Spotlight traz o jornalismo para o Cinema

por Marcelo Seabra

Spotlight

O Cinema está cheio de longas que retratam o jornalismo, tendo a profissão maior ou menor importância dependendo da situação. Em Spotlight: Segredos Revelados (2015), os protagonistas trabalham em um jornal regional recentemente comprado por um grupo grande e entram em uma investigação que daria origem a uma matéria de grandes repercussões. Boa parte da comunidade de Boston, de alguma forma, ajudou a encobertar denúncias de pedofilia por parte de diversos padres católicos, começando pela própria Igreja. E o mais revoltante disso tudo é tratar-se de uma história real, que estava nos noticiários há alguns anos.

Saindo de uma bobagem com Adam Sandler, Trocando os Pés (The Cobbler, 2014), Tom McCarthy partiu para algo mais sério e escreveu o roteiro original com Josh Singer (de O Quinto Poder, 2013). Assumindo a direção, ele traz bastante veracidade ao longa, apresentando práticas e procedimentos jornalísticos com detalhes. Vimos como são tratadas as fontes, seus nomes, depoimentos, notas, a necessidade de se ouvir os dois lados da história, até a moderação no uso de adjetivos, para não conduzir o leitor e deixá-lo tirar suas próprias conclusões. Assim como em A Grande Aposta (The Big Short, 2015), temos uma história verídica e chocante, mas o enfoque aqui é mais sério e objetivo, já que não há necessidade de se explicar termos técnicos.

As similaridades com este outro filme não param por aí. McCarthy trouxe seu fiel montador, Tom McArdle, que alterna trechos da história para que possamos conhecer mais elementos progressivamente, entendendo tudo o que está se passando. Temos um grupo de atores do qual ninguém parece ser o principal. A importância de todos para a trama parece se igualar, e o elenco é fantástico. John Slaterry (o Howard Stark da Marvel) é Ben Bradlee Jr., filho do famoso editor do caso Watergate (retratado no excelente Todos os Homens do Presidente, 1976). Ele recebe um novo editor para o jornalismo do Boston Globe, Marty Baron (Liev Schreiber, da série Ray Donovan), e o sujeito encarrega a equipe investigativa Spotlight de descobrir o que houve no caso de um padre que foi acusado de assediar meninos da paróquia. A ideia não é atacar um padre, mas toda a instituição que o protegeu.

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A equipe, formada pelo editor Walter Robinson (Michael Keaton, de Birdman, 2014) e os repórteres Michael Rezendes (Mark Ruffalo, o Hulk), Sacha Pfeiffer (Rachel McAdams, de Sob o Mesmo Céu, 2015) e Matt Carroll (Brian d’Arcy James, de O Encontro, 2014), começa a buscar dados, fazer entrevistas e cavar em torno das providências da Igreja quanto ao padre John Geoghan, citado em uma coluna recente do jornal. Desse indivíduo, eles conseguem algo muito maior, e os caminhos que a investigação tomam são fantásticos de se acompanhar. Assim como em A Grande Aposta, tudo é muito interessante até que se chegue a um final deprimente, ou revoltante. E essa raiva e frustração se concentram no personagem de Ruffalo, que melhor faz a ponte com o público e merecidamente foi lembrado em várias premiações. Mas até as participações menores estão ótimas, todos parecem escolhidos a dedo para seus papéis. Os próprios retratados, em entrevistas posteriores, relataram o quão assustador era ver os atores em ação, como espelhos com vida própria.

É estarrecedor ver como as pessoas arrumavam atenuantes ou justificativas para os casos de violência física e psicológica praticados pelos padres. A postura da Igreja Católica, claro, era colocar panos quentes, mas sempre sob a promessa de que providências seriam tomadas. Alguém chega a apontar que aquela “perseguição” se daria pelo novo editor ser judeu, acusação que visaria esvaziar a história de forma covarde e burra. A desculpa de “estava apenas fazendo o meu trabalho” poderia ser aceita no caso dos advogados que defendiam os acusados? Questões éticas sobre culpa e responsabilidade são levantadas, e recaem até sobre os próprios jornalistas do Globe, que demoraram a tomar providências.

Spotlight não só é um grande filme como indica discussões importantes e necessárias. O papel da mídia, em tempos tão complicados como os que vivemos, está em cheque. Grandes veículos tomam seus lados de forma velada e atacam descaradamente o outro, revelando partidarismo onde deveria haver isenção. A missão de levar fatos ao leitor é substituída por fazê-lo tomar o lado defendido pelo editor ou pelo dono, claramente bancado por interesses econômicos ou políticos. Equipes como a de Robby Robinson são cada vez mais raras, infelizmente.

Spotlight game

Para jornalistas, até jogos são oportunidade para trabalhar

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Deadpool ganha adaptação digna do personagem

por Rodrigo “Piolho” Monteiro

Deadpool fireplace

Deadpool pode ser considerado quase como um fenômeno. “Criado” (entre aspas mesmo) por Rob Liefeld (desenhista de quadrinhos famoso por criar personagens que são quase plágios de outros já existentes) e pelo roteirista Fabian Nicieza no começo dos anos 1990 para ser um vilão dos X-Men, ele, por anos, seguiu a sina de personagens menores da Marvel: atraiu alguma atenção, ganhou um gibi próprio, teve o gibi cancelado, voltou a ser secundário, chamou a atenção novamente, ganhou novo título solo e por aí vai. Ao contrário da maioria dos personagens secundários, no entanto, o fato de as histórias de Deadpool serem completamente nonsense começaram a atrair a atenção nos últimos anos, catapultando-o para um nível de popularidade – pelo menos nos EUA – que chega a quase rivalizar ao de personagens consagrados como Homem-Aranha e Wolverine.

