This Is Us chega ao fim (sem spoilers)

O primeiro episódio, exibido originalmente em setembro de 2016, deixou o público um tanto perdido, apresentando linhas temporais distintas sem que percebamos, para no final tudo fazer sentido. E assim, com maior ou menor grau de complicações, foi This Is Us por seis temporadas, indo e voltando no tempo para nos apresentar todas as nuances da família Pearson. E agora, que a série acabou, há um bocado de gente órfã por aí, sem saber como superar essa perda.

A série tinha nada menos que cinco personagens principais, e cada um desenvolve o seu próprio núcleo, com outras tantas pessoas chegando em cada um. Um dos principais méritos da atração foi conseguir dar importância e peso dramático a cada. É raro perceber alguém que foi descartado, logo todos reaparecem. Os diferentes momentos históricos mostrados em sequência também ajudam a criar expectativa, até suspense, e vamos recebendo peças de um longo e prazeroso quebra-cabeça. As roupas, cabelos e figurino (e bigode) ajudam a reforçar as épocas.

O elenco tem nomes mais e menos conhecidos – a maioria ficou conhecida após a estreia da série. Milo Ventimiglia é provavelmente quem, dos principais, tem a carreira mais longa no Cinema e na televisão. Lembrado pela série Heroes e como o filho de Rocky Balboa (em 2006 e 2018), ele já dublou super-heróis em séries e recentemente protagonizou Meu Amigo Enzo (The Art of Racing in the Rain, 2019), e já tem uma nova série engatilhada: The Company You Keep.

Ventimiglia vive Jack Pearson, um ex-soldado que volta da Guerra do Vietnã tentando colocar sua vida no lugar e, entre um bico ou outro, conhece Rebecca. Entra em cena Mandy Moore, cantora que se aventurou como atriz e deu muito certo. Começando por longas melosos (como Um Amor Para Recordar, 2002), ela trabalhou em várias séries, também como dubladora. No Cinema, um ponto alto é a comédia Galera do Mal (Saved!, 2004). A química entre Ventimiglia e Moore nos leva a crer que de fato os dois foram feitos um para o outro e logo terão uma família. 

Revezando-se com esse casal, temos as histórias dos três filhos: Kevin, Kate e Randall. Mais velho e ligeiramente problemático, Kevin (Justin Hartley, o Arqueiro Verde de Smallville) vive diversas desventuras amorosas enquanto tenta se encontrar, batalhando na profissão de ator. Kate (Chrissy Metz, de Superação, 2019), a irmã do meio, é assistente de Kevin e vive para a família até que percebe que precisa ter uma vida própria. E Randall (Sterling K. Brown, de Hotel Artemis, 2018), que veio por último, é invariavelmente a voz da razão, às vezes um pouco arrogante, sendo sempre apontado como “o filho que deu certo”, com uma boa profissão e uma bela família.

Partindo desses cinco personagens, temos diversas histórias sendo criadas e, o mais impressionante, todas são amarradas. O criador de This Is Us, Dan Fogelman, trabalhou a ideia por muito tempo até chegar ao resultado que vemos na televisão. E tamanho esforço deu frutos: além de diversas indicações a prêmios e muitas vitórias, a série é uma das melhor avaliadas da atualidade e muito comentada em redes sociais. Certamente, já garantiu empregos aos envolvidos. Fogelman, com trabalhos medianos a fracos como diretor e roteirista (a exceção é Amor a Toda Prova, 2011), fez aqui um nome na indústria.

Entre muitos pontos positivos da série, talvez o maior seja dar profundidade a seus personagens e fugir de saídas fáceis. Pouquíssimos momentos soam forçados, buscando um certo resultado dramático. Na maior parte do tempo, vemos seres humanos errando e acertando, e errando novamente, e assim por diante. Ao mesmo tempo em que cada um tem sua personalidade e características distintas, percebemos uma evolução. Randall, por exemplo, sempre se cobrou muito e não aceitava um resultado menor que excelente. E isso tem um preço: crises de ansiedade, ataques de pânico. Tudo isso vai sendo trabalhado.

A visão que os filhos têm dos pais também cresce. Por mais que os vejam como maravilhosos e perfeitos, os filhos vão conhecendo mais lados, dando no fim um ótimo equilíbrio. Como acontece com qualquer um. E as outras figuras que vão aparecendo acrescentam muito. Ron Cephas Jones (de Meu Nome É Dolemite, 2019) é responsável por momentos maravilhosos, e não à toa foi premiado por sua atuação como William. Tão interessantes quanto, temos outro veterano, Griffin Dunne (Nicky), além de Jon Huertas (Miguel), Susan Kelechi Watson (Beth), Chris Sullivan (Toby) e Alexandra Breckenridge (Sophie), para ficar nos coadjuvantes mais frequentes. E não podemos nos esquecer das crianças: alguns personagens, além da versão adulta, têm intérpretes diferentes para outras faixas etárias, todos ótimos.

