exemplo. Por falar em Reeve, há uma cena, um close, que aproxima bastante os dois atores. A nova Lois, a cargo de Amy Adams (de O Mestre, 2012 – abaixo), é infinitas vezes melhor que a anterior e cumpre bem sua missão.

Temos duas encarnações distintas de Robin Hood como pais de Kal-El/Clark: Kevin Costner (o Príncipe dos Ladrões de 1991) é Jonathan Kent e Russell Crowe (o Hood de 2010) é Jor-El, e ambos têm papéis fundamentais na jornada do filho. Diane Lane (de Killshot, 2008) e Ayelet Zurer (de Ponto de Vista, 2008) vivem as mães, a terráquea e a kryptoniana. O General Zod, que na cabeça de todos ainda é o megalomaníaco de Terence Stamp, de Superman II, ficou com Michael Shannon (de O Abrigo, 2011), e é de longe a figura mais marcante do filme. A competência de Shannon supera a escorregada da maquiagem (ou falta de) e permite a Zod ter um arco melhor construído. Laurence Fishburne (da série Hannibal) fecha o elenco principal como Perry White, o editor do Planeta Diário.

O grande responsável pelo renascimento de Batman, Christopher Nolan, foi contratado pela Warner como produtor e consultor criativo, e escreveu o roteiro ao lado de seu parceiro David Goyer, também da trilogia. Essa era a garantia do tom sombrio buscado pelos executivos. Para a direção, depois de aclamado por duas adaptações de quadrinhos, Zack Snyder assumiu. Com 300 (2006) e Watchmen (2009) no currículo, ele era mais do que capacitado, e de fato a parte técnica é impecável. Os efeitos visuais são ótimos, as caracterizações são perfeitas. Mas, nos dois trabalhos anteriores de Snyder, nos preocupamos com a integridade física dos personagens, nos envolvemos, o que não acontece aqui. Ele poderia ter se preocupado menos com mudanças e mais com a alma do filme, a dualidade Superman/Clark Kent.

Há escolhas corajosas, mas a longa duração do trecho “destruição” enfraquece o resultado, além dos afobados minutos finais. E, para quem esperava algo à altura de John Williams, só resta se contentar com a trilha sem graça de Hans Zimmer. Uma sequência, já certa, poderá ir muito mais longe, podendo pular a batida origem do herói e desenvolver uma história bacana. Quem sabe, teremos pela primeira vez um bom uso para o grande Lex Luthor no Cinema?

Homens de aço da TV e do Cinema

Homens de aço da TV e do Cinema: Reeve, Dean Cain, Tom Welling, Routh e Cavill

Sobre Marcelo Seabra

Jornalista e especialista em História da Cultura e da Arte, é atualmente mestrando em Design na UEMG. Criador e editor de O Pipoqueiro, site com críticas e informações sobre cinema e séries, também tem matérias publicadas esporadicamente em outros sites, revistas e jornais. Foi redator e colunista do site Cinema em Cena por dois anos e colaborador de sites como O Binóculo, Cronópios e Cinema de Buteco, escrevendo sobre cultura em geral. Pode ser ouvido no Programa do Pipoqueiro, no Rock Master e nos arquivos do podcast da equipe do Cinema em Cena.
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