Essa popularidade foi um dos principais fatores que  motivaram o ator Ryan Reynolds (que havia encarnado o personagem no horroroso X-Men Origens: Wolverine, 2009) a fazer uma campanha aberta para que a Fox desse uma segunda chance ao Mercenário Tagarela. Não só isso: Ryan usou de toda a sua influência para manter o filme o mais fiel possível aos gibis, trazendo para a tela todo o nonsense e a violência gráfica que vemos nos quadrinhos. O resultado é um filme proibido para menores de 16 anos que, mesmo com todo o marketing ao redor, deixa a desejar. Como adaptação, funciona perfeitamente. Como filme, tem boas sacadas, mas nada demais. No fim das contas, é mais um filme de ação genérico.

Deadpool Baccarin

Escrito pela dupla Rhett Reese e Paul Wernick (ambos de G.I. Joe: Retaliação, 2013, e Zumbilândia, 2009) e dirigido pelo estreante em longas Tim Miller, Deadpool conta a história de Wade Wilson, um ex-soldado das Forças Especiais dos EUA que, pouco depois de se enamorar da prostituta Vanessa (Morena Baccarin, de Gotham), descobre ter câncer em estágio terminal, inoperável e sem qualquer chance de tratamento ou cura, em diversos de seus órgãos. Devido ao seu histórico nas Forças Armadas, Wilson é abordado por um recrutador com uma proposta tentadora: ele não só teria seu câncer curado, como ganharia poderes correspondentes aos de um super-herói. Para isso, bastaria realizar alguns serviços para seus empregadores.

Preso entre isso e uma morte dolorosa, Wilson aceita a proposta. Mal sabia ele, no entanto, que o verdadeiro negócio ali era outro: em troca da cura de seu câncer e de seus poderes, que lhe seriam concedidos através dos experimentos do “cientista maluco e malvado” Ajax (Ed Skrein, de Game of Thrones), Wade seria vendido como um escravo superpoderoso para qualquer terrorista que pagasse o preço adequado. Não só isso: apesar de ter curado seu câncer e ter lhe concedido um fator de cura mais eficiente até mesmo do que o de Wolverine, tornando-o praticamente um imortal, o processo do dr. Ajax fez com que a aparência de Wade se tornasse repugnante, para dizer o mínimo. Certo de que isso representaria o fim de seu relacionamento, após fugir de seus captores, Wilson resolve adotar um traje de super-herói e se vingar do homem que arruinou seu rosto.

Deadpool RR

Deadpool é basicamente um filme de vingança, com bastante ação, cenas bem coreografadas e que muitas vezes desafiam as leis da física. Nada que não tenhamos visto antes. O seu diferencial está no que trouxe dos quadrinhos. Deadpool quebra a quarta parede diversas vezes para se dirigir aos leitores e muitas vezes demonstra saber que está em uma história em quadrinhos e que nada daquilo é real, coisa que os roteiristas transpuseram de maneira bem competente para a telona. O filme ainda abusa do linguajar chulo e piadas quase do nível dos irmãos Wayans, além de nudez. Por incrível que pareça, há menos violência gráfica do que o esperado. Referências aos filmes dos X-Men não faltam e temos ainda, do lado dos mocinhos, Colossus (totalmente feito em um CGI bem decente e dublado pelo ator alemão Stefan Kapicic) e Míssil Adolescente Negasônico (Brianna Hildebrand), personagem criado para o filme. Completam o time o barman Weasel (T. J. Miller, de Transformers: A Era da Extinção, 2014) e o taxista Dopinder (Karan Soni, de Goosebumps, 2015). Já do lado dos vilões, além de Ajax, temos a mutante Angel Dust (Gina Carano, Velozes & Furiosos 6, 2013).

Deadpool é uma adaptação que cumpre o que promete e deve agradar a seus fãs,  mesmo que a maioria deles não possa assistir ao filme nos cinemas devido à alta censura. Mas é incerto dizer se atrairá a atenção do público que não o conhece, por mais que a Fox tenha feito uma excelente campanha de marketing divulgando-o. É um filme bem divertido, mas nada além disso. Vale lembrar que, a exemplo de praticamente todos os filmes de super-heróis da atualidade, há uma cena após os créditos que colocará um sorriso nos rostos da audiência, especialmente daqueles que entenderem a homenagem que ela traz.

Depois de participar do medonho filme do Wolverine, Deadpool ganhou outra chance

Depois de participar do medonho filme do Wolverine, Deadpool ganhou outra chance

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Caçadores de Emoção ganha nova roupagem

por Marcelo Seabra

Point Break poster

Da série “refilmagens desnecessárias de longas recentes”, chega aos cinemas Caçadores de Emoção: Além do Limite (Point Break, 2015), filme que reconta as aventuras de um agente infiltrado que acaba gostando dos suspeitos. Isso, muito antes de Velozes e Furiosos (The Fast and the Furious, 2001) repetir a fórmula, o que deixa uma produção de hoje com gosto de reprise. O que, no caso, é elevado à enésima potência, sendo apenas mais uma aventura chutada e cansativa em meio a tantas lançadas todos os anos.

No longa de 1991, tínhamos uma diretora criativa, Kathryn Bigelow, que conseguia mexer um pouco no lugar-comum, além de uma dupla carismática como protagonista: Patrick Swayze e Keanu Reeves. Nesta nova roupagem, o responsável atende por Ericson Core (quem?), profissional que funciona bem como diretor de fotografia, mas que não acrescenta nada como cineasta. Alguns trechos lembram vídeos de esportes radicais do YouTube, ou seja: interessantes, mas nada inovadores. As tomadas mais criativas são também as menos verossimilhantes, que tira o público da ação tamanho é o exagero.

Point Break cast

O outro ponto que funcionou melhor anteriormente diz respeito ao elenco. Agora, temos no papel de agente do FBI Luke Bracey, sujeito que traz no currículo G.I. Joe 2 (2013) e November Man (2014), dois dos piores filmes de seus anos. Duro e inexpressivo, o ator fica longe de Reeves, que era igualmente desprovido de emoções, mas balanceava com um certo charme, ou algo do gênero. Bodhi, o óbvio chefe da gangue, é o único que consegue soprar um pouco de vida no projeto, bem defendido por Edgar Ramirez (em cartaz em outra besteira, Joy, 2015). Os dois veteranos, trazidos para dar peso, se mostram constrangidos. Ray Winstone (de O Franco-Atirador, 2015) e Delroy Lindo (de Cymbeline, 2014) deviam ter contas vencendo e toparam a roubada. A belíssima Teresa Palmer (de Meu Namorado É um Zumbi, 2013) faz exatamente o que as principais atrizes da temporada evitam: serve apenas como colírio para o público masculino, usada quando é necessária.

