Um país sem leis ou com leis brandas. Um judiciário precário, omisso ou conivente. Um paraíso para os criminosos, o purgatório para os cidadãos.
Uma mistura explosiva de ignorância, incompetência, descaso e corrupção. Muita corrupção! Esta é a síntese do arcabouço legal brasileiro. Esta é a realidade na qual eu, vocês, nossos amigos e familiares estamos inseridos e sendo submetidos, diariamente, há décadas. O fato, amigos, é que a cada dia o país nos maltrata mais, nos humilha mais, e destrói um novo pedaço dos nossos presente e futuro. Uma situação onde ficamos à revelia das decisões e das atitudes espúrias daqueles que detém o poder, a caneta e as armas. Somos reféns indefesos diante déspotas do Direito.
A Rede Globo começou a exibir outra brilhante série (Ah!, se a Globo fizesse jornalismo como faz novelas…), uma obra de ficção baseada numa realidade perversa que é a justiça brasileira. Vivemos numa terra sem lei, ou com lei seletiva. Vivemos num antro de selvageria onde o Estado se omite: ou por covardia, ou por descaso ou por total incapacidade. Seja lá por que for, a vítima somos sempre nós, a população civil indefesa perante criminosos de toda sorte — com ou sem farda, com ou sem cargo, com ou sem armas!
Todos, infelizmente, já vivenciamos na pele (ou pelo menos conhecemos casos próximos) o poder judiciário atuando em conluio com a injustiça ou com a criminalidade e devastando as nossas vidas. Uma batida de trânsito, uma briga de vizinhos, um funcionário mentiroso, uma dívida não paga, um divórcio, um roubo, um assassinato… Meu Deus!, poderia ficar dias dando exemplos de como o judiciário brasileiro protege o mau e castiga o bem. Sejam as decisões selvagens da tal “justiça do trabalho”, sejam ainda os míseros 5% dos casos de assassinatos que são investigados e totalmente resolvidos no país. Sim! Apenas 5 em cada 100 crimes de morte são efetivamente punidos.
É desolador viver num país onde um bêbado atropela e mata uma mãe e nada lhe acontece; ao mesmo tempo em que um motorista, que tomou duas latas de cerveja, é pego em uma blitz e passará os próximos anos respondendo a intermináveis processos. Ou onde um office-boy processa uma empresa que sequer lhe contratou, e recebe R$ 100 mil por danos quaisquer; ao mesmo tempo em que o empresário que reteve o INSS de mil trabalhadores, sem repassá-lo à União, escapa de uma condenação criminal por causa da prescrição da pena diante da demora do processo. E agora, mais recentemente, nos pegamos assistindo às duas maiores cortes do país, STJ e STF, envolvidas em denúncias de corrupção, venda de sentenças e favorecimento pessoal.
Quem as investigarão? Quem as julgarão? Quem as punirão? Eles próprios?!? Que piada de mau gosto!
Voltando à série “JUSTIÇA”, assistiremos a uma pequena fração da barbárie urbana brasileira. Barbárie esta que, ao contrário do que parece, não distingue gênero, cor, religião ou condição socioeconômica. Notem que chamo de “barbárie” a situação como um todo. Não me refiro somente aos linchamentos, guerras do tráfico, etc. O sistema jurídico-legal por completo é bárbaro! Desde os criminosos e seus crimes, passando pelas leis e os juízes, até a conhecida impunidade ou as nossas masmorras medievais chamadas de presídios. Um preso decapitado em Pedrinhas, no Maranhão, faz parte do mesmo sistema que penhora a conta de um empresário para obrigá-lo a pagar uma dívida trabalhista que não contraiu, ou do que permite que um corrupto, que desviou U$ 200 milhões da Petrobras, passe apenas 3 anos recluso em sua própria casa com piscina e quadra de tênis, ou ainda do que impede a prisão de um “di menor” de 17 anos e 11 meses que estuprou, esquartejou e ateou fogo em uma adolescente de 14 anos.
Pessoas passam a vida — e morrem! — sem terem seus direitos julgados quando demandam contra o Estado. Por outro lado, este mesmo Estado invade a conta corrente do contribuinte, bloqueia indiscriminadamente seu patrimônio e, no limite, manda enjaular aquele a quem julga rapidamente quando lhe convém. Dentre tantos outros surtos de violência, um em especial cresce por todo a nação: o linchamento. E não por acaso, não sem razão. Quando a população não tem a quem recorrer, ela própria se dá o direito de julgar e punir. De onde parte a selvageria, então? Do povo ou do Estado?