Entre os que aparecem pouco, destaque para Gerald McRaney, que faz o médico de Rebecca, além de Denis O’Hare (Jessie) e Michael Angarano (Nick), que cresceu bastante desde seus tempos de Quase Famosos (Almost Famous, 2000). Muitos rostos reconhecíveis, como Dan Lauria (o pai do Kevin de Anos Incríveis), aparecem em menos capítulos, e são sempre boas surpresas. Há gente famosa também entre os roteiristas e os diretores dos episódios, com os próprios atores assumindo a cadeira aqui e ali. Diversidade, em frente e atrás das câmeras, é algo que não falta, e assuntos polêmicos e necessários são abordados na trama.

A trilha sonora é mais um ponto fantástico. Os temas originais ficaram a cargo do experiente Siddhartha Khosla, já indicado a três Emmys. E as músicas populares usadas não são menos que ótimas, ganhando a afeição do público de várias formas, ao mesmo tempo. Para uma série ter o impacto que This Is Us tem, são necessários muitos acertos juntos. E é exatamente por isso que, mesmo após a exibição do décimo oitavo episódio da sexta temporada, também conhecido como o último, This Is Us continuará a ser descoberta por milhares de pessoas que vão se apaixonar pelos Pearsons.

PS: Clique aqui para ouvir o Programa do Pipoqueiro sobre a série.

Sentiremos saudades…

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Novo Jurassic World reúne gerações

Mais do mesmo. De Novo. Assim pode ser descrito o novo Jurassic World Domínio (Jurassic World Dominion, 2022), parte final da trilogia iniciada em 2015. Ou sexta parte da franquia que começou com o Jurassic Park original, de 1993. O diretor e roteirista Colin Trevorrow volta ao comando, depois de se ausentar no último, e aposta todas as suas fichas, exaurindo esse universo. E, ao mesmo tempo, parece estar apenas se repetindo, usando os mesmos clichês que já vimos não sei quantas vezes.

Quem vai ao cinema esperando ver dinossauros comerem gente ficará satisfeito. Quem procura uma discussão ambiental sobre as consequências de mexer na natureza verá uma bem artificialmente. E os que procuram ação desenfreada não sairão tristes, mas é bom fazer duas ressalvas: há momentos confusos, em que ficamos um tanto perdidos sobre o que está acontecendo; praticamente tudo o que é mostrado na foi visto nos episódios anteriores.

Este sexto filme faz o que os fãs da franquia esperavam há tempos: mistura a equipe recente, formada basicamente por Bryce Dallas Howard e Chris Pratt, e a clássica, trazendo de volta Sam Neil e Laura Dern, além do já visto Jeff Goldblum. É claro que há um certo charme nisso, mas a aposta na nostalgia do público é descarada. É bom sim reencontrar os personagens do primeiro, e os atores retomam de onde pararam com muita naturalidade, mas incomoda que essa jogada caça-níqueis salte tanto aos olhos. É um atestado de não saber mais para onde correr.

Os momentos de suspense desse Domínio são telegrafados minutos antes, dá para prever tudo. E em momento algum tememos pela integridade física de nossos queridos companheiros, não parece que o roteiro vai abrir mão de ninguém. Pelo contrário, ele soma alguns, necessários para o momento. Os novos nomes de destaque respondem por Mamoudou Athie (da série Arquivo 81), o responsável pelas comunicações na corporação que hospeda os dinossauros; Campbell Scott (de WeCrashed), que vive o milionário por trás de tudo; e DeWanda Wise (de Vingança & Castigo, 2021), a mercenária que cria consciência.

A história gira em torno de ganância e avanços científicos, como sempre. Os motivos torpes são camuflados como um investimento filantrópico em busca de curas para doenças. E nem é bom analisar a parte científica envolvida, a viagem é mais louca do que qualquer coisa que vimos até aqui. A cada filme há um novo “maior carnívoro de todos”, o que nos leva a questionar a sanidade dos envolvidos. Para que recriar essas criaturas monstruosas e incontroláveis? Apenas para deleite do espectador.