A trama, que mantém os elementos básicos de Rick King e W. Peter Iliff, foi modernizada por Kurt Wimmer, que vem de outra refilmagem desnecessária e mal sucedida: O Vingador do Futuro (Total Recall, 2012). Modernizar, no caso, significa trazer todo tipo de esporte radical, já que apenas o surfe original não seria suficiente. Para isso, foi criada uma espécie de filosofia em que um maluco propunha desafiar a natureza em oito provas, as Oito de Ozaki. Com tudo muito mal explicado, descobrimos que os criminosos são uma espécie de gangue de Robin Hoods que têm essa motivação esdrúxula: completar as provas e se aproximar da natureza, descobrir o ponto de quebra do ser humano, vencer limites ou alguma besteira do gênero. O roteiro se vê na obrigação de ir cada vez mais longe, causando os tais exageros e várias outras inconsistências, já que as ações do agente dependem da conveniência. Vai prender ou não vai? Nunca sabemos.

Johnny Utah, o tal agente, é uma incógnita. Uma tragédia fajuta o faz abandonar tudo, sumir por anos e aparecer dentro do FBI, no exato momento de assumir uma missão que é a cara dele. Todos no Bureau, sem exceção, são malas que não param de falar para deixar claro que não acreditam nas teorias de Utah. Ah, não, há uma exceção: o chefe que vai lutar contra tudo e contra todos para permitir a missão, fazendo o batido discurso de “colocar o seu na reta”. Bodhi, o contraventor, é apresentado de forma que já sabemos exatamente de quem se trata e o que vai acontecer, cabendo a Ramirez a difícil missão de trazer alguma dimensão ao personagem. Mesmo com essa filosofia rasa e confusa. Por que alguém seguiria esse suicida? E a química entre Ramirez e Bracey inexiste, enquanto Swayze e Reeves pareciam praticamente um casal.

Reeves & Swayze In 'Point Break'

Essa era a dupla original: Reeves e Swayze

 

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Entenda a crise financeira com A Grande Aposta

por Marcelo Seabra

The Big Short poster

Um dos destaques da atual temporada de premiações está em cartaz no Brasil e de fato merece a atenção que vem recebendo. A Grande Aposta (The Big Short, 2015) reúne um elenco muito bem escolhido e entrosado para enfiar o dedo em uma ferida recente que atingiu os Estados Unidos e, na sequência, o mundo: a crise financeira de 2007/2008. Misturando humor e drama de forma equilibrada, o longa diverte, informa e indica que tudo pode estar perto de se repetir. Aparentemente, não se aprendeu nada com o episódio.

O roteirista Charles Randolph, que teve sua estreia no Cinema com A Vida de David Gale (The Life of David Gale, 2003), mais uma vez entra em um projeto que apresenta uma The Big Short booksituação que pode e deve levar a discussões importantes. O jornalista e escritor Michael Lewis já havia tido duas adaptações de livros seus: Um Sonho Possível (The Blind Side, 2009) e O Homem Que Mudou o Jogo (Moneyball, 2011). Dessa vez, ele deixou de lado os esportes e virou seu olhar para as altas finanças e a bolha do mercado imobiliário que levou a um dos maiores colapsos da história, que quebrou muitas empresas e fez muita gente perder as economias de uma vida inteira.

Unindo-se à produção, o diretor Adam McKay reescreveu o texto de Randolph e conseguiu mais um acerto em uma carreira marcada por altos (O Âncora, 2004) e baixos (Quase Irmãos, 2008). Com uma montagem ágil, ele mistura imagens da época para situar o público no que estava acontecendo, preocupando-se em ser didático sem ser cansativo. Ao contrário do ótimo Margin Call (2011), que se foca em um caso exemplar, A Grande Aposta ataca logo o cenário completo, sem medo de deixar claro que a crise foi causada por muita gente de mau caráter que levava as falcatruas com imóveis a um extremo que chegava a ser ridículo. Não há heróis nesse universo, há apenas graus de falta de ética, moral e até de empatia com os inocentes que era lesados. E os responsáveis ainda tentam se justificar, criando historinhas para desculpar tais práticas abomináveis.

O longa apresenta alguns personagens que serão fundamentais para montar a situação. O controlador de fundos que descobre a jogada da valorização de hipotecas que não darão em nada e aposta contra com o dinheiro de seus investidores é vivido pelo eterno Batman Christian Bale, papel que lhe valeu diversas indicações a prêmios como ator coadjuvante. Outros habitantes importantes desse mundo são interpretados por Steve Carell, Ryan Gosling, John Magaro, Finn Wittrock e Brad Pitt, além de vários técnicos e assistentes. Pitt é inclusive produtor e pode levar seu segundo Oscar de melhor filme (depois de 12 Anos de Escravidão, 2013).

Como uma fala do próprio filme afirma, o mercado financeiro se valoriza criando termos técnicos difíceis. Por isso, há explicações básicas e bem humoradas, que utilizam legendas oportunas e celebridades para passar a mensagem, provando que qualquer um consegue entender o que há debaixo daqueles jargões. Os diálogos com a câmera causam mais risos do que compreensão, derrubando a quarta parede de forma muito engraçada. Vez ou outra, há algo mais profundo que demanda nossa atenção, como a metáfora da auditora que usa óculos escuros enquanto mantém a postura de correta e os tira quando entrega a canalhice que sua empresa perpetra. Michael Lewis já foi acusado de mexer nos fatos que narra e até isso vira piada, já que um personagem explica em certo momento que as coisas não aconteceram exatamente daquele jeito. E o bom uso da trilha sonora só coroa uma obra rica e interessante.