Perdoem-me pelo mal-estar que o assunto causa. Perdoem-me também pelo tamanho do texto. Mas está cada vez mais difícil aceitar calado tudo isto. Está cada vez mais difícil tocar a vida fingindo que nada está acontecendo ao redor. Não sei quanto à vocês, mas tenho me sentido cada vez pior. E nossos amigos , os “Capas Pretas” de Brasília, não andam ajudando nadinha de nada. Na boa… Tá osso!!
Falar o que mais? Voce falou tudo.Falou por nós,pobres cidadãos comuns desamparados de nossas leis. Por tudo que já ví e vivi,nunca acreditei na justiça no Brasil,mas sempre pensei que poderia haver justiça em alguns casos. Depois que assisti,uma jovem,matar os pais e no dia dos pais,receber indulto,desacreditei totalmente da justiça. Cabeça de juiz é uma incógnita. Um juiz beneficiar uma criminosa que matou o pai,exatamente com indulto para comemorar o dia dos pais é demais né?! Onde está a justiça deste país? Já não importa,aprendemos na marra,que temos de viver sem esperar nada dela. A Globo está nos fazendo ver que é assim mesmo.Parabéns pelo texto, excelente como sempre são todos. Abçs
Obrigado, Marcia! Sempre muito gentil e inteligente nos comentários.
Boa tarde amigo,gostei de cada palavra, cada letra empregada nesse texto,não mudaria nada se fosse eu o interpelado, portanto digo que a saida está na impressa, por que o povo eles não ouvem e fingem que ouvem antes das eleições e depois já era, Democracia mascarada que tentar enfiar goela abaixo do povo.
Isso aí!
Ricardo, cuidado cara. Você lembra o que aconteceu com os jornalistas do sul do país, se não me engano do Paraná, que tiveram ações movidas contra eles (por juízes) e passaram a viajar, gastar com hotéis e um sem fim de transtornos devido a críticas aos salários do judiciário paranaense. Cuidado velho, boca fechadoa não entra mosquito. Bom ler seu blog. Abraços.
Afonso, obrigado pelo prestígio e pelo conselho. Mas na boa, se a coisa chegar a este nível… aí o país acabou de vez! Meu intuito aqui, já que não recebo nenhum tostão nem sou candidato a coisa alguma, é tão somente dividir minhas opiniões, angústias, sentimentos diversos com todos vocês. Me faz sentir-me melhor e mais aliviado. Por isto, meu velho, vou adiante!! Abração!!
O texto reflete, sem dúvidas, grandes problemas existentes em nossa sociedade (certamente os maiores), mas. com o merecido respeito ao autor, excede nas críticas ao Poder Judiciário, que, hoje, em regra, atua como pode (dentro das suas limitações institucionais) para (tentar) evitar o desgoverno dos ineficientes Poderes Legislativo e Executivo (únicos responsáveis por TODAS as mazelas descritas no artigo, com exceção da suposta venda de decisões). As críticas ao Judiciário foram inundadas de paixão e, mais uma vez destacando o respeito pelo autor, não refletem a realidade das decisões judiciais em nosso país (ou pelo menos não refletem a maioria esmagadora delas). Acho interessante ponderarmos para não empurrarmos a sociedade contra quem, atualmente, é um dos maiores apoios para o povo, mas que não tem em suas mãos o “poder” de alterar as mazelas descritas no artigo. Se tivesse, certamente o Judiciário faria e, mesmo sem ter, vem tentando fazer, a exemplo da decisão proferida pelo Supremo Tribunal Federal na ADPF 347 MC/DF.
Gosteria de ler a opinião do Guilherme sobre o indulto concedido à assassina dos pais.
Prezado Afonso, é um prazer dialogar com você.
De início, é importante destacar que o benefício concedido à Suzane não foi um indulto, mas sim uma Saída Temporária. É importante fazer essa diferenciação porque o indulto (este, sim, muitas vezes revoltante) é sempre concedido pelo Presidente da República (Poder Executivo), nunca pelo Poder Judiciário.