Se a trilha sonora de Michael Giacchino não traz nenhuma novidade memorável, ao menos os efeitos especiais são os melhores possíveis. Vemos todos os detalhes dos dinossauros, sua pele, pêlos, movimentos. Pena que servem a um roteiro morno que não traz novidades à franquia, ao menos nenhuma que faça alguma diferença. Como tudo em Hollywood funciona à base de trilogias, ao menos esse Domínio serviu para encerrar essa. Ou não.

Jeff Goldblum tem diálogos espirituosos e parece viver ele mesmo

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Programa do Pipoqueiro #71 – Músicas Mais Tocadas no Cinema

A nova temporada do Programa do Pipoqueiro começa trazendo algumas das músicas mais tocadas no Cinema, com comentários sobre os filmes (e séries) em que elas tocam. Aperte o play abaixo e divirta-se!

Tracklist:

01 – Jefferson Airplane – Somebody to Love

02 – Buffalo Springfield – For What It’s Worth

03 – Jimi Hendrix – All Along the Watchtower

04 – Creedence Clearwater Revival – Fortunate Son

05 – Rolling Stones – Gimme Shelter

06 – Stevie Wonder – My Cherie Amour

07 – Marvin Gaye – Let’s Get It On

08 – Carl Douglas – Kung Fu Fighting

09 – Lynyrd Skynyrd – Sweet Home Alabama

10 – War – Low Rider

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Better Call Saul divide sua última temporada com a tensão lá em cima

A prequel de Breaking Bad está próxima de seu fim, ao mesmo tempo em que se aproxima da série original. Quando, em 2012, a quinta temporada de Breaking encerrava sua primeira parte, os fãs da série precisaram esperar um ano para ver a jornada de Walter White e Jesse Pinkman se encerrar. Agora, os fãs de Better Call Saul precisarão de pouco mais de um mês para saber o que esperar do final da saga de Jimmy McGill e Kim Wexler.

Mais uma vez, Vince Gilligan e Peter Gould, criadores tanto de Breaking Bad quanto de Better Call Saul, provam que a capacidade de criar uma história sólida, muito bem construída e contada não se limitou à obra original. A primeira metade do sexto ano de Better Call Saul constrói calmamente uma narrativa que sabe onde quer chegar: o que aconteceu para que um pacato advogado se transformasse em um trambiqueiro e também uma das mentes por trás de um mega tráfico de metanfetamina. Algo inevitável é dizer – sem receio de spoiler – que os rumos de certos personagens nunca vistos em Breaking Bad serão encerrados aqui. Kim Wexler, Nacho Varga, Lalo Salamanca e Howard Hamlin começam a ter seus destinos traçados.

Nesse sentido, Gilligan e Gould não querem deixar pontas soltas. Para encaminhar não só o desfecho desses personagens como também preparar a história que se conhece em Breaking Bad, os criadores exalam talento cinematográfico, sobretudo em roteiro, usando artifícios, como a arma de Tchekhov, para mostrar que tudo em cena importa. E cada elemento será fundamental para o desenrolar do mote. Ainda que em alguns momentos a calma parece ser enfadonha ou em um ritmo contrastante para um final de série, Better Call Saul prova que até esse ritmo mais lento importa, e não só: mostra perfeitamente o porquê de isso ser necessário.

Outro ponto a favor da série está nas atuações. Bob Odenkirk, com seu Jimmy McGill/Saul Goodman, e Rhea Seehorn, como Kim, merecem óbvios elogios, salta aos olhos a capacidade de ambos de mostrar nuances de seus personagens que ainda não conhecemos, mesmo depois de quase oito anos de série. Nesse caminho, Bob impressiona não só pelo conforto na pele de Saul, mas por conseguir mostrar ainda mais de um personagem que se conhece há exatos 13 anos.

Além da dupla protagonista, Michael Mando com Nacho Varga e Patrick Fabian com Howard Hamlin entregam muito em personagens que pareciam ser facilmente descartáveis em alguns momentos da série – sobretudo Howard, o advogado que, na quinta temporada, parecia perder espaço na trama. Tony Dalton, o Lalo Salamanca, interpreta um vilão carismático e, ao mesmo tempo, cruel e sem qualquer piedade, colocando-o no mesmo patamar dos antagonistas vistos em Breaking Bad.

Better Call Saul, assim como a sua série original, fecha a primeira parte da última temporada com uma tensão alta e cheia de expectativa para esses seis episódios restantes. Os sete primeiros, até agora, mostram que a história não parece querer deixar pontas soltas, o que aumenta a ansiedade para saber o final dessa trama que ainda tem muito a contar. A série volta ao ar no dia 11 de julho, pelo AMC nos EUA. No Brasil, reaparece no dia 12, com um episódio liberado por semana, um dia após a exibição estadunidense.