The Big Short cast

Gosling, Bale, Carell e Pitt formam o elenco principal

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Mulder e Scully estão de volta ao Arquivo X

por Rodrigo “Piolho” Monteiro

X Files 2016 poster

Entre 1993 e 2002, Arquivo X (The X Files) fez a alegria dos fãs de ficção científica. A série, criada por Chris Carter, mostrava o dia a dia dos agentes Fox Mulder (David Duchovny, de Californication) e Dana Scully (Gillian Anderson, de The Fall) investigando casos inexplicados pelo FBI. Ao longo de suas nove temporadas, a série explorou praticamente todas as teorias de conspiração presentes no imaginário popular – especialmente no norte-americano – com um foco especial naquelas envolvendo a presença de alienígenas em nosso meio, controlando nossas vidas e preparando o planeta para uma futura dominação. E os aliados seriam os principais chefes de estado mundiais e, claro, todos os presidentes americanos desde o famoso Caso Roswell.

Para aqueles que viveram em uma caverna nas últimas seis décadas, há uma teoria popular que diz que, em 1947, uma nave alienígena teria caído nos arredores de Roswell, Novo México, EUA. O governo e o exército americanos teriam recolhido os destroços e os corpos remanescentes na nave e levado tudo para a instalação militar secreta conhecida como Área 51 e realizado testes tanto com os alienígenas (cadáveres e sobreviventes) quanto com a tecnologia recuperada desde então. Experimentos em massa com humanos, seres lendários, mutantes e eventos sobrenaturais e paranormais também faziam parte do dia a dia da dupla de agentes.

X Files 2016

Depois de sete temporadas excelentes, Arquivo X começou a perder fôlego à medida em que Duchovny e Anderson resolveram se afastar da série, sendo substituídos por Robert Patrick (o eterno T-1000 de O Exterminador do Futuro 2, atualmente na série Scorpion) e Anabeth Gish (de The Bridge). A série acabou perdendo audiência, já que era primariamente a química entre o crente Mulder e a cética Scully que servia como motor. Após outros dois anos, com um breve retorno dos protagonistas clássicos, a série chegou a um final razoável. Não se passou muito tempo para que os fãs pedissem um retorno que, apesar de ensaiado em dois filmes, foi eternamente adiado.

Finalmente, no ano passado, Carter e o produtor Frank Spotnitz anunciaram que Arquivo X estaria de volta em uma minissérie de seis episódios trazendo o elenco original de volta, incluindo aí o diretor-assistente do FBI, Walter Skinner (Mitch Pileggi, de séries como Dallas e Sons of Anarchy). A questão que se colocou na época foi: será que, após 14 anos, Arquivo X seria relevante em um mundo que mudou tanto desde que vimos seu último episódio? Depois de ver os dois primeiros episódios da mini, não há dúvidas de que sim.

Joel McHaleSem querer entregar muito da história, a nova trama se apoia ainda no incidente com a nave alienígena em Roswell. Tudo começa quando um apresentador famoso na internet por suas teorias conspiratórias e seu posicionamento político radical, Tad O’Malley (Joel McHale, de Community – ao lado), tenta encontrar-se com Mulder, que vive recluso desde que se afastara do FBI, e Scully, atualmente atuando como cirurgiã em um hospital em Washington, visando usar o conhecimento dos dois para expor uma conspiração do governo americano que se utiliza de abduções simuladas e DNA alienígena para alterar a estrutura genética da população. As descobertas da dupla, no entanto, mostram que há mais aí do que as aparências levam a crer.

Trazendo todos os elementos presentes nos melhores momentos de Arquivo X, incluindo aí a química entre Anderson e Duchovny, a minissérie tem tudo para agradar os fãs antigos e atrair a atenção de novos, órfãos desse tipo de produção televisiva. O programa tem um apelo tão grande que, a exemplo de The Walking Dead, está sendo transmitido no Brasil um dia após ser exibido nos EUA. Ele estreou na Terra do Tio Sam no último domingo e no Brasil, via FOX, na madrugada de segunda, dia 25. Vale a pena perder uma horinha de sono para acompanhar esse retorno.

Em 1993, eles eram assim

Em 1993, eles eram assim

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Joy é mais uma parceria entre diretor e elenco

por Marcelo Seabra

JoyRepetindo a colaboração pela terceira vez, o diretor, roteirista e produtor David O. Russell reencontra parte do elenco de O Lado Bom da Vida (Silver Linings Playbook, 2012) e Trapaça (American Hustle, 2013) para mais um trabalho: Joy: O Nome do Sucesso (2015). Seguindo dois longas fracos, este novo consegue ficar em último, repetindo os lugares-comuns e o otimismo bobo que têm se tornado marca de O. Russell, que anda bem distante do tipo de humor e cinismo divertido que marcou o início de sua carreira. E este filme teve menos reconhecimento nas indicações a premiações que os anteriores, o que mostra que a paciência com Russell tem chegado ao fim.

Praticamente uma história de auto-ajuda para empreendedores, inspirada na vida da empresária americana Joy Mangano, Joy acompanha a jovem protagonista (Jennifer Lawrence) quando ela, ainda aos 25 anos, está separada, numa situação familiar complicada, sem perspectivas financeiras e com dois filhos para criar. O caos! Cuidando de todos à sua volta, Joy ainda tem tempo para ter ideias de produtos que poderão revolucionar o mercado. Isso, se ela conseguir uma oportunidade para lançá-los. E se seus parentes pararem de se intrometer na sua vida. Com uma mãe apática (Virginia Madsen, de O Reencontro, 2012) e uma avó motivadora de saúde delicada (Diane Ladd, da série Enlightened), seus problemas principais residem no pai (Robert De Niro), um sujeito estourado cheio de preconceitos, e na meia-irmã (Elisabeth Röhm, de A Bela e a Fera), uma invejosa que sempre tenta levar vantagem.

