por Marcelo Seabra
Em 2004, o mundo aprendeu o significado da palavra tsunami. A costa oeste de Sumatra, na Indonésia, foi o epicentro de uma tragédia quando ondas gigantescas atingiram violentamente catorze países, devastaram várias comunidades e tiraram a vida de mais de 230 mil pessoas. Uma das famílias vitimadas é retratada em O Impossível (Lo Imposible, 2012), drama que recria aquele cenário para dar ao público uma dimensão mais real do que teria acontecido. As cenas de destruição e os momentos seguintes não são recomendados aos mais sensíveis.
Apesar de ter cenas fantásticas feitas digitalmente mostrando o tsunami, o maior mérito do filme é ter ótimas atuações, uma visão bem sóbria, sem sentimentalismo barato, e usar bem as tais cenas sem chamar atenção para elas. Da forma que tudo é conduzido, você realmente acredita estar frente à criação de Deus, e não de técnicos de informática, como se fossem cenas de arquivo de um telejornal privilegiado. Os efeitos são perfeitos, ainda melhores do que vimos em Além da Vida (Hereafter, 2010), e casam muito bem com o drama da família Bennett, apenas uma em meio a tantas que foram atingidas. Foram usados como base os relatos dos Belon, os espanhóis que estavam na Tailândia, em férias, em 2004, e eles inclusive foram à estreia do longa. Segundo o jornal Orlando Sentinel, eles estiveram à disposição da produção para contar tudo e esclarecer dúvidas.
No filme, somos apresentados ao casal Maria e Henry e seus três filhos, todos bem jovens, que vão à Tailândia em férias. Logo na viagem, dentro do avião, já começamos a ver aquelas pessoas e a prever o que acontecerá a eles, e o aperto no peito começa. Após algumas belas cenas em família, eles se divertem na piscina do resort e alguns estranhos sinais começam a aparecer. Não há tempo para qualquer tipo de providência: ondas de 30 metros de altura invadem tudo e levam com extrema violência o que estiver pela frente em questão de segundos. Daí em diante, acompanhamos o desespero da mãe para encontrar o marido e os filhos.
O jovem Tom Holland (ao lado), que faz o filho mais velho, Lucas, consegue transmitir vários sentimentos de uma vez com competência de veterano. Ele vai do desespero à tristeza à coragem e perseverança que só podemos torcer por mais filmes que aproveitem esse talento todo. Os outros garotos, Samuel Joslin e Oaklee Pendergast, também se garantem e não ficam para trás. Ewan McGregor (de Amor Impossível, 2011), o pai, faz o necessário como um sujeito retraído que tira forças não se sabe de onde e segue em frente, dividindo com o personagem o constrangimento na hora de chorar e reconhecer sua própria falta de esperança. Quem rouba a cena é Naomi Watts (de A Casa dos Sonhos, 2011), sempre serena, que vira uma onça quando necessário. Mesmo em condições deploráveis, sua Maria defende a prole e não desiste inclusive de salvar um garotinho desconhecido. A atriz inclusive foi indicada ao Globo de Ouro 2013 pelo trabalho.
McGregor e Naomi trabalharam juntos em A Passagem (Stay, 2005) e demonstram uma boa química juntos. Ambos já passaram dos 40, parecem mais jovens e têm um quê de maturidade e carisma que faz o público acreditar na dinâmica da família e torcer por eles. Uma crítica sofrida por O Impossível vem daqueles que acusam o longa de valorizar o drama de estrangeiros enquanto as maiores vítimas da tragédia foram os próprios moradores. Mas se realmente houve uma família passando por uma situação como aquela, qual o problema em segui-la? E os Bennett servem como representação de tantos outros que estavam ali, na mesma situação, em uma terra estranha, com uma língua difícil de ser compreendida, vivendo o que podia facilmente ser o inferno.
Cinco anos depois de realizarem o terror O Orfanato, o diretor Juan Antonio Bayona e o roteirista Sergio Sánchez se reúnem novamente e entregam outra obra forte e bem cuidada. Bayona demonstra controle pleno de seu ofício e passa a ser um nome visado por Hollywood, que parece estar sempre à caça de novos talentos para não ficar só no “mais do mesmo”. O Impossível não é daqueles filmes piegas que buscam a todo custo as lágrimas do público. Mas não se assuste se elas rolarem assim mesmo.