Patrick Fabian, Jonathan Banks e Tony Dalton se preparam para o final da série

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Tom Cruise volta a Maverick em novo Top Gun

A necessidade de velocidade não parece ter sido saciada. Os superiores da Marinha se veem obrigados a acionarem seu maior piloto para um ataque suicida. Tom Cruise volta a seu personagem de 1986 para uma missão quase impossível em Top Gun: Maverick (2022). Levando uma vidinha tranquila em seu pequeno hangar, Pete Mitchell nunca se preocupou em ser promovido e continuou batendo de frente com almirantes sempre que pode. Estacionou na patente de capitão, como um incompetente qualquer, apenas para continuar pilotando.

Maverick, codinome do sujeito, é convocado a voltar à escola dos “melhores pilotos do mundo”, como todos se referem à instituição norte-americana mais conhecida como Top Gun. Um país nunca mencionado, apenas descrito como “pária”, estaria preparando o beneficiamento de urânio e cabe aos ases do Tio Sam salvar o planeta. No mesmo tom ufanista do primeiro, este longa conta com uma trama um pouco mais crível. Ao menos, há um inimigo a ser combatido, e não apenas algumas aeronaves que convenientemente cruzam o espaço aéreo americano no dia da formatura dos pilotos.

Na Top Gun, Maverick terá que treinar versões mais jovens de si mesmo para que possam cumprir a missão de explodir a base do tal país pária. Além de ter que se adaptar ao papel de professor, que sabe não dominar, Maverick terá que lidar com o exímio piloto Bradley “Rooster” Bradshaw (Milles Teller, de Whiplash, 2014, e atualmente na ótima série The Offer – abaixo), filho de seu antigo parceiro, Goose, morto em um treinamento que deu errado. Rooster carrega bastante ressentimento e eles precisarão lidar com isso para que a tarefa seja cumprida.

Este novo Top Gun, cuja estreia foi adiada devido à pandemia, traz várias homenagens. De cara, nos letreiros iniciais, lembra do falecido produtor Don Simpson, sócio de Jerry Bruckheimer em diversos blockbusters – incluindo o primeiro Top Gun. Ao final, nos créditos, traz dedicatória a Tony Scott, diretor do primeiro e que também já nos deixou. E durante todo o longa temos referências a Tom “Iceman” Kazansky, piloto vivido por Val Kilmer que serviu como antagonista de Maverick. Kilmer tratou um câncer na garganta em 2017, o que o debilitou, afetou seriamente a fala dele e fez o ator se aposentar.

É bem interessante perceber que Pete Mitchell não amadureceu nada e Tom Cruise volta a ele com uma naturalidade que faz parecer que o primeiro filme foi feito ontem, e não há mais de 35 anos. Os personagens fogem de estereótipos, caso por exemplo do superior feito por Jon Hamm (o eterno Don Draper de Mad Men), que não demoniza Mitchell, apesar de não simpatizar com ele; e da mocinha vivida por Jennifer Connelly (de Alita, 2019), que seguiu sua vida quando o sujeito a abandonou.

O elenco ainda conta com uma pequena participação do veterano Ed Harris (de Tempestade, 2017) e com uma nova geração de rostinhos bonitos interpretando os novos pilotos, repetindo um pouco da dinâmica da aventura anterior. Uma boa fotografia e ótimos efeitos visuais ajudam o público a entender as manobras dos aviões e não ficamos (muito) perdidos. Cruise acertadamente trouxe a bordo seu diretor em Oblivion (2013), Joseph Kosinski, e seu parceiro na franquia Missão: Impossível, Christopher McQuarrie, que ajudou no roteiro. Com rostos conhecidos por perto, o astro e produtor conseguiu atingir onde queria: uma obra que levasse a anterior adiante, não só a homenageando, mas acrescentando àquele universo.

Outro elemento que teria que ser bem cuidado é a trilha sonora, e não poderia estar melhor: além de Lorne Balfe e Hans Zimmer, ela conta com Harold Faltermeyer, do longa de 1986, o que nos traz notas familiares. E outra decisão muito feliz foi começar com Danger Zone, canção marcante de Kenny Loggins para sempre associada a Top Gun. Num bonito aceno ao passado, temos Teller ao piano tocando outra faixa conhecida. A novidade fica por conta de Lady Gaga, que lançou o single que encerra o filme: Hold My Hand, meio que ocupando a vaga de Take My Breath Away.