J Lawrence

Joy é uma mulher forte, que se recusa a aceitar o papel de vítima, por mais que fique abatida em alguns momentos. Apesar da obviedade e chatice do roteiro (de O. Russell e Annie Mumolo, de Missão Madrinha de Casamento, 2013), este é o tipo de personagem que pode ser um presente para um ator. Se tudo é muito convencional, os diálogos são quadrados e não há muita chance de fugir do caminho previsto, a qualidade do intérprete aparece. E Jennifer Lawrence leva o trabalho a sério, principalmente durante as dificuldades enfrentadas em cena. É graças a ela que o resultado não é pior. Joy consegue ter nuances interessantes, com suas atitudes e expressões, e Lawrence acerta o tom na maior parte do tempo. Apenas caminhando para o fim a atriz parece um pouco perdida quanto ao que fazer. E as mudanças bruscas da personagem não ajudam. Ela às vezes é uma menina desamparada, noutras é uma leoa que fará o impossível.

A De Niro e Isabella Rossellini (de O Homem Duplicado, 2013), que vivem o pai de Joy e a namorada, cabem personagens intragáveis, que você torce para passar a vida sem encontrar. Bastante formulaicos, têm diálogos pavorosos e suas ações mudam com o vento, de acordo com a situação, e chegam a dar raiva, tamanha a estupidez. Sobra para Edgar Ramirez (de Livrai-nos do Mal, 2014) e Dascha Polanco (de Orange Is the New Black), o ex-marido e a amiga de Joy, apoiá-la, o que eles fazem dentro das possibilidades do roteiro. O outro grande nome do elenco é Bradley Cooper, que aqui encara uma participação menor que nos outros filmes do diretor, apenas mostra a cara e dá um alô. O suspense feito na hora de revelá-lo é incompreensível e ele some tão logo não seja mais necessário.

O diretor imprime no longa um clima de novela nada sutil, e já sabemos que virá um dramalhão pela frente. Com a mãe de Joy acompanhando uma novela padrão, é como se O. Russell não confiasse em seu espectador e tivesse que explicar tudo detalhadamente, e essa irritação é recorrente durante as duas horas de exibição. Se a intenção era fazer um filme bonitinho, motivacional, o máximo que ele conseguiu foi criar uma obra sem ritmo, cheia de mudanças bruscas, que deixa o público ansiando pelo fim.

O diretor orienta seus atores

O diretor orienta seus atores

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Rocky volta aos cinemas pela sétima vez

por Marcelo Seabra

Creed poster

Chega uma hora que não dá mais para colocar Rocky Balboa num ringue contra um oponente bem mais ágil e jovem. Deve-se arrumar outra desculpa. Pois foi o que fez o roteirista e diretor Ryan Coogler, chamando a atenção para o outro campeão desse universo: Creed – Nascido para Lutar (2015) foca no filho desconhecido do falecido Apollo Creed, o antagonista que se torna o grande amigo de nosso herói. Dessa forma, Coogler introduz Balboa para as novas gerações sem perder o carisma de seu astro, Sylvester Stallone, e ainda com o ótimo Michael B. Jordan.

Depois de cooperarem no elogiado Fruitvale Station (2013), o diretor e seu jovem protagonista, já recuperado do fiasco Quarteto Fantástico (Fantastic Four, 2015), voltam a criar um personagem crível, por quem podemos torcer mesmo tendo defeitos. Assim como Rey, do novo Star Wars (2015), Adonis Johnson não teve um mentor ou um treino apropriado para chegar onde queria. Lutando e malhando por conta própria, ele conseguiu uma certa fama no submundo de lutas clandestinas no México. Para ganhar projeção em seu país, procura ninguém menos que o nosso velho amigo, o “garanhão italiano”.

Creed scene

Sonhando construir um nome próprio e fugir da sombra do pai, Adonis esconde sua origem dos demais e, com o apoio de seu recém adquirido “tio”, começa a maratona. De cara, conhecemos aqueles que serão seus oponentes e já temos uma boa ideia do que virá pela frente. Mas, assim como em Star Wars, o que importa é a jornada: como o rebelde se tornará um ícone? E como homenagear uma série cinematográfica longa sem ser piegas, respeitando as regras já apresentadas, e ainda levá-la adiante? Esses são os desafios que Coogler e seu co-roteirista, o estreante Aaron Covington, conseguem vencer, para a felicidade de quem acompanha Rocky há alguns anos – ou décadas.

O tema clássico, Gonna Fly Now, de Bill Conti, é revelado através de indícios aqui e ali, mas a vontade de abusar dele é contida. O compositor sueco Ludwig Göransson (de Community) consegue se segurar e buscar um tema específico para Johnson. A música acaba refletindo o filme: alguns traços repetidos do primeiro filme, mas diferente o suficiente para caminhar sozinho. Volta e avança num curto espaço de tempo, enfatizando mais a vida na Filadélfia e seus pontos turísticos. A fotografia urbana é muito bonita, transmitindo a sensibilidade feminina de Maryse Alberti (de A Visita, 2015) numa obra essencialmente masculina. Não que o público feminino não possa gostar, há uma história bonita por trás dessa testosterona toda. Mas o suor e o sangue espirrados nos ringues devem atrair mais homens aos cinemas.

Ao contrário de outros jovens talentos – como Milo Ventimiglia no episódio anterior – que somem perto de alguém com a presença de Stallone, Jordan reafirma sua força, mostrando-se uma escolha muito acertada para o papel. Sua transformação física é assustadora, exibindo músculos que não existiam em seus trabalhos mais recentes. E o veterano ítalo-americano está em uma de suas melhores atuações, tendo inclusive levado alguns prêmios, como o Globo de Ouro e o da National Board of Review. Veremos se será dessa vez que ele leva um Oscar pra casa. E já começa a torcida por mais uma aventura de Rocky Balboa.

