Turma da colina ganha um delicioso documentário

por Marcelo Seabra

Com o passar dos anos, Renato Russo ganhou um status de mito. Quando o sujeito é bom e morre em alta, é isso que acontece. Mas tem muita gente viva por aí, da mesma turma, que também teve muito sucesso – talvez não o mesmo tanto, talvez merecesse. É bom saber que são todos gente simples, garotos da vizinhança que decidiram fazer música e deram certo. Essa é, basicamente, a linha que segue Rock Brasília – Era de Ouro (2011), longa que venceu o prêmio de Melhor Documentário no Festival de Paulínia este ano.

Vladimir Carvalho, o diretor e idealizador do projeto, já sonhava com essa realização há anos. Tanto que já tinha a entrevista com Renato (ao lado), que morreu em 1996. E começou a pegar depoimentos de vários outros representantes daquela época e daquela localização: blocos residenciais vizinhos, em Brasília, no final da década de 70. É desse contexto que, além da Legião Urbana, surgiram também a Plebe Rude e o Capital Inicial, bandas ainda em atividade, mas com alterações na formação original.

Várias figuras interessantes passam pelo vídeo, famosas ou não, que de alguma forma estavam ligadas àquele cenário. J. Pingo, ator de teatro, aparece visivelmente alterado por álcool, e protagoniza momentos engraçados. Em outros, mais emocionantes, vemos o professor Briquet de Lemos, pai de Fê e Flávio, baterista e baixista do Capital, dizer, com lágrimas nos olhos, que os filhos perseveraram e deram um belo exemplo a ele, que já teria desistido de tudo. Os próprios membros do Capital falam sobre o esquema de participações em programas de televisão, o que gerou um pequeno escândalo à época.

Feito de forma tradicional, emendando entrevistas, reportagens de época e cenas de shows, Rock Brasília se destaca por sua edição ágil, que o torna bem humorado e informativo. Só era dispensável a dramatização, com atores, de alguns momentos, e uma animação descabida. Alguns podem dizer que ficou longo, mas deve-se levar em consideração que trata-se da história de várias pessoas, de um movimento amplo. Até senti falta de alguns pontos. Não se sabe, por exemplo, que fim levou André Pretorius, o “Sid Vicious louro”, ou quem era o quarto cara na formação da Legião – o Negrete. Não era possível englobar tudo, e o resultado é bem mais do que satisfatório. E, de forma bem descontraída, Carvalho aproveita para tomar um café com alguns entrevistados. Tão descontraído que chega a ser capenga, com Carvalho e seus microfones aparecendo em cena.

Honestidade é uma palavra que define bem o documentário, já que as histórias contadas não mostram apenas o que os personagens viveram de bom. É palpável a nostalgia de Philippe Seabra e André X ao falarem da era de ouro da Plebe Rude, quando o disco O Concreto Já Rachou (ao lado) estourou e eles viajavam o Brasil, apresentando o hit Até Quando Esperar. Seabra faz uma visita à cidade mineira de Patos de Minas, que marcou a Plebe em um show histórico, de onde a banda saiu direto para a cadeia.

Não tem como não se emocionar com a fala da dona Carminha Manfredini, mãe de Renato, que ainda se convence que o filho está vivo, viajando. Para os fãs do estilo musical, todos eles estão vivos e em plena atividade. Para quem não se liga muito nesse pessoal, Rock Brasília serve como retrato de uma época e dá exemplos de pessoas que apostaram em um sonho e mergulharam de cabeça. Que tem uma banda e planeja ir longe vai sair da sessão extremamente motivado.

Sobre Marcelo Seabra

Jornalista e especialista em História da Cultura e da Arte, é atualmente mestrando em Design na UEMG. Criador e editor de O Pipoqueiro, site com críticas e informações sobre cinema e séries, também tem matérias publicadas esporadicamente em outros sites, revistas e jornais. Foi redator e colunista do site Cinema em Cena por dois anos e colaborador de sites como O Binóculo, Cronópios e Cinema de Buteco, escrevendo sobre cultura em geral. Pode ser ouvido no Programa do Pipoqueiro, no Rock Master e nos arquivos do podcast da equipe do Cinema em Cena.
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