Não é difícil concluir que o resultado de Top Gun: Maverick é bem superior ao de seu antecessor. Descontadas a nostalgia e a memória afetiva, o original não resiste bem a revisões, com situações (e uma quantidade de suor) exageradas, olhares cheios de luxúria sendo trocados a esmo e desenrolares facilmente previsíveis. Kosinski atinge aqui temas mais relevantes, misturando a ação esperada a discussões sobre amadurecimento, paternidade e relacionamentos muito atuais. O mundo mudou, o futuro chegou e só Maverick continua o mesmo. Para a nossa sorte.

Em 1986, Iceman e Maverick eram antagonistas

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A Incendiária de Stephen King ganha nova adaptação

Adaptado para o Cinema em 1984, o livro A Incendiária, de Stephen King, chega agora à tela grande em nova roupagem. Diferente da primeira encarnação, nem melhor, nem pior. O que não significa nada, já que nenhum dos dois é grande coisa. Cada um com suas liberdades quanto à fonte, ambos com cara de longa oitentista de baixo orçamento. Nem dá para dizer se tratar de uma modernização, já que a estética continua a mesma.

Assim como o anterior, esse novo filme ganhou o nome Chamas da Vingança (Firestarter, 2022) e tem como destaque uma menininha expressiva que rouba a cena dos adultos. Em 1984, era ninguém menos que Drew Barrymore, vinda do grande sucesso de E.T. (1982), ainda hoje atriz e produtora de renome. A nova aposta chama-se Ryan Kiera Armstrong. Já experiente, apesar da pouca idade. Inclusive, esteve no universo de Stephen King, tendo participado de It: Capítulo 2 (2019), além de outra franquia gigantesca, a da Marvel, de Viúva Negra (2021). A menina é boa e segura o filme nas costas, exatamente o que a equipe devia esperar.

Quem causa maior espanto é Zac Efron, que até outro dia era o adolescente de High School Musical. Aos 35 anos, o ator mantém o ar jovial e é difícil vê-lo como o adulto responsável, o que mostra que talvez não tenha sido a melhor escolha para viver o pai de Charlie. Ele e Sydney Lemmon (de Fear the Walking Dead e Succession) são os pais da garotinha e vivem fugindo, com medo que o governo, representado pela agência conhecida como “A Loja”, os encontre e faça testes em Charlie. Os dois participaram de um projeto científico secreto como cobaias e adquiriram poderes, passados para a filha.

No elenco, não há mais ninguém que se sobressaia. O sumido Kurtwood Smith, lembrado sempre como o assassino do policial Murphy em Robocop (1987), dá um “oi” e mal tem tempo de ser notado. O roteirista, Scott Teems (de Halloween Kills, 2021), e o diretor, Keith Thomas, não têm nada muito relevante na bagagem e realizam um filme genérico e corrido, que parece ter pressa de resolver tudo logo. A admiração que eles devem dividir sobre os anos 80 se reflete na contratação do mestre John Carpenter como um dos compositores da trilha, que se destaca em alguns momentos.

É estranho que insistam na adaptação de um livro que já foi transposto para as telas, até ganhou continuação para a TV (Vingança em Chamas, 2002), quando King tem tantas obras interessantes na fila. É um tal de insistir em refazer Carrie, a Estranha, O Cemitério Maldito, O Iluminado… Uma coisa é querer honrar uma história que não foi devidamente adaptada, caso de It, ou expandir o que foi escrito, como a nova minissérie Chapelwaite, baseada no conto Jerusalem’s Lot. Em 48 anos de carreira do escritor, com 65 livros publicados, qual é a necessidade de se voltar sempre aos mesmos?

Até o cartaz do longa de 84 é copiado aqui

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Morbius é outro vilão a virar protagonista

Tendo chegado ao Brasil com certo atraso, Morbius (2022) já estava cercado por propaganda negativa. Depois de uma curta temporada nos nossos cinemas, a fama piorou e muita gente deve ter deixado para conferir o longa em casa. A própria Sony Pictures adiou a estreia algumas vezes, o que mostra a falta de confiança da distribuidora no lançamento. E a verdade é que o filme não é assim tão terrível. É apenas ruim, como trocentos outros que são despejados no nosso mercado todos os meses.

Desperdiçando um personagem dos quadrinhos que poderia ter potencial como coadjuvante, a Sony pegou carona no sucesso dos Estúdios Marvel e lançou Morbius como protagonista, mais um anti-heroi na linha de Venom que, assim como o colega, era originalmente um vilão das histórias do Homem-Aranha. Michael Morbius é um cientista brilhante que sofre de um tipo de degeneração e pesquisa morcegos buscando uma cura para si. Assim como Eddie Brock (Venom) e o Dr. Curt Connors (o Lagarto), é um sujeito bem-intencionado levado por circunstâncias a matar pessoas.