Mesmo envelhecido e mais cheio, Stallone ainda é "o" campeão

Mesmo envelhecido e mais cheio, Stallone ainda é “o” campeão

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Os 6 Ridículos prova que o Netflix também erra

por Rodrigo “Piolho” Monteiro

The Ridiculous 6 poster

Desde que entrou no mercado com suas produções originais, o Netflix prometia ser uma espécie de versão streaming da HBO no que diz respeito à qualidade do que apresenta. Séries como House of Cards, Orange is the New Black, Demolidor e Jessica Jones, só para citar as mais famosas, mostraram que o Netflix tem bastante cuidado no que investe quando produz conteúdo original. Esse mesmo cuidado com a qualidade de seus produtos era algo que se esperava também quando o Netflix começou a produzir filmes originais, além de séries. Beasts of No Nation, estrelado por Idris Elba (Luther, Thor) parecia indicar que essa tradição seria seguida também nos seus longas. Aí o Netflix resolveu fazer uma parceria com a Happy Madison, de Adam Sandler. Desnecessário dizer que o primeiro resultado dessa parceria ficou dentro do esperado, ou seja, traz o selo de qualidade de Sandler. O que, todos sabemos, só pode ser algo bem ruim, que abusa da inteligência e da paciência do espectador. Os 6 Ridículos (The Ridiculous 6, 2015) pode não ser péssimo, mas é mais um produto descartável na longa carreira de filmes descartáveis estrelados por Sandler.

Co-escrito pelo próprio Sandler e seu parceiro de longa data, Tim Herlihy, Os 6 Ridículos tenta pegar inspiração dos faroestes italianos dos anos 1960 e começa quando somos apresentados a Faca Branca/Tommy Stockburn (Sandler), um garoto branco que fora adotado por uma tribo de índios após sua mãe ter sido assassinada. O simples fato de ser um branco adotado por índios, como todos sabemos, faz com que a criança adotada, ao crescer, desenvolva “poderes místicos”. No caso de Sandler, ele desenvolve supervelocidade, uma mira perfeita e certas capacidades telepáticas das quais, sabe-se lá porque, ele se esquece quando o roteiro pede.

Faltando poucos dias para que Faca Branca se case com Raposa Quente (Julia Jones, da série Crepúsculo), o pai que ele não conhecia, Frank Stockburn (Nick Nolte, de Noé) aparece do nada na tribo para revelar a Tommy um grande segredo. Ao longo de sua vida, Frank fora um fora-da-lei e, agora que sofre de uma doença fatal, quer dividir a fortuna que amealhou com o filho. Para isso, precisa da ajuda de Faca Branca para desenterrar os US$ 50.000 da base de um pinheiro localizado a poucos quilômetros da tribo. Apesar de não querer o dinheiro, Faca cede ao argumento do pai e decide ajudá-lo.

The Ridiculous 6 scene

Coincidentemente (ou não), na manhã em que a dupla está partindo, a tribo supostamente isolada é visitada pela gangue de Frank. Liderada por Cícero (Danny Trejo, de Machete), a gangue quer justamente o dinheiro que Frank enterrara e que, segundo Cícero, deveria ser dividido igualmente entre os membros do bando. Hesitantemente, Frank decide levar seus ex-parceiros aonde o dinheiro estaria enterrado, mas, ao invés de dar a localização do pinheiro, diz que ele está escondido aos pés de um moinho que ficaria a 10 dias de cavalgada. Vendo o pai que conhecera há menos de um dia nessa situação, Faca Branca decide, novamente, ajudá-lo. Assim, após procurar pelo tal pinheiro sem sucesso, elabora um plano “brilhante”: vai usar seus dons para assaltar bancos em diversas cidades até conseguir os 50 mil que seu pai deve à gangue e alcançá-los antes que cheguem ao tal moinho.

Assim que vai assaltar o primeiro banco na primeira cidade, Faca/Tommy descobre que seu pai passara por lá quando mais jovem e deixara a dona da pensão grávida. Do relacionamento dos dois nasceu Ramon (Rob Schneider), que, assim que descobre ser meio-irmão de Tommy, resolve ajudá-lo em seu plano para impedir que o pai que não conhece seja morto por membros de sua gangue. Na mesma cidade, Tommy e Ramon trombam com Lil’ Pete (Taylor Lautner, da série Crepúsculo), um roceiro com certo retardo mental que, adivinha só, também é filho de Frank. Pete também decide ajudar Tommy em sua missão.

Não demora muito e o trio acaba cruzando com o mudo (e também meio ruim da cabeça) Herm (Jorge Garcia, o Eterno Hurley de Lost), que também é filho de Frank e também resolve ajudar Tommy. Na próxima cidade a assaltarem, o agora quarteto acaba trombando com Danny (Luke Wilson, de Deixa Rolar, 2014) que, sim, também é filho de Frank, e Chico (Terry Crews, da série Os Mercenários). Pra variar, Chico é mais um filho de Frank. Os 6 Ridículos (alcunha que lhes é atribuída por autoridades da região) estão prontos para arriscar sua liberdade – e suas vidas – por um pai que não conhecem e que os abandonara quando crianças.

Daí pra frente, o filme apresenta as mesmas características de qualquer produção da dupla Sandler/ Herlihy: piadas envolvendo fluidos corporais, soluções sem sentido para situações sem sentido e imensos furos em uma trama que já é bastante furada. Pelo fato de ser um filme ambientado no Velho Oeste, ainda temos o desprazer de ver figuras históricas “homenageadas”: David Spade (da série Rules of Engagement), Blake Shelton (cantor country jurado do American Idol) e Vanilla Ice (o rapper dos anos 1990) vivem, respectivamente, o General Custer (famoso oficial do exército americano durante a Guerra de Secessão), Wyatt Earp (xerife lendário no oeste americano) e o escritor Mark Twain em participações que devem ter feito os homenageados se revirarem em suas tumbas. Will Forte (da série Last Man on Earth), Steve Zahn (de Clube de Compras Dallas), Harvey Keitel (O Grande Hotel Budapeste), Jon Lovitz (Gente Grande 2), Steve Buscemi (Boardwalk Empire), John Turturro (Êxodo: Deuses e Reis), além da esposa de Sandler, Jackie, e seus filhos completam o elenco em participações que variam de vergonha alheia a “estou nessa só pela grana”.