Quanto ao benefício concedido à Suzane, trata-se de um direito dela, dado pela lei. Se não concordamos com esse benefício, que reclamemos ao (ineficiente)Poder Legislativo, que é o Poder competente para conceder ou alterar direitos aos presos. Agora, uma vez que esse direito é concedido pelo Legislativo, não cabe ao Judiciário negá-lo de forma arbitrária. Assim como todos nós, o Judiciário tem o dever de obedecer às leis e garantir os direitos dos cidadãos, sejam eles quem forem. E esses direitos são dados pelo Poder Legislativo, e não pelo Poder Judiciário.
Na maioria das vezes, Afonso, o Poder Judiciário apenas cumpre o que o Legislativo determina (através das leis que ele, o Legislativo, cria). O Judiciário não pode contrariar essas leis, sob pena de estar ele, o Judiciário, cometendo também uma ilegalidade. Por mais bem intencionado que o juiz esteja, ele deve obediência à lei. Juízes ativos, que se colocam no lugar do Legislador, são arbitrários e indesejáveis. Você gostaria, como cidadão, que um juiz decidisse sua causa de acordo com o que ele acha correto? Acredito que não. Você quer que o Judiciário decida o seu caso fazendo o que a lei manda ele fazer.
Às vezes o Judiciário até encontra um espaço para agir além do que a lei determina, mas, nesses casos, ele tem que ter um espaço. É como aconteceu no exemplo que dei no meu comentário, quando o STF determinou que a União libere dinheiro para a reestruturação dos presídios. No entanto, no caso da Suzane, o juiz não tinha escolha. A lei (goste ele ou não) reconhece esse direito à Suzane e ele não pode fingir que esse direito não existe.
Quanto ao fato de ela ter assassinado os pais, isso já foi cobrado dela na pena que recebeu (bem superior a um homicídio comum). O fato de ela não ter pai não tira dela o direito a ter saídas temporárias. Caso fosse assim, presidiários que perderam os pais por outros motivos não poderiam também gozar da Saída Temporária. Eu sei que parece estranho o fato de ela ter saído no dia dos pais, mas é um direito dela e se, para negar a ela a Saída Temporária, formos considerar o fato de que ela matou os pais, estaríamos punindo ela duas vezes (uma ao aplicarmos a ela uma pena bem superior à que normalmente se aplica a um homicídio qualificado cometido por réu primário e outra ao negar o benefício da Saída Temporária) em razão de um mesmo fato. Essa dupla punibilidade não é aceita nas democracias mais avançadas.
Enfim, o que tentei demonstrar, Afonso, é que a Saída Temporária (não o indulto) é um direito da Suzane e o juiz não tinha como negá-lo, sob pena de ele mesmo estar cometendo uma ilegalidade e um abuso de poder. Se nos revoltamos contra isso, que pressionemos o Poder Legislativo a mudar a nossa legislação e, principalmente, o Poder Executivo a aparelhar o Estado (valorizando e aparelhando as polícias, por exemplo) de modo a nos dar uma condição digna de Justiça. Agora, se as leis (feitas pelo Legislativo) são brandas ou se a estrutura do Estado (fornecida pelo Executivo) são insatisfatórias, não podemos colocar isso nas costas do Judiciário, que, mesmo se quisesse, não teria como resolver essas questões. Ele tem que aplicar a lei.
É claro que existem mazelas, sim, no Judiciário, como existem em todo campo. Mas não são as mazelas do Judiciário que geram os fatos revoltantes que nós, cidadãos, não aguentamos mais.
A minha preocupação é para não pintarmos o Judiciário como um poder corrupto, pois essa definitivamente não é a regra nesse Poder, como também não é no Ministério Público e nas Defensorias Públicas. É claro que, como em todo lugar, haverá casos isolados de corrupção ou de outras mazelas. Mas, nessas instituições, são, sim, casos pontuais e isolados. Não é nada endêmico como se vê nos Poderes Executivo e Legislativo. Por isso saí em defesa do Judiciário. O juiz Sérgio Moro não é o único juiz do país sério. Na verdade, ele apenas faz parte de uma maioria.
Por fim, quero deixar claro que minhas considerações não são para enfraquecer ou simplesmente contrariar o interessante artigo. Quis apenas contribuir para o debate.