Ou seja: uma trama tão batida que no próprio universo do Aranha temos exemplos muito próximos, nem precisamos ir longe. E o desenrolar pode ser facilmente previsto. Os efeitos especiais vão do eficiente ao confuso, às vezes criando cenas difíceis de acompanhar. E não faltam closes gratuitos apenas para valorizar o investimento em efeitos. Lembra o nível das aventuras do Motoqueiro Fantasma, que o pobre Nicolas Cage não conseguiu salvar.

No papel principal, temos o oscarizado Jared Leto, visto recentemente em Casa Gucci (House of Gucci, 2021) numa caracterização exagerada que mostra que a preferência do ator por papéis “diferentes” extrapolou os limites do ridículo. Ele afirmou, em entrevistas, que gosta de transformações físicas, o que atinge um extremo em Morbius. Agora, se Leto está risível, pior é Matt Smith (de Noite Passada no Soho, 2021), a quem sobram as cenas mais forçadas e os piores diálogos. Dois bons atores levados a passarem vergonha num roteiro canhestro. Smith, ao menos, parece se divertir.

Alçado à fama com o sucesso sueco Dinheiro Fácil (Snabba Cash, 2010), o diretor Daniel Espinosa realizou longas interessantes, mas aqui não tem nenhuma oportunidade de trazer ar fresco. Os roteiristas, Matt Sazama e Burk Sharpless, não têm muito o que fazer, e não que fariam, se pudessem – eles assinam coisas como Drácula – A História Nunca Contada (2014) e O Último Caçador de Bruxas (2015). Desse jeito, a Sony complicou bastante a vida de Espinosa. E inviabilizou o futuro de Morbius no universo compartilhado de vilões do Aranha, que já conta com Venom e logo terá Kraven, O Caçador. E, à exemplo do MCU, não perca as duas cenas (descabidas) escondidas nos créditos.

Assim como Jared Leto, Matt Smith passa vergonha com um roteiro ruim

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Robert Eggers recria os vikings em O Homem do Norte

Depois de visitar a Nova Inglaterra de 1630 e uma ilha do Maine do início do século XX, Robert Eggers radicalizou e foi à Islândia de 850 DC recontar uma lenda viking. Como o diretor tinha o desejo de contar uma história desse tipo e vinha buscando um projeto para trabalhar com o sueco Alexander Skarsgård, eles concordaram em realizar O Homem do Norte (The Northman, 2022), adaptação livre de uma lenda islandesa. Como é de se esperar, com bastante violência e um toque de nudez, buscando ser bem fiel ao que se sabe da época.

Tanto A Bruxa (The Witch, 2015) quanto O Farol (The Lighthouse, 2019) são filmes perturbadores, tecnicamente impecáveis e que deixam uma impressão marcante no público, que leva um bom tempo para digerir o que viu. O Homem do Norte é mais simples de acompanhar, com uma trama mais óbvia e direta. Nem por isso é um filme inferior ou esquecível. A história do príncipe Amleth serviu como inspiração para o Hamlet de Shakespeare. O bardo inglês apenas trocou uma letra de lugar para nomear seu trágico personagem.

O ponto de partida de Amleth é o assassinato de seu pai, o rei Aurvandil Corvo da Guerra, pelo tio, e sua busca por vingança. Há diferenças entre o filme e o registro histórico de Saxo Grammaticus, que escreveu tudo no século XIII. Para poder tomar liberdades e se manter fiel aos costumes da época, o diretor e roteirista Eggers contratou o escritor islandês Sjón, parceiro constante da cantora Bjork, com quem trabalhou no premiado Dançando no Escuro (Dancer in the Dark, 2000) e aqui, novamente.

O nórdico do título é vivido por Alexander Skarsgård, que usou muito de sua experiência na série True Blood para fazer um personagem forte e violento, até animalesco – características dos guerreiros Berserkir. Ele passa toda a sua vida sem ter intimidade com outro ser humano, focando-se no que o levaria a consumar a vingança contra o tio usurpador. Quase um Batman, aprendendo a lutar e desenvolvendo seu físico para se tornar uma arma. O trabalho do ator é de muita entrega, ele merece todos os elogios cabíveis.