No fim das contas, Os 6 Ridículos não foge em nada do que Adam Sandler geralmente entrega a seu público (que, por algum motivo, continua privilegiando seus filmes). Não é nada tão ruim quanto os filmes que os irmãos Wayans produzem, mas também não vale as quase duas horas que se gasta para assisti-lo. E espere ver mais de Sandler e seus filmes de qualidade duvidosa no Netflix, já que o site e sua Happy Madison têm um acordo para produzir mais três filmes a serem exibidos exclusivamente ali. Esperemos que isso signifique, pelo menos, que teremos menos filmes de Sandler ocupando salas de cinema que poderiam ter um uso melhor para seu espaço.

Nolte deveria estar precisando de dinheiro, enquanto Trejo tem sua cota de bombas

Nolte deveria estar precisando de dinheiro, enquanto Trejo tem sua cota de bombas

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Tarantino volta ao faroeste com Os Oito Odiados

por Marcelo Seabra

The Hateful Eight poster

Em várias ocasiões, Quentin Tarantino deixou clara a sua admiração pelo faroeste, gênero que acompanha desde pequeno. Principalmente os italianos, dos clássicos aos menos visados. Por isso, não foi surpresa quando descobrimos que ele faria Django Livre (Django Unchained, 2012), longa extremamente elogiado e premiado. E o próximo trabalho do diretor e roteirista acabou sendo outro faroeste: Os Oito Odiados (The Hateful Eight, 2015), já em cartaz no Brasil. Humor, violência e diálogos afiados, tudo dentro de um cenário simples e com um elenco mais do que conhecido.

O longa começa em alta, com um tema majestoso do maestro Ennio Morricone, que tem mais de 500 créditos como compositor, dentre eles vários trabalhos com o consagrado Sergio Leone e com o próprio Tarantino, com quem chegou a afirmar que não voltaria a trabalhar devido à falta de coerência no uso da trilha. O cenário gélido dá o tom do que teremos pela frente: uma nevasca faz um grupo de indivíduos com pouca ou nenhuma ligação parar numa hospedaria e é lá que a ação vai se desenrolar. A beleza da fotografia de Robert Richardson se revela aí, nas externas na neve, mas logo entra na casa e converte um cenário simples em algo opressor e claustrofóbico, mantendo sua genialidade. Antes da exibição do longa, acompanhamos um rápido documentário sobre o sistema Panavision 70mm e suas lentes anamórficas, que já dá uma ideia do espetáculo visual que virá – mesmo que entregue algumas cenas, o que é abominável. O detalhamento da composição da casa e a forma como cada elemento é mostrado é de encher os olhos.

The Hateful Eight leading

Para viver os oito confinados (que, na verdade, são nove, já que há um cocheiro), o diretor trouxe velhos conhecidos. A maioria dos atores já trabalhou com ele em outras oportunidades, inclusive mais de uma vez. Dessa turma, aparecem Tim Roth, Michael Madsen, Samuel L. Jackson, James Parks, Kurt Russell, Bruce Dern e Walton Goggins, e fecham o elenco principal os “novatos” Demián Bichir (de Machete Mata, 2013) e a ótima Jennifer Jason Leigh (de Versos de um Crime, 2013). A brincadeira com o título representa a carreira de Tarantino: o filme é anunciado como o oitavo do diretor, quando na verdade ele comandou nove (Kill Bill foi dividido, certo?). E há nove pessoas na cabana, cada um representando um estereótipo. É interessante notar a fragilidade das relações, já que os vários preconceitos envolvidos fazem os personagens mudarem de lado assim que percebem características nos outros que eles não toleram. Este tipo de crítica não é raro na filmografia do diretor, que frequentemente aponta o dedo para a estupidez alheia.

Com uma trama que pode ter bebido na fonte de O Caso dos 10 Negrinhos, ou mesmo do jogo Detetive, Tarantino vai revelando pouco, mais preocupado em construir melhor cada uma das personalidades, até para que o público se importe com elas. Flashbacks ajudam nessa elaboração, e há até encenações do que está sendo contado, mas ficamos invariavelmente sem saber se aquilo é de fato o que aconteceu. Os personagens de Samuel L. Jackson, Kurt Russell e Jennifer Jason Leigh parecem ser os principais, mas cada um tem seu momento para brilhar, numa divisão bem equilibrada.

Como sempre acontece em um filme de Tarantino, Os Oito Odiados tem diversos momentos engraçados, e outros tantos violentos, com sangue e miolos voando. E muitos onde os extremos se misturam, e rimos de nervoso com tamanho exagero na violência gráfica, o que pode gerar certo desconforto. Mas o resultado é fantástico: mesmo longo, com suas três horas de duração, funciona como uma alegoria brilhante, uma crítica feroz e um entretenimento dos melhores. Raras vezes o dinheiro do ingresso foi tão bem empregado.

O diretor levou seu elenco à Comic Con 2015 e exibiu um trecho do filme

O diretor levou seu elenco à Comic Con 2015 e exibiu um trecho do filme

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Surpresas e decepções de 2015

por Marcelo Seabra

Mad Max

Surpresas

Como já é tradição, vamos às grandes surpresas de 2015. E a lista tem dois tipos de produções: aquelas menores, das quais não se esperava muito até por falta de informação, e as grandes que conseguiram ir além de qualquer expectativa. Este segundo grupo não poderia ser encabeçado por nenhum outro filme se não Mad Max: Estrada da Fúria (Mad Max: Fury Road, 2015). O novo episódio da franquia de George Miller demorou décadas para sair e, desde então, vem ocupando posições privilegiadas em listas de melhores do ano. Com um novo Max Rockatansky, que responde por Tom Hardy, e uma personagem inédita, a Imperatriz Furiosa de Charlize Theron, Miller criou uma aventura acelerada, violenta e visualmente perfeita.

