Além das várias adaptações que chegam todos os anos aos cinemas e à TV da obra de Stephen King, temos também o filho dele atacando nesse filão. Depois dos espaçados Amaldiçoado (Horns, 2013) e Campo do Medo (In The Tall Grass, 2019), chega à telona essa semana O Telefone Preto (The Black Phone, 2022), adaptação do conto que Joe Hill publicou em 2004. O próprio escritor se disse muito feliz com a adaptação, que expandiu um pouco o texto original, mas manteve a essência intacta.
Premiado e há muito desvinculado da fama do pai, Hill criou uma história cativante e inventiva. A semelhança com a clássica It – A Coisa (de King) pode incomodar. Trata-se de um drama sobrenatural sobre um psicopata sequestrando e matando crianças numa cidadezinha. O palhaço assassino milenar dá lugar a um mágico fajuto que roda pela cidade com seu furgão cheio de apetrechos para festas infantis. Esse disfarce acoberta os sequestros e várias crianças vão parar nos avisos de desaparecidos colados nos postes. Capa e botas de chuva e a presença de James Ransone no elenco novamente acenam a It.
Aqui, ao invés de um grupo, temos como protagonistas um casal de irmãos que se preocupam com os desaparecimentos enquanto cuidam das questões diárias, menores, como valentões caçando confusão. Finney (Mason Thames, em seu primeiro filme) e Gwen (Madeleine McGraw, de Homem-Formiga e a Vespa, 2018) se apoiam e aturam um pai violento e alcoólatra (Jeremy Davies, de Deuses Americanos). Gwen tem sonhos premonitórios, como a mãe tinha, e o pai a censura. Os jovens atores, ótimos, são o coração do filme, a química entre eles é inexplicável.
Não convém entrar em detalhes sobre a trama, apenas é bom explicar que o telefone preto do título permite comunicação com os mortos, o que traz uma boa dose de suspense e sustos. E ajuda muito ter, no papel do psicopata, alguém do calibre de Ethan Hawke (de Cavaleiro da Lua), assustador mesmo com o rosto parcialmente coberto. O ator confere camadas ao personagem, que segue regras que ele mesmo criou, o que reforça os distúrbios mentais que ele tem. Correndo por fora, temos outro vilão: o pai abusivo. Davies, de O Resgate do Soldado Ryan (1998) e Helter Skelter (2004), faz um caipira covarde com os pés nas costas, e causa bastante revolta.
Depois de abandonar a direção da sequência de seu Doutor Estranho (2016) por diferenças criativas, Scott Derrickson se viu livre para assumir outro projeto e voltou para o gênero no qual já deu muito certo. Com longas como O Exorcismo de Emily Rose (2005) e A Entidade (2012) no currículo, o diretor acerta novamente contando uma história envolvente, com boa carga dramática e uma tensão crescente. Derrickson também assina o roteiro, ao lado do parceiro habitual C. Robert Cargill, e é produtor.
A julgar pela qualidade de O Telefone Preto, já se criam expectativas por novas adaptações da obra de Hill. Além dos cinemas, ele já teve sucesso na TV, com as séries NOS4A2 (ou Nosferatu) e Locke & Key. Não faltam novas histórias para serem usadas. Só no livro onde Telefone Preto foi publicado, Fantasmas do Século XX, há outros 12 contos. Qualquer dia, teremos uma batalha nas bilheterias entre pai e filho.