No papel de mãe de Amleth, temos a sempre excelente Nicole Kidman, que foi esposa de Skarsgård em Big Little Lies. Outra mulher importante para a trama é a interpretada por Anya Taylor-Joy (de A Bruxa), uma escrava que vira uma aliada do príncipe. Quase uma versão mais jovem da mãe dele, são tipos físicos muito próximos. Quem se difere fisicamente, curiosamente, é o dinamarquês Claes Bang (o Drácula da série da Netflix), nascido mais próximo de onde o filme se passa. Talvez, ele destoe dos demais para enfatizar que é um filho ilegítimo do então rei.

E temos Ethan Hawke, o vilão da série do Cavaleiro da Lua, que prova mais uma vez o seu talento vivendo um rei cheio de nuances, passando longe do que vemos em contos de fadas. Eggers ainda convocou três dos atores que colaboraram com ele anteriormente para pontas: Willem Dafoe (de O Farol) e os “pais da Bruxa”, Kate Dickie e Ralph Ineson. Há momentos de O Homem do Norte, muito devido à belíssima fotografia, que lembram Game of Thrones, e outras comparações podem vir à cabeça. O poema O Corvo, de Edgar Allan Poe, passa pela mente, mesmo que levemente. Independente das referências, a obra de Eggers se sustenta muito bem e o diretor segue sendo um nome a se acompanhar.

O diretor foi mais ambicioso dessa vez e teve um orçamento maior

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Nicolas Cage lida com o peso de seu talento

Nicolas Cage sabe rir de si mesmo, isso ninguém pode negar. O ator é frequentemente criticado por fazer filmes demais, e muitos de baixíssima qualidade. A culpa seria de seu alto custo de vida, e ele é dado a excentricidades caríssimas. Cage resolveu abraçar tudo o que o senso comum diz dele e o resultado é O Peso do Talento (The Unbearable Weight of Massive Talent, 2022), longa que estreia essa semana nos cinemas disputando espaço com o recém chegado Doutor Estranho no Multiverso da Loucura. Coincidentemente, a Marvel ganha uma cutucada num diálogo. E ele propositalmente deixa de mencionar as terríveis aventuras do Motoqueiro Fantasma.

Chegando a lançar um absurdo de seis filmes em um mesmo ano, o que ele fez algumas vezes, Cage recentemente tem procurado mais qualidade em suas produções. Talvez por isso, viu com bons olhos a oportunidade de fazer graça com sua persona de astro do Cinema. É importante ressaltar que trata-se de uma obra de ficção. Partir da realidade não significa que nada daquilo seja verdade. Muito pelo contrário, o roteiro da dupla Tom Gormican e Kevin Etten (parceiros em Namoro ou Liberdade, 2014) segue pelo caminho da paródia, fazendo várias referências a filmes passados e famosos do ator.

A versão ficcional de Nick Cage está se divorciando, não consegue se comunicar com a filha adolescente e, para piorar, está devendo muito dinheiro. Todo trabalho que aparece é “um ótimo papel”, algo que vá representar a volta dele. Mesmo que ele não tenha ido a lugar nenhum. O agente dele, Fink (Neil Patrick Harris, de Matrix 4, 2021), traz então a mais recente oferta: ganhar um milhão de dólares para participar do aniversário de um grande fã espanhol, o empresário Javi (Pedro Pascal, de Mulher-Maravilha 1984, 2020). Cage titubeia, mas as contas estão batendo à porta.

A forma como o roteiro parece conversar com o público é bem interessante. Chega quase a ser um metarroteiro, por citar situações e logo em seguida usá-las em seu próprio andamento. Isso cria momentos inusitados, sempre brincando com a imagem de Cage. O cumprimento, com uma mão aberta e outra fechada, parece uma excentricidade tirada dos tatames de artes marciais. A forma como a amizade com Javi é desenvolvida flui muito bem e serve ainda para mostrar a solidão que uma estrela do quilate de Cage vive. Passado o jet lag, ele rapidamente se apega ao novo amigo e entra de cabeça nas empreitadas propostas.

O fato de Javi ser um grande fã de Cage possibilita uma pancada de citações a produções antigas dele, gerando mais piadas espirituosas. E a suposta mania de grandeza de Cage já começa no título original, que joga com um clássico da literatura, A Insustentável Leveza do Ser, e termina fazendo um autoelogio. Por incrível que pareça, ele nem menciona o Oscar de Melhor Ator que levou por Despedida em Las Vegas (Leaving Las Vegas, 1995). O que prova que ele não queria contar vantagem de verdade, era só faz de conta. Mas o talento é genuíno.

