por Marcelo Seabra
É possível que um adulto trabalhador e praticamente honesto seja ingênuo a ponto de achar que pode se misturar com criminosos barra pesada e não pagar o preço? Essa é a premissa de O Conselheiro do Crime (The Counselor, 2013), novo trabalho do diretor Ridley Scott, um nome que sempre causa expectativa. O resultado, no entanto, nem sempre corresponde. Nesse caso, quem salva é o ótimo elenco, encabeçado por um inspiradíssimo Michael Fassbender (de Shame, 2011), que faz maravilhas com o roteiro confuso de Cormac McCarthy.
Lembrado como o escritor dos livros que originaram Onde os Fracos Não Têm Vez (No Country for Old Men, 2007) e A Estrada (The Road, 2009), McCarthy faz aqui sua estreia como roteirista de Cinema e fica um pouco perdido. Há filmes que respeitam a inteligência do espectador não julgando necessário mostrar tudo, deixando uma parte das peças para serem montadas por cada um. Mas há outros que deixam o quebra-cabeças faltando peças, o que é bastante frustrante. O escritor é usualmente pessimista e aqui não seria diferente. A história basicamente acompanha um homem que faz uma escolha errada, ela logo sai do controle e ele vê seu mundo ruir. O final é previsível, mas nem por isso menos doloroso.
Em mais uma atuação milimetricamente calculada, Fassbender pega para si todos os holofotes ao construir a jornada do Advogado (ele não tem nome), um sujeito que parece ser correto, mas é assombrado por algum problema financeiro que em momento algum é explicitado e acaba fazendo bobagem. Em algum momento de sua carreira profissional, ele conheceu o extravagante traficante Reiner (Javier Bardem, de Skyfall, 2012) e, juntos, eles vão entrar numa operação de drogas que promete ser muito lucrativa. É questão de horas até que tudo saia dos eixos e eles precisem se virar para resolver a situação.
Além dessa grande dupla, ainda vemos em cena a belíssima Penélope Cruz (de Para Roma, Com Amor, 2012), a inocente noiva do Advogado, numa relação que parece ser a única bem desenvolvida no longa. Não conhecemos muito os personagens, mas a interação entre eles, inclusive com momentos picantes, é algo em que acreditamos desde o início. Algo parecido ocorre com Bardem e Cameron Diaz (de Um Golpe Perfeito, 2012), um casal longe de ser convencional. Um criminoso bem estabelecido, Reiner tem sua franqueza em Malkina, uma mulher forte que sempre parece ter uma agenda oculta e por quem ele é perdidamente apaixonado. Mesmo que ele perceba o risco, o que poderia fazer? Fechando o grupo principal, o galã Brad Pitt vive um intermediário que também pretende ganhar uma grana com o negócio. Há diversas pontas de rostos razoavelmente conhecidos. Algumas, como a do veterano Bruno Ganz (o Hitler de A Queda, 2004), são marcantes, enquanto outras não dizem a que vieram (o que você estava fazendo ali, John Leguizamo?).
Formas criativas de cometer assassinatos não faltam, o que pode chocar os mais sensíveis. Algumas construções visuais são bem interessantes, ajudando a reforçar o que já sabemos e até criando metáforas. O jeito de vestir, os animais, até a posição ocupada em cena por cada um entrega um pouco mais de suas personalidades, ou mesmo de suas situações. Pitt, o experiente no tráfico, sempre tem destaque quando contracena com Fassbender, o novato. As mudanças pelas quais os Advogado passa são brilhantes, e a crescente tensão não deixa o público sossegado. Paranoia e violência invadem o universo do Advogado, derrubando qualquer glamour que poderia se esperar do mundo do crime. Pena que algumas ações fiquem sem explicação e cenas inteiras entrem na edição sem qualquer critério, diminuindo muito o impacto de algo que poderia ter sido excelente.
É acho que esse é o ano do Fassbender. De novo!