Grande abraço!
Guilherme, este tipo de debate é o que um blogueiro espera e recebe como pagamento! Obrigado pela contribuição. Abrs.
Caro Ricardo, a troca de ideias é sempre enriquecedora! Grande abraço e parabéns pelo espaço!
Não xará, o nosso sistema judiciário está falido, e se mostra totalmente incompetente. Precisamos diferenciar o sistema judiciário, dos Juízes. Estes podem ser bem intencionados, mas o sistema não ajuda. Às vezes chego a me sentir um intruso neste país, como se aqui não fosse meu lugar, como se devesse desculpa aos graúdos, por estar aqui incomodando e ocupando o espaço deles. Não há garantias para o povo, só o fardo, que temos que carregar dia e noite, pois nós cidadãos comuns estamos sujeitos a severas punições, pois para nós, a lei é ágil e severamente punitiva.
Sempre aparece a defesa do ato jurídico que minimiza a pena do marginal. Quais os atenuantes desta situação real que aconteceu no RS: – o cidadão com uma ficha policial com furtos, assaltos, tentativas de homicídio e suspeitas de homicídio foi apanhado pela patrulha da BM em um espaço de tempo de sete dias, quatro vezes. Nas quatro abordagens ele portava uma arma de fogo diferente (revolver 38, pistola Glock, pistola Taurus e revolver 32). Nas quatro vezes foi autuado e teve a fiança fixada em valores de R$ 400,00 a R$ 600,00 pela autoridade policial. É claro que ficou menos tempo detido que a patrulha que registrava a ocorrência. Os mesmos policiais em um período próximo detiveram numa blitz, um furgão de entrega de mercadorias de uma pequena empresa, conduzido pelo proprietário. Neste furgão foi encontrada um revolver 38, sem registro. O motorista alegou utilizar a arma para se defender de assaltantes. Detiveram o motorista e este foi conduzido ate a delegacia para ser autuado por porte de arma sem registro. Resultado: fiança de R$ 3.800,00 mais as despesas de advogado levando a despesa ate R$ 10.000,00, fora o processo que está em andamento. Se a lei é a mesma por que se aplica o minimo da lei para o infrator e o máximo para o trabalhador? A lei considera a arma do criminoso ferramenta de trabalho? Nas mãos do trabalhador arma recebe o rigor do estatuto do desarmamento?
Caro, vamos tomar cuidado para não confundir “defesa do ato jurídico que minimiza a pena do marginal” com “defesa da aplicação da lei pelo juiz”. É uma confusão séria. Se a sociedade não concorda com os benefícios penais da lei, que pressionem o Legislativo. É ele quem pode mudar isso. Agora, se o Legislativo, no Brasil, não faz o seu papel, não é Judiciário que vai cometer ilegalidades para salvá-lo.
Pois bem, no exemplo dado, a diferença dos valores das fianças certamente se deu em razão do poder econômico de cada um dos investigados. Certamente o investigado que pagou fianças mais baratas é mais pobre que o que pagou fiança mais cara. E é justo que quem tem um maior poder econômico pague mais por uma fiança. Se fosse um bilionário cometendo um delito, você acharia justo que ele pagasse R$400,00, R$600,00 ou R$10.000,00 de fiança? Não. A fiança, no seu exemplo, certamente foi dada em razão do poder econômico de cada um dos sujeitos (embora esse detalhe não tenha sido relatado por você, tenho certeza absoluta que esse foi o caso).
Agora, com o devido respeito, me causa estranheza essa sua hipótese de um sujeito portador de uma ficha de antecedentes criminais tão extensa (e com crimes tão graves) receber quatro fianças sucessivas. Se isso aconteceu, creio que foi um caso isoladíssimo, pois não é o que normalmente ocorre. Num caso como esse que você descreveu, normalmente o indivíduo fica preso preventivamente a partir da segunda vez que é pego. O erro, no caso, foi do delegado de polícia (ou do promotor) que não solicitou ao juiz a decretação da prisão preventiva. Esse seu exemplo foi um caso isolado.
Ah, e a concessão da fiança não isentou o primeiro investigado dos processos, ok? Tenha certeza de que os dois sujeitos do seu exemplo estão respondendo por todos os crimes que supostamente cometeram.