Ainda no grupo das super-produções, temos um novo herói Marvel de quem, assim como em Guardiões da Galáxia (The Guardians of the Galaxy, 2014), não se esperava muito. Paul Rudd emprestou todo o seu carisma a Scott Lang e criou um ótimo Homem-Formiga (Ant-Man, 2015), com muito apoio do veterano Michael Douglas e outros grandes nomes como coadjuvantes. Com a estrutura clássica de um filme de roubo, o diretor Peyton Reid conseguiu amarrar os retalhos que vinham sendo criados há anos em diversas encarnações do projeto e criou uma obra simpática, eficiente e divertida. Mesmo com o menor orçamento de todo o Universo Marvel.

No grupo dos filmes menores e excepcionais, temos como melhor exemplo Whiplash – Em Busca da Perfeição (2014). O longa leva mais longe a ideia que o diretor e roteirista Damien Chazelle já tinha adaptado em um curta, trazendo novamente J.K. Simmons no papel do professor do conservatório musical que não mede esforços para descobrir talento entre seus alunos, inclusive torturando-os psicologicamente. Milles Teller é o destaque entre os jovens e logo ganha a atenção do professor sádico. É o duelo entre eles a principal atração de Whiplash. Se Fletcher é um babaca consumado, logo fica claro que Andrew também não é uma pessoa fácil, e falamos de dois atores muito acima da média.

It Follows

Outras duas produções independentes que coincidiram no gênero foram The Babadook (2014) e Corrente do Mal (It Follows, 2014). Ambas se preocupam mais em criar uma atmosfera de terror do que em dar sustos, e seus personagens são desenvolvidos o suficiente para nos importarmos com eles. Em The Babadook, temos uma mãe lutando contra seus traumas para viver bem e criar seu filho. Um dia, eles descobrem o livro sobre um certo Sr. Babadook, um monstro que mais parece um espírito obsessor, e as coisas começam a ficar mais estranhas a ponto de eles acharem que não se trata apenas de ficção. Corrente do Mal acompanha uma jovem que, após um encontro com o namorado, descobre ter recebido uma maldição: esse sim, um obsessor que não descansará até matá-la, ou até que ela passe a maldição adiante.

Nos dois casos, temos metáforas para coisas da vida, dificuldades que enfrentamos em determinadas épocas, ou após certos eventos. A dolorosa perda do marido e a passagem pela adolescência, geralmente confusa e cheia de possibilidades e questionamentos, servem como oportunidade para seus diretores criarem longas assustadores e bem construídos. Barato, nos dois exemplos, não é sinônimo de porcaria, muito pelo contrário.

Decepções

Fantastic Four

Depois de dois filmes ruins nos quais foram gastos milhões de dólares, sem falar na malfadada tentativa de Roger Corman, o Quarteto Fantástico (The Fantastic Four, 2015) teve outra chance. Com o promissor Josh Trank à frente e um elenco dos sonhos de qualquer fã de quadrinhos, encabeçado por Milles Teller, a produção só poderia dar certo. Mas devido a um orçamento cortado, um estúdio palpiteiro, um diretor de gênio difícil, ou qualquer que seja a razão, o resultado conseguiu deixar muita gente com raiva. Tudo é acelerado, fica sem pé nem cabeça e praticamente todas as oportunidades criadas se perdem. E a continuação, pré-aprovada, deve ter sido esquecida.

Outro personagem a ganhar uma nova chance no Cinema foi o T-800 de Arnold Schwarzenegger. Arrumaram até uma boa desculpa para a volta do ator, já que o modelo de exterminador estaria obsoleto. Insistindo num humor fora de hora, O Exterminador do Futuro: Gênesis (Terminator Genisys, 2015) não acerta o tom e perde a interessante premissa de revisitar o primeiro filme com ligeiras alterações. No meio do caminho entre uma continuação e um reboot, eles conseguem desperdiçar um vilão novo e vários bons atores. E, mais uma vez, sabemos de cara que a história não vai avançar, o que reforça a sensação de tempo perdido.

Jupiter Ascending

Não necessariamente uma decepção se converte em um dos piores filmes do ano, já que ele apenas não alcançou as expectativas criadas. No caso de O Destino de Júpiter (Jupiter Ascending, 2015), deu na mesma sim. De longe uma das coisas mais catastróficas exibidas esse ano, essa bomba veio da cabeça dos irmãos Wachowski, que torraram algo em torno de 175 milhões de dólares para essa ópera espacial visualmente exagerada e conceitualmente sem o menor sentido. Com atores claramente constrangidos, personagens sem nenhum propósito e diálogos terríveis, O Destino de Júpiter nos faz questionar a sanidade de certos produtores de Hollywood, que dão sinal verde pra esse tipo de coisa.

Sabe-se que o gênero comédia é um dos mais difíceis de se fazer, e um dos menos valorizados. Mas, também o que tem de comédia ruim por aí é brincadeira. E nem vou entrar no mérito da Globo Filmes porque larguei as drogas. A Entrevista (The Interview, 2014) – o que foi aquilo? Uma premissa razoavelmente interessante, algo como uma paródia de Frost/Nixon (2008), que se perde totalmente em situações ridículas e piadas de banheiro, desperdiçando James Franco e Seth Rogen. OK, nenhum dos dois é nada fantástico como atores, mas certamente mereciam mais que essa farsa sobre um apresentador de TV que consegue uma entrevista exclusiva com o ditador da Coréia do Norte. Como castigo para a Sony, vários e-mails do estúdio foram vazados e toda uma situação problemática foi criada.

Para quem era fã da família Griswold, ver o novo Férias Frustradas (Vacation, 2015) foi um balde de água fria. Apostando na nostalgia relacionada à série e no talento de Ed Helms e Cristina Applegate, o longa se resume a repetir a aventura de 1983 com uma diferença básica: não tem graça nenhuma. Ou seja: não agrada aos fãs, já que não há novidade, e não consegue cativar um público renovado, pois não há o que se ver ali. Ao menos, a armadilha funcionou: Férias Frustradas teve boa bilheteria e deve ter uma continuação. Rezemos para que ela vá mais longe.

Vacation

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