O grande blockbuster que estreia na semana, fugindo dos indicados ao Oscar, é a próxima produção da Marvel: Capitão América: Admirável Mundo Novo (Captain America: Brave New World, 2025). Com a difícil missão de suceder o admirado Steve Rogers de Chris Evans, o Sam Wilson de Anthony Mackie está sempre fazendo ou ouvindo discursos e ficamos em dúvida: quem está ali é o personagem ou o ator? Afinal, a mesma dificuldade que Wilson sente em substituir Rogers, Mackie sente em entrar no lugar dos Vingadores originais.
Muito tem sido falado a respeito do filme, pegando carona no fracasso dos últimos lançamentos do estúdio, como o terrível Thor: Amor e Trovão (Thor: Love and Thunder, 2022) e o morno Homem-Formiga e a Vespa: Quantumania (Ant-Man and the Wasp: Quantumania, 2023). Pessoal se empolga nas críticas e acabam sendo injustos com a obra, que não é essa bomba toda! É um fan service total – aquele produto que alegra os fãs por trazer aquelas piscadelas para eles, com personagens meio obscuros dos quadrinhos ganhando vida (Joaquin Torres, Coral, Ruth Bat-Seraph, Dennis Dunphy…), além de recuperar filmes (e séries) anteriores, como Falcão e o Soldado Invernal, O Incrível Hulk e Os Eternos. E explicar o sumiço de um personagem desde os primórdios do MCU, além de honrar o veterano Isaiah Bradley (Carl Lumbly).
Pontas foram deixadas nas obras mencionadas e Admirável Mundo Novo as fecha com competência, o que deve satisfazer a base de fãs. Ao mesmo tempo, pode ser um problema não ter visto essas obras e ficar perdido nas referências – o que aponta ao meme de que os filmes da Marvel são um esquema de pirâmide. Sem inventar, era fácil ver senhoras na sessão do filme que deviam estar passeando no shopping e decidiram ver alguma coisa, e você vê essas pessoas deixando a sessão antes da cena pós-crédito, o que comprova a teoria de que elas não são necessariamente o público alvo. Fica a esperança de que elas tenham ao menos gostado da experiência. E não que a única cena pós-crédito (no final mesmo!) vá acrescentar alguma coisa…
As questões políticas tratadas em AMN são responsáveis pelos pontos mais interessantes do filme e os mais problemáticos. Para começo de conversa, temos um general se tornando o presidente dos Estados Unidos. O que é a indicação óbvia de que as coisas vão dar errado, já que general deveria ficar no quartel (num mundo ideal). A equipe de marketing do sujeito o aconselhou a raspar o bigode, o que gera as piadinhas de que ele mudou de visual. Que justificam a presença de um novo ator, já que o fantástico William Hurt faleceu. E trouxeram o nada mais que extraordinário Harrison Ford para o papel. O que acaba se tornando um problema, já que ele atrai o foco para ele e todo o resto do filme se torna fraco quando ele não está em cena. Era melhor ter trazido de volta o Sam Elliot do Hulk de Ang Lee.
Ao contrário de Capitão América: O Soldado Invernal (Captain America: The Winter Soldier, 2014), AMN não consegue sustentar a imagem de trama de espionagem, já que tudo é feito às claras e até cartazes já haviam revelado os supostos segredos do filme. Sem falar no trailer. O que nos leva ao tão comentado Hulk Vermelho, recurso pouco aproveitado no filme, mas introduzido de maneira bem razoável. Thaddeus Ross ganha mais profundidade e acaba se tornando mais interessante do que o babaca que ele sempre foi, que sempre ganhou tudo no braço. Ajuda muito ser interpretado por Ford, que traz seu carisma junto e meio que cede seu peso ao MCU.
Mackie não perde para outros protagonistas da Marvel, ele é uma figura forte o suficiente para sustentar o nome Capitão América. O fato de ele ser um Capitão América negro em um país ainda muito racista não é tratado, em mais uma oportunidade perdida pelo filme. Ele reflete a possibilidade de ser o representante de um país com um presidente com o qual ele não concorda, e querendo ou não ele é visto como o executor de tal presidente, ou menino de recados. Ele julga ser importante apoiar o presidente, quem quer que seja. Ele nunca concordou com Ross em nada, e os dois invariavelmente estiveram em lados opostos. Só que ele acha importante apoiar o presidente. O que nos leva ao questionamento automático: ele apoiaria um energúmeno como Trump? É esse Capitão América que queremos?
O fato de AMN ter menos piadinhas já é louvável. O modus operandi da Marvel estava ficando cansativo, com tantos personagens sendo os arautos de Tony Stark no stand up comedy. O diretor Julius Onah (cujo longa mais conhecido é O Paradoxo Cloverfield, 2018) segue uma linha mais séria, mesmo tendo um Joaquin Torres piadista no nível Deadpool. Torres é vivido por Danny Ramirez, que já havia sido parte da Marvel em poucos episódios de The Gifted. Fica claro que será um novo personagem a ser acompanhado.
Admirável Mundo Novo é marcado por várias oportunidades perdidas, com muitas possibilidades de críticas políticas não aproveitadas. Mesmo sem tomar partido, o maior crime do longa acaba sendo não ser emocionante. Pelo contrário, AMN lança algumas hipóteses e entra em piloto automático. Alguém pode alegar que a questão política não era importante. Claro, não era, a Marvel podia simplesmente fazer um filme covarde. Mas o problema é maior: a questão política é a pecinha que move a trama, e ela é confusa. Logo, o filme serve como um “meio do caminho”, um filme sem razão de ser. É uma aventura divertida que não desamina o espectador. A sensação de que é um “meio do caminho”, no entanto, não o deixa até o próximo filme estrear. E um certo novo metal super resistente ganhar seu merecido espaço.

Continua um mistério o fato da calça do Hulk aguentar firme