George Clooney entra para a História

por Marcelo Seabra

Um ótimo elenco, recheado de gente competente e famosa, não é de forma alguma garantia de um bom filme. Muito menos de bilheteria polpuda. Outro exemplo para comprovar essa máxima é Caçadores de Obras-Primas (The Monuments Men, 2014), novo trabalho do diretor, ator, roteirista e produtor George Clooney, que pode ter se sobrecarregado e perdido o foco. Filmando uma história real, passada durante a Segunda Guerra, Clooney tem dificuldade de definir o tom e ainda comete um outro grande pecado: coloca grande peso nos personagens, mas não se dá ao trabalho de apresentá-los apropriadamente.

De cara, Clooney se apresenta como o protagonista Frank Stokes, provavelmente um historiador. É meio difícil ter certeza da especialidade porque ele reúne um grupo de pessoas ligadas a arte, entre curadores, restauradores etc. É como se fosse um grupo de super-heróis, cada um com um poder, reunidos pelo governo para recuperar as obras de arte roubadas pelos nazistas nas cidades por onde eles passaram. Hitler, um artista frustrado, tinha grande apreço por pinturas e esculturas, e não se importava de se apropriar de bens alheios. Seus planos envolviam a construção de um museu em sua terra natal, para celebrar a erudição de seu reich. Os soldados e aviões aliados certamente atacariam e poderiam acertar peças valiosíssimas, tanto financeira quanto histórica e culturalmente. Stokes e seu bando teriam que reaver o máximo que pudessem, devolvendo tudo aos locais de origem.

É interessante a discussão proposta no filme: as obras são tão importantes a ponto de arriscar a vida de vários homens para recuperá-las? Clooney defende apaixonadamente o “sim” e insere discursos inteiros sobre a importância da cultura, da arte e de se conhecer o passado. Chega a ser educativo, de tão expositivo. Clooney e seu parceiro, o produtor e roteirista Grant Heslov, adaptam o livro de Robert M. Edsel (com Bret Witter), escritor que tem várias obras sobre a relação nazismo e arte. Apesar da riqueza do material, o roteiro acaba disperso, sem saber qual linha seguir, apresentando um tanto de gente em uma área vasta, o que fica tanto confuso quanto cansativo.

É até difícil imaginar que um filme com esse elenco não tenha dado muito certo. Clooney parece gostar de fazer filmes em turma, e convocou o amigo Matt Damon, com quem vez a série dos Homens e Um Segredo. Os outros grandes nomes não os são habituais da gangue: Bill Murray (de Moonrise Kingdom, 2012), John Goodman (de O Voo, 2012), Bob Balaban (o narrador de Moonrise), Hugh Bonneville (de Downton Abbey), Jean Dujardin (de O Lobo de Wall Street, 2013) e Cate Blanchett (que fez com Clooney O Segredo de Berlim, de 2006), além de uma ponta do pai do ator, Nick Clooney, que vive sua versão mais velha. Como diretor, Clooney criou ao menos três obras admiráveis: Confissões de uma Mente Perigosa (2002), Boa Noite e Boa Sorte (2005) e Tudo Pelo Poder (2011). Era de se esperar algo na mesma grandeza, mas não foi dessa vez.

Eis alguns dos caçadores reais

Marcelo Seabra

Jornalista e especialista em História da Cultura e da Arte, é atualmente mestrando em Design na UEMG. Criador e editor de O Pipoqueiro, site com críticas e informações sobre cinema e séries, também tem matérias publicadas esporadicamente em outros sites, revistas e jornais. Foi redator e colunista do site Cinema em Cena por dois anos e colaborador de sites como O Binóculo, Cronópios e Cinema de Buteco, escrevendo sobre cultura em geral. Pode ser ouvido no Programa do Pipoqueiro, no Rock Master e nos arquivos do podcast da equipe do Cinema em Cena.

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