Poirot investiga um crime na Noite das Bruxas

Depois de esclarecer Um Assassinato no Expresso do Oriente (2017) e uma Morte no Nilo (2022), Kenneth Branagh leva Hercule Poirot para um exílio em Veneza. A Noite das Bruxas (A Haunting in Venice, 2023) é a nova aventura do detetive belga nos cinemas, mais uma vez com o diretor irlandês à frente de um grande elenco. A diferença, aqui, é a fonte: ao invés de um medalhão, foi adaptado um livro considerado menor e menos interessante da premiada Rainha do Crime, Agatha Christie.

Chamar de adaptação é até complicado, já que o roteiro escrito por Michael Green (também dos outros dois) aproveita muito pouco da obra de Christie. A ideia de uma trama passada na noite do Halloween e alguns nomes são usados, mas o roteirista para por aí, criando a história e os personagens praticamente do zero. Poirot está famoso por ter suas peripécias narradas numa série de livros bem vendidos e tem uma fila em sua porta. O que não falta é gente pedindo a ajuda do detetive, mas ele pendurou as chuteiras e não atende mais ninguém. Isso, até aparecer uma velha amiga (abaixo).

A escritora dos tais livros da versão fictícia de Poirot, Ariadne Oliver (Tina Fey, eternamente do Saturday Night Live), é uma das poucas pessoas que consideram o detetive um amigo. E ela precisa urgentemente de um novo sucesso literário, o que a leva a querer desmascarar uma notória médium, a Sra. Reynolds (Michelle Yeoh, de Tudo em Todo Lugar ao Mesmo Tempo, 2022), para ter sobre o que escrever. E a ocasião ideal é a festa de Dia das Bruxas oferecida pela rica cantora Rowena Drake (Kelly Reilly, de Yellowstone), que será seguida por uma sessão espírita.

Esse é o pontapé para mais uma oportunidade para Poirot mostrar o tanto que é inteligente e, ao mesmo tempo e na mesma proporção, irritante. No entanto, Branagh escolhe uma abordagem mais discreta, como se de fato o personagem estivesse cansado. Tanto brilhantismo afasta outras pessoas, tornando a vida dele bem solitária. Tanto vivendo o protagonista quanto comandando a produção, Branagh mostra que já conhece bem aquele universo, se mostrando à vontade nas funções. E ainda aproveita para inovar um pouco, trazendo um toque de sobrenatural à trama.

Como observado nos longas anteriores, o elenco deste A Noite das Bruxas é balanceado entre nomes já estabelecidos, como os citados acima, e outros em ascensão, como o futuro He-Man Kyle Allen e Emma Laird (de The Crowded Room), além de figurinhas repetidas para o diretor, caso de Jamie Dornan e do garoto Jude Hill, ambos de Belfast (2021), novamente vivendo pai e filho. Ninguém destoa, compondo um quadro diversificado que ainda conta com atores italianos, já que é lá onde a ação se passa.

O palacete onde a maior parte da história se passa (depois de um trem e um navio) novamente resume os cenários a um, mas muito bem criado e explorado pela fotografia. Em meio a várias estreias de suspense e terror, A Noite das Bruxas é uma que vale o tempo e o dinheiro do espectador. Fica a dúvida se Branagh vai parar por aqui e se dar por satisfeito ou se teremos um novo capítulo das aventuras de Poirot assinado por ele. Se decidir encerrar aqui, encerra bem, e com uma média geral alta.

O design de produção mais uma vez acerta em cheio num filme de Poirot

Marcelo Seabra

Jornalista e especialista em História da Cultura e da Arte, é atualmente mestrando em Design na UEMG. Criador e editor de O Pipoqueiro, site com críticas e informações sobre cinema e séries, também tem matérias publicadas esporadicamente em outros sites, revistas e jornais. Foi redator e colunista do site Cinema em Cena por dois anos e colaborador de sites como O Binóculo, Cronópios e Cinema de Buteco, escrevendo sobre cultura em geral. Pode ser ouvido no Programa do Pipoqueiro, no Rock Master e nos arquivos do podcast da equipe do Cinema em Cena.

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