Nick Cage mostra, mais uma vez, que realmente tem muito talento

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Marvel se aproxima do terror com Doutor Estranho no Multiverso da Loucura

Neste vasto Universo Cinematográfico Marvel, às vezes acontece de um filme querer fugir dos gêneros mais habituais, que são ação e aventura (com elementos de comédia e ficção-científica). Por isso, já tivemos um de guerra (Capitão América, 2011), um de espionagem (Capitão América: O Soldado Invernal, 2014) e um de roubo (Homem-Formiga, 2015), por exemplo. Graças a Sam Raimi, agora temos um de terror: Doutor Estranho no Multiverso da Loucura (Doctor Strange in the Multiverse of Madness, 2022). Ou algo próximo disso.

Sempre lembrado como o criador da franquia Evil Dead (chamada no Brasil de Uma Noite Alucinante), Raimi tem vasta experiência em longas assustadores. E, como um bônus para a Marvel, tem também a bem-sucedida trilogia do Homem-Aranha (com Tobey Maguire) em seu currículo. Isso, além de Darkman: Vingança Sem Rosto (1990), uma história original de vingança que lembra muito uma revista em quadrinhos. Bagagem é o que não falta ao diretor.

Com a saída de Scott Derrickson, que comandou o primeiro filme de Stephen Strange, o roteiro voltou à estaca zero. A Marvel não estava gostando dos rumos que Derrickson estava tomando, aparentemente mais aterrorizantes, e começou a meter o dedo. Ele, então, alegou as famigeradas diferenças criativas e deixou o projeto, abrindo caminho para Raimi e para um novo roteirista. Tendo escrito e produzido a elogiada série de Loki, Michael Waldron foi o escolhido. Atendendo as exigências do estúdio, ele manteve o foco da história em duas personagens: America Chavez (a futura Miss America) e Wanda Maximoff, a Feiticeira Escarlate.

Já conhecida do público desde o segundo Vingadores, a Era de Ultron (2015), Wanda (vivida por Elizabeth Olsen – acima) vem sendo trabalhada desde o início, os produtores pareciam saber exatamente onde queriam chegar com ela. Nos quadrinhos, ela surgiu como uma vilã relutante, que logo muda de lado e se junta aos Vingadores. Na série WandaVision, ela deu uma amostra de seu enorme poder dominando a mente de uma cidade inteira para satisfazer suas fantasias de ter um lar e uma família com o androide Visão. É logo após esse episódio que a encontramos.

Outra protagonista aqui é America Chavez (Xochitl Gomez, de O Clube das Babás), conhecida dos leitores de quadrinhos como Miss America. No filme, ela surge como uma adolescente que tem o poder de viajar entre universos e, por isso, está sendo caçada por alguém que deseja roubar essa habilidade. Mais uma vez desempenhando o papel de mentor de jovens (como em Homem-Aranha: Sem Volta Para Casa, 2021), cabe ao Doutor Estranho ajudá-la. E essa é a desculpa para a Marvel passear no Multiverso e desenvolver esse conceito, já apresentado em obras anteriores. Dá inclusive para notar certa influência da série What If…? Mais especificamente na aparição de duas figuras apresentadas lá.

E, finalmente, chegamos ao personagem que dá nome ao longa. O Doutor Stephen Strange novamente mostra que não é tão esperto quanto todos pensam, assim como em Sem Volta Para Casa. Afinal, estamos acompanhando o começo da carreira dele como mestre das artes místicas. E ninguém sabe nada a respeito do multiverso, o que torna tudo incerto. Esse é um dos problemas do roteiro: como as regras não são conhecidas, elas são apresentadas conforme as coisas vão acontecendo, o que soa conveniente. O que o roteirista achou interessante para a história passa a ser uma regra. E a expressão Multiverso da Loucura é impactante para um título, mas faltou um pouco dessa loucura nas realidades apresentadas. As participações, no entanto, são muito bacanas, assim como os efeitos especiais, que certamente vão garantir alguns prêmios.

O principal problema que assola Doutor Estranho no Multiverso da Loucura é extrínseco ao filme: a expectativa do público. Com o patamar alcançado por Sem Volta Para Casa, os fãs estavam esperando maravilhas. E a Marvel mostra muito nos trailers, nos fazendo achar que há muito mais a ser revelado, quando não há tanto assim. A maior parte das críticas negativas que se vê dizem respeito a isso. Benedict Cumberbatch é sempre muito seguro, e ganha o bom reforço de Rachel McAdams, que tem muito mais a fazer que anteriormente. O longa está entre os melhores do MCU e ajuda a garantir Strange como um de seus personagens mais importantes.

Doutor Estranho está no título, mas o filme é